Em viagem pelo Brasil em 2015, a escritora irlandesa Moya Cannon, sobrevoava Fortaleza, quando, em país estrangeiro, compôs um poema sobre a aventura que é viver à mercê das mãos do outro: do piloto ao cirurgião. Dois anos depois, sua literatura chega ao país pelas mãos da tradutora curitibana Luci Collin, que lança pelo Selo Encrenca, da Editora Arte & Letra, a primeira seleção de poesias em língua portuguesa da autora, “Melodias Migratórias”.
Nascida em 1956 no condado de Donegal, na Irlanda, Moya já publicou cinco livros e recebeu vários prêmios, como o Brendan Behan Memorial, atribuído a Oar (1990), sua obra de estreia, e o Laurence O Shaughnessy Award, em 2001. Com trabalhos reconhecidos internacionalmente, a poeta teve obras traduzidas para o alemão e o espanhol e alguns textos transpostos para diferentes línguas, incluindo, o japonês. Curitiba, é a porta de entrada do seu trabalho no Brasil.
No fim de agosto, Moya esteve na Livraria Arte & Letra para o lançamento de seu livro e participou de uma apresentação em que foram lidos 10 de seus poemas – em inglês e português.
Com muita musicalidade, a poesia de Moya evoca o cotidiano e a natureza e faz belas referências às tradições da Irlanda, sua terra natal. Bilingue, tem o irlandês como a língua da infância, mas por utilizar o inglês de forma mais recorrente o elege para compor sua literatura. “A poesia se situa nas camadas mais sutis da linguagem e a língua inglesa me ajuda a captar melhor estas camadas”, diz.
Projeto curitibano
A ideia de trazer a obra de Moya para o Brasil foi de Luci. A curitibana a conheceu por meio da professora da Universidade de São Paulo (USP) Laura Izarra, quando a poeta participou de um simpósio na instituição em 2015. O que mais chamou sua atenção foi a coloquialidade do texto. “Fiquei muito surpresa com aquela poesia que, mesmo refinada, não era nada hermética”, conta.
A tradutora apresentou o trabalho para a editora Arte & Letra, que abraçou de pronto a ideia da publicação no país. O projeto até recebeu propostas de selos do eixo Rio-São Paulo, onde se concentra o grande mercado editorial brasileiro, mas o apoio e o cuidado da editora de Curitiba pesaram no momento da escolha de Luci.
E assim Moya chega às principais livrarias nacionais: em uma bela edição em capa dura e poemas selecionados e traduzidos especialmente para o leitor brasileiro. “O título Melodias Migratórias fala exatamente desse trânsito de uma cultura para a outra”, explica a tradutora.
Presentes da tradução
Em sua segunda visita ao Brasil, Moya, que é historiadora e adora conhecer outros países, se mostrou muito interessada em descobrir a literatura e a arte que se produz aqui. Imersa nas prateleiras de livros em português, pouco antes do lançamento de seu trabalho em Curitiba, queria saber um pouco de tudo e ia indagando Luci sobre as obras cujas capas lhe chamavam a atenção.
A princípio, a visão que autora tem do brasileiro é de um povo alegre e atraído pela música. Por isso, espera que o leitor daqui goste dos seus poemas mais melódicos. Para ela, é prazeroso ouvir sua poesia em outras línguas e a tradução é uma maneira de perceber aspectos de seus textos que nem ela mesma nota.
Moya se sente grata em viver em uma era na qual, por conta da internet, a poesia tem sido amplamente traduzida. Isso, para a irlandesa, é um grande ganho aos amantes dos livros. “Diziam ao (poeta irlandês) Seamus Heaney que, com a transição de uma cultura para a outra, muito se perde em uma tradução. E o que ele respondia, e eu concordo, era ‘mas quanto mais não seria perdido se não a tivéssemos? O que aconteceria a Shakespeare, Dante, Homero e todo o saber Clássico?”, diz. Se ela e o Nobel da Literatura estiverem mesmo certos, há razões para comemorar. Temos um tesouro mais - agora em língua portuguesa - nas estantes brasileiras.
[Serviço]
Melodias Migratórias
Moya Cannon
Trad. Luci Collin
Selo Encrenca/Editora Arte & Letra
152 páginas
2017
Preço: R$ 45