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O escritor carioca Luiz Alfredo Garcia-Roza morreu nesta quinta-feira, 16, aos 84 anos de idade. Criador do detetive Espinosa, ele é autor de mais de uma dezena de romances policiais e era considerado um dos mestres do gênero no Brasil. A cerimônia de sepultamento será restrita à família. Garcia-Roza estava internado há cerca de um ano no Hospital Samaritano, no Rio, após sofrer um AVC.
Autor tardio, ele começou na literatura de ficção apenas aos 60 anos, em 1996, com O Silêncio da Chuva, romance que lhe rendeu o Jabuti. Uma Janela em Copacabana (2001), Berenice Procura (2005) e Fantasma (2012) são outros de seus trabalhos. O livro mais recente é A Última Mulher (2019), lançado quando o autor já estava hospitalizado. Todos as suas obras foram lançadas pela Companhia das Letras.
Garcia-Roza tornou-se conhecido por sua maior criação literária, o detetive Espinosa. Apaixonado pela economia e precisão encontrados nos escritos de Raymond Chandler e Dashiell Hammet, o escritor construiu, porém, um personagem completamente diferente de Philip Marlowe ou Sam Spade - Espinosa é um protagonista meio "gauche", um tanto excêntrico, no sentido de que não está bem encaixado em lugar nenhum.
"Ele não é o herói, não é como os personagens dos romances policiais da década de 1940, que eram, por exemplo, aventureiros por excelência", comentou Garcia-Roza, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, em 2000. "É um ser mais reflexivo, sem ser um intelectual e sobretudo sente um mal-estar na vida." A inspiração do nome, revelou o escritor, foi o pensador holandês Baruch Espinosa (1632-1677), uma das figuras mais nobres da filosofia e também uma das mais investigativas.
Essa personalidade tortuosa permitiu que as histórias fossem construídas fora do riscado tradicional. Assim, em Vento Sudoeste, por exemplo, o que importa não é descobrir quem é o assassino, mas qual dos personagens será assassinado. Gabriel, um jovem administrador de empresas, ouvira de um vidente desconhecido, em sua festa de aniversário, a previsão de que iria matar alguém antes que fizesse anos novamente. Com a proximidade da data e atormentado com a possibilidade de se tornar um assassino, Gabriel procura Espinosa que, como alguns policiais de carne e osso, acredita na história, apesar de nenhum crime ter sido consumado.
Garcia-Roza não distorcia, porém, a fórmula tradicional da leitura policial, pois, quando mortes estranhas começam a acontecer, o romance dá uma reviravolta e põe no leitor, seguro de que Gabriel iria cometer algum crime, a dúvida comum à boa literatura de suspense: quem é o assassino? Curiosamente, nesse momento, tão atônito como o leitor está o policial Espinosa.
"É quando entramos em uma faixa intermediária da sociedade, ocupada por profissionais tão distintos como policiais e psicanalistas: o universo e seu reverso, ou seja, o normal e seu oposto", comentou o autor. "O território em que eles trabalham é dividido por uma linha entre sanidade e loucura, ordem e desordem, normal e patológico; assim, algumas atitudes consideradas ilegais são aceitas como naturalidade."
Garcia-Roza, criador do primeiro curso de pós-graduação em teoria psicanalítica do País, no Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sempre acreditou na existência de uma faixa intermediária da sociedade, ocupada por profissionais tão distintos como policiais e psicanalistas.
Apesar de fugir de psicologismos, criando um universo totalmente distinto, sua obra vasculha todos os pontos de Copacabana, no Rio de Janeiro. E, em meio a becos, há uma certa preocupação em entender a origem da desigualdade e da violência da sociedade brasileira.
O primeiro romance policial foi publicado em 1996, O Silêncio da Chuva, em que Espinosa, também bibliófilo, tem de descobrir o nexo entre a morte misteriosa de um executivo no centro do Rio e um outro assassinato com requintes de crueldade.
Apesar de reconhecido pela crítica, Garcia-Roza precisou publicar ainda outros dois livros, Achados e Perdidos (1998) e Vento Sudoeste (1999), para receber uma bênção internacional: em junho de 2000, o jornal The New York Times, publicou uma matéria com o título O professor que se tornou novelista. No mesmo dia, os telefones da editora Companhia das Letras começaram a tocar com insistência e a caixa do correio eletrônico a estufar - eram agentes literários americanos, italianos, franceses, interessados na obra do brasileiro.