Não faltam exemplos de personalidades da música que se mantêm na casa dos 80 anos de idade. Rolling Stones, Paul McCartney, Bob Dylan e Rod Stewart são alguns dos exemplos mais bem-sucedidos desses octogenários (ou quase) no mundo dos shows. Mas quem tem um ouvido aguçado percebe que eles precisam mudar algumas notas para que suas músicas acompanhem a idade – tudo bem, ninguém esperava que Sir Paul conseguiria berrar o refrão de Helter Skelter para sempre. Apesar de comum no cenário, esse tipo de ajuste não passa perto dos shows do cantor nascido no País de Gales Tom Jones, que aos 83 anos está em turnê e fará uma apresentação na cidade de São Paulo, em 17 de abril.
Dono de uma voz potente, ele tem demonstrado nos últimos anos que não precisa baixar o tom em seus diversos hits. “Não consigo acreditar que minha voz ainda esteja funcionando tão bem”, chegou a dizer em uma entrevista durante turnê realizada na Austrália, em 2023. “Ela continua tão poderosa e tão flexível.” Qualquer desconfiança pode ser facilmente descartada ao ouvir a interpretação de I'm Growing Old presente em seu 41º disco de estúdio, Surrounded by Time, de 2021. Toda força que ele demonstra na garganta desde que começou a cantar, em 1963, continua presente.
Essa vitalidade do octogenário, que ainda é considerado um sex symbol no Reino Unido, não é o único fator que o torna imperdível hoje em dia. Jones apresenta um repertório completo, misturando influências de R&B, soul, pop e até gospel. Em sua primeira e até agora única passagem pelo Brasil, em 2016, o setlist mesclou canções de Prince (Kiss), Leonard Cohen (Tower of Song) e Randy Newman (o clássico do strip-tease You Can Leave Your Head On e Mama Told Me Not to Come), mostrando que seu forte, como todo bom crooner, é trazer vida às músicas.
Na cultura popular, suas interpretações seguem atravessando gerações e comprovando que coisa boa nunca envelhece. Ao vencer o último GP de Interlagos, o piloto holandês Mark Verstappen levou seu carro de Fórmula 1 até os boxes cantando Green Green Grass of Home, que ficou famosa na voz de Jones. Isso sem falar na gravação de It’s Not Unusual, que praticamente todo mundo associa à dança do almofadinha Carlton Banks no seriado Um Maluco no Pedaço (The Fresh Prince of Bel-Air).
Personagem de três minutos
Jones deixa claro que não é um compositor e que dependeu de nomes como Burt Bacharach (What’s New Pussycat?) e Les Reed (Delilah) para criar um repertório próprio. Mas isso não tira seu brilho e importância. Forçando um pouco a barra, seria possível traçar um paralelo com a carreira de gênios que ficaram famosos apenas interpretando obras de outros, como Tony Bennet, Frank Sinatra e Elvis Presley, este último um amigo de Jones.
Em uma conversa recente com o site American Songwriter, o gogó de ouro comentou sobre essa natureza do seu trabalho: “Quando um ator lê um roteiro, ele tem de viver aquele papel, tornar-se aquela pessoa. É a mesma coisa com uma música, só que ela é muito mais curta do que um filme ou uma peça. A diferença é que você precisa fazer isso em três minutos.”
Ou seja, ver uma performance de Tom Jones aos 83 anos pode ser tão impactante quanto ver um ator do calibre de Ian McKellen, de 84 anos, interpretando um importante papel em alguma montagem teatral de Shakespeare. “As músicas são histórias de vida e você tem de vivê-las”, resume o galês.