A partir da próxima quinta-feira, dia 31, muitos cinéfilos brasileiros realizarão o sonho de finalmente assistir a Megalópolis, filme que começou a ser planejado pelo diretor Francis Ford Coppola em 1979. Para quem conhece o trabalho do cineasta, mente por trás de clássicos como O Poderoso Chefão e Apocalypse Now!, o longa-metragem prometia ser uma nova obra-prima. Mas a crítica especializada vem detonando o trabalho, que coleciona avaliações negativas na plataforma especializada Rotten Tomatoes, onde recebeu aprovação de apenas 46%. É uma lástima para o velho Coppola, que gastou 120 milhões de dólares do próprio bolso para realizar o filme. O diretor desembarcará em São Paulo amanhã (27) para promover a obra, com direito a receber um prêmio durante a 48ª Mostra Internacional de Cinema da cidade.
A estada prevista de quatro dias no Brasil fez muitos se lembrarem da passagem de Coppola por Curitiba, em 2003. Na ocasião, ele buscava inspiração e possibilidades de locais para rodar o filme. A escolha de visitar a capital paranaense se deu principalmente por seu contato com o arquiteto Jaime Lerner, governador do estado entre 1995 e 2003.
Juntos, andaram de ônibus biarticulado, visitaram o teatro Ópera de Arame e foram até o Mercado Municipal, onde compraram ingredientes para um jantar. O cineasta mostrou seus dotes culinários em mais de uma ocasião, até mesmo no restaurante A Pamphylia, onde até hoje a sua criação está no cardápio: a pizza F. F. Coppola, com “mozzarella, molho de tomate fresco, azeite extra-virgem, manjericão e massa grossa”.
Durante uma entrevista em setembro deste ano, Coppola explicou que conhecer Lerner o inspirou a desenvolver Cesar Catilina, o protagonista de Megalópolis. O personagem, vivido por Adam Driver, é um urbanista com uma visão utópica para a cidade ficcional de Nova Roma. Com o roteiro, o cineasta oferece um debate sobre como devem ser as cidades no futuro. E, para ele, a capital paranaense se encaixa na ideia.
Entre a Baixada e a Tuiuti
Ao longo de três semanas, Coppola se dedicou a atividades típicas de um curitibano. Assistiu ao clássico Athletico e Paraná na Arena da Baixada (hoje Ligga Arena) e frequentou lugares como a Frutaria Canadá e o Caffè Metropólis, dois estabelecimentos conhecidíssimos que hoje já estão fechados. O destaque de sua vinda foi ter participado de uma aula na Universidade Tuiuti do Paraná, quando conversou com cerca de 100 sortudos sobre tópicos tão diversos quanto a digitalização do cinema, sua relação com o mercado de Hollywood e suas experiências com obras brasileiras.
“Ele falou que conhecia Central do Brasil, o diretor Héctor Babenco [argentino naturalizado brasileiro] e que tinha assistido ao filme Chatô antes de todos”, conta Denize Araújo, docente e coordenadora do curso de “Cinema Expandido” da universidade. Assim como Megalópolis, o filme Chatô, o Rei do Brasil passou anos no imaginário dos cinéfilos. Rodado a partir de 1995, o longa de Guilherme Fontes só saiu em 2015, após uma investigação de uso indevido de verbas governamentais. Coppola se envolveu em algumas etapas da produção, mas acabou dizendo, em entrevista para O Globo, que foi "meio usado para ajudar Fontes a levantar dinheiro do governo brasileiro para o projeto".
Com a ajuda do jornalista Marden Machado, Denize deixou uma carta no hotel Bourbon convidando Coppola para o evento com estudantes. “Pedi meia hora e ele só respondeu ‘meia hora é pouco’. No final, ficamos quase três horas e ele perguntou sobre muitas coisas a respeito da cidade. Foi lindo”, relata a professora.
Misturado com a cidade
Já Machado afirma que “depois dessa participação lá na aula, ele virou meio que uma figurinha carimbada em Curitiba”, sendo visto até “em festa de debutante no Clube Curitibano". O jornalista, membro da Academia Brasileira de Cinema, também conta que Coppola visitou Buenos Aires e Brasília para buscar inspiração, mas que “detestou” a capital brasileira. “Ele não achou a cidade amigável. Em Brasília, para ir de um lugar para outro, você precisa de um carro. E essa foi uma das coisas que o incomodou”, conta Machado. “Aqui em Curitiba, ele se misturou com a cidade. Parecia um cidadão curitibano, andava de boa, visitou os principais pontos e gostou bastante."
Aproveitando a nova vinda do cineasta ao Brasil, Denize tenta convidar Coppola para retornar à sua sala de aula. Para fortalecer o convite, procurou apoio da Prefeitura de Curitiba e do Governo do Paraná. “Minha nora [Luciana Casagrande Pereira] é a Secretária de Cultura do Paraná e conversará com o nosso prefeito [Rafael Greca] e com o governador Ratinho [Carlos Massa Júnior]. A ideia é chamá-lo para alguma coisa depois que terminar tudo em São Paulo”, explica a coordenadora da Universidade Tuiuti.
Tanto Denize quanto Machado estão animados para assistirem ao filme, 23 anos depois de conviverem com o “quase curitibano” Coppola. Cientes das críticas negativas a Megalópolis, acham improvável que a película manche o legado do cineasta. Marden até dá uma dica para quem decidir se arriscar a ver o longa-metragem nos cinemas: “Não tem coisa pior do que se criar expectativa para alguma coisa, porque a probabilidade de você se frustrar é muito grande. O melhor é manter a expectativa baixa, pois a chance de você gostar é maior."
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