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Orange is the New Black, série disponível no Netflix, pode ser vista de uma vez só: consequência é borrar a ideia de continuidade. | Paul Schiraldi/Divulgação
Orange is the New Black, série disponível no Netflix, pode ser vista de uma vez só: consequência é borrar a ideia de continuidade.| Foto: Paul Schiraldi/Divulgação

De uma só vez, quantos episódios seguidos de um mesmo seriado você costuma ver? Dois, cinco, dez? Você deixa de sair de casa? Esquece de se comunicar com a família? Para de estudar porque “mais um episódio de Breaking Bad não vai me matar”, ou “Preciso descobrir o fim da temporada de House of Cards”? Abandona qualquer atividade que possa esperar só mais uns vinte minutos, que subitamente se tornam quarenta, que ciclicamente se revelam quatro horas? A verdade é que esse fenômeno já não é nada raro: assistir a vários episódios em uma sentada só tem se tornado cada vez mais comum.

Com a introdução de serviços de streaming, como a Netflix, além de downloads – legais e ilegais –, somados a outras plataformas acessíveis (Net Now, por exemplo), disponibilizadas até pelas companhias de tevê a cabo nacionais, verdadeiras maratonas televisivas são realizadas no tempo livre, às vezes tomando horas e mais horas de um dia. A atividade ganhou um nome, e atende por binge-watching (leia-se “bíndj”, leia-se watching), expressão que designa o comportamento viciante de assistir a séries de uma vez só.

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A tentação aceita justificativas simples: juntam-se, primeiramente, a praticidade de seguir acompanhando um conteúdo disponível. Basta clicar, às vezes nem isso, e uma continuação toma as rédeas de seu olhar. Há também a ansiedade em desvendar o fim de uma temporada, ou mesmo de uma série inteira. Por fim, a inércia de interromper a atividade — “já estou sentado aqui mesmo”, sussurra o alter ego preguiçoso da sua, e da minha, consciência.

Em um dos textos mais interessantes publicados sobre o assunto, Jim Pagels recrimina, na Slate , a prática do binge-watching. Segundo ele, ver muitos episódios em uma só tacada desorienta nossa noção de expectativa e borra a ideia de continuidade, removendo o essencial suspense por meio de uma imersão violenta. Concorde-se ou não, fato é que a maneira com a qual trafegamos pela televisão passou por mutações nítidas nos últimos anos, sendo o binge-watching uma das consequências intrinsecamente ligadas à tecnologia disponível em nosso contexto contemporâneo.

O binge-watching, afinal, tem alterado a indústria de produção televisiva, ao menos no que tange aos serviços digitais. Basta lembrar que o Netflix libera de uma só vez os episódios das séries que produz, vide House of Cards, Orange Is The New Black, e, agora, Unbreakable Kimmy Schmidt. Manter um eventual suspense entre capítulos, esse elemento que tanto aproxima o seriado televisivo do romance de folhetim, talvez não seja a prioridade da nova máquina de tevê.

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Embora a prática soe nociva, há a possibilidade de o binge-watching ser apenas uma evolução natural de recepção. Ninguém, por exemplo, lhe condenaria por ler Oliver Twist de uma vez, ignorando as pausas de (meses de) publicação. Com cada espectador em um ritmo, a expectativa para o episódio da semana deixa de existir, até porque o episódio da semana deixa de existir. Isso, no entanto, ainda está longe de ser o padrão televisivo, pois estamos apenas especulando. Ainda assim, que os tempos estão mudando, ah, estão.

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