Um espaço com mesas nas calçadas, aonde os frequentadores podem sentar enquanto apreciam algumas das especialidades dos estabelecimentos gastronômicos em volta. No centro da praça, apresentações com músicos locais, grupos de dança, trupes de teatro e agremiações folclóricas. Ao longo de toda a sua extensão, mais de 12 mil metros quadrados, exposições de arte. Esse é o Boulevard Osório, o cenário que um grupo formado por donos de bares e restaurantes, empresários e arquitetos propõem para uma das praças mais tradicionais de Curitiba, a General Osório, como uma forma de revitalizá-la e levar fluxo contínuo de pessoas, sobretudo em horários mais críticos: como durante as noites e fins de semana.
Há pouco mais de uma semana, o grupo capitaneado pelo Sindicato das Empresas de Gastronomia, Entretenimento e Similares de Curitiba (Sindiabrabar) – entidade que representa uma série de estabelecimentos, principalmente bares e restaurantes – apresentou a proposta de seu espaço gastronômico-cultural ao prefeito Rafael Greca (PMN), que sinalizou de maneira positiva à ideia, ainda que não tenha se comprometido com prazos ou formatos. Durante a reunião, que teve também a presença de membros do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), Greca pediu para que o grupo incluísse em seu estudo outro ponto crítico na cidade: a Praça Eufrásio Correia, em frente ao Shopping Estação, um ponto tido como abandonado e com altos índices de registros policiais.
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No centro da questão está uma congruência de interesses que pode ser benéfica para os curitibanos. Por toda a cidade, mas especialmente no Centro, existem diversas praças “deixadas de lado” pelos moradores da cidade, usadas apenas como ponto de passagem. Sem fluxo constante em horários alternativos, esses espaços acabaram vendo os índices de criminalidade dispararem. A Osório caminhava para este fim. Mas, recentemente, com um novo perfil de endereços gastronômicos – mais notadamente os bares Ostra Bêbada, Italy Caffé e Pizza – se instalando nas ruas laterais, houve um reavivamento do interesse pelo local. Eles se somaram a casas clássicas instaladas por ali, como os bares Stuart (o mais antigo da cidade) e Manekos, em um mix que trouxe a Osório ao centro de atenção e a tornou a bola da vez.
Abandonados
Das 439 praças de Curitiba, pouquíssimas são, de fato, abraçadas pela população. Muito porque o número de eventos que podem movimentá-las é baixo; em muitas delas, inexistente. Uma realidade que não é exclusiva de Curitiba – outras cidades brasileiras passam pelo mesmo problema –, mas que contrasta e muito com a realidade de quem sabe, de fato, aproveitar esse espaço para além de dar um respiro na paisagem urbana. Cidades como Munique e Berlim (Alemanha), Paris (França) ou mesmo as sul-americanas Bogotá (Colômbia), Lima (Peru) e Santiago (Chile), usam suas áreas públicas para criar uma agenda frequente de atrações. São opções a mais de entretenimento para seus moradores.
Historicamente, era assim, como relatou o antropólogo Carlos Balhana, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), em entrevista recente à Gazeta do Povo. O auge foram as décadas entre 1920 e 1950. “Os antigos largos da Rui Barbosa e da Carlos Gomes, por exemplo, tinham repuxos com cisnes que eram muito apreciados pelas famílias, além de serem limpos e terem boa luminosidade e belo ajardinamento”, contou.
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Mas, de lá para cá, o curitibano ganhou outras opções de entretenimento, desde á televisão às novas tecnologias, enquanto as praças foram sendo deixadas para depois. Sem modernização, viraram espaços com um tom decadente, pouco atrativos a uma família em busca de descanso no domingo, por exemplo.
Sem esse uso, as praças curitibanas começaram a se tornar palco de crimes, principalmente furtos e tráfico de drogas. Em 2017, a própria Osório chegou a liderar o número de ocorrências registradas pelos órgãos de segurança. A presença da Guarda Municipal 24 horas por dia – uma rotina iniciada no ano passado no local trouxe um pouco mais de paz aos frequentadores. Ainda assim, o espaço nunca mais foi abraçado como uma área de contemplação ou convívio. Continua sendo apenas de passagem. “Nos domingos isso aqui tudo é um deserto. A maioria desses restaurantes [referindo-se aos estabelecimentos localizados no entorno] estão fechados. É um lugar em que as pessoas evitam passar”, indica um funcionário da limpeza pública, Josias Silveira.
Na Eufrásio Correia, a situação é pior. Embora tenha patrulha frequente da Guarda Municipal e da Polícia Militar, continua sendo um ponto que atrai traficantes de drogas. “De dia, à noite. Não tem muito horário. Sempre tem uma molecada comprando e vendendo droga ali no meio, diz uma moradora de um prédio exatamente em frente ao local. Ela preferiu não se identificar.
De volta à vida
A proposta da Sindiabrabar recebeu o pomposo nome de Boulevard Batel, como virou praxe em projetos do tipo, mas a ideia é mais simples: oferecer condições para que a Osório atraia mais público para a região. “A ideia do boulevard é aproveitar o espaço para uma série de ações. À prefeitura cabe melhorar a iluminação, o embelezamento, a segurança. Vamos dar um exemplo: do Ostra Bêbada [bar localizado no início da Ermelino de Leão] até o Bar Stuart [no início da Alameda Cabral], a iluminação é fraca. Ali tem 28 estabelecimentos e alguns não abrem à noite por conta disso. Mas tem vários que têm interesse [em estender o horário]”, defende Fábio Aguayo, presidente do Sindiabrabar.
Pelo documento apresentado pelo grupo à prefeitura, a ideia é que a revitalização do espaço anime os estabelecimentos ao redor a ampliar seu funcionamento, bem como possibilite uma agenda de atrações como as descritas no início desta reportagem. “É uma coisa rara ter duas universidades em uma só área [diz, referindo à Positivo e à Uninter]. Púbico [para frequentar a região] existe. É uma das poucas praças de Curitiba que não tem grandes terminais de ônibus. E isso permite fazer um mix diferente [de atrações] para a cidade. Aos sábados podemos montar grandes eventos ali, com vila gastronômica, arte”, planeja Aguayo.
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Seu grupo sugere ações fixas na região, diferentemente do que ocorre atualmente. O que, ele garante, trará resultados econômicos para o município “A Praça Osório é um diferencial da cidade. Não dá para usar somente para feirinhas de Natal. Se a praça estiver bonita, bem arrumada, sei de uns 12 que se interessariam em se instalar naquele entorno. Só de falarmos do boulevard já apareceram cinco interessados ali”, diz o dirigente.
Aguayo sugere uma parceria público-privada, com gasto da prefeitura apenas na iluminação, calçamento. O resto seria bancado por empresários do ramo gastronômico, indústria cervejeira e segmentos dessa afinidade.
Um conceito que provavelmente será diferente do pensado para a Eufrásio Correia. Por lá, a ideia da Sindiabrabar e a inclinação já demonstrada pelo Executivo municipal é de criar eventos no formato de feira, que se assemelham aos que ocorrem com alguma frequência na cidade – como a Alto Juvevê, para citar um exemplo.
Ajustes
Apesar de uma identificação com o projeto, a prefeitura deixou claro que terá regras rígidas para os eventos ou funcionamento regular do boulevard. ”Essas ações são bem-vindas desde que feitas com segurança e dentro dos horários que respeitem quem mora na vizinhança”, disse Rafael Greca no encontro com os idealizadores da proposta. O alerta se dá, sobretudo, para evitar o “descontrole” que ocorre em outras áreas de aglomeração da cidade. Um dos exemplos é a “Prainha da Itupava”, nome informal da região da Praça Jardim Poeta Leonardo Henke, no Hugo Lange, local que reúne diversos bares.
Na região, há um clima de insegurança geral motivado pelas recorrentes brigas e consumo de drogas. No início deste mês, um homem foi assassinado no entorno após uma briga. Além disso, os moradores reclamam do lixo deixado nas calçadas e do barulho que se estende madrugada adentro, especialmente nas noites de sexta-feira e sábado.
É um equilíbrio que, se ferido, pode levar à mesma falha que ruiu o projeto de revitalização de outra área na região central de Curitiba, a Rua São Francisco. A falta de segurança na via histórica da capital fez a grande maioria dos bares e restaurantes dali fecharem em um intervalo de um ano. A aglomeração de pessoas, que chegou ao ápice em 2016, foi aos poucos sendo implodida pela violência entremeada a ela. Os comerciantes reclamavam, à época, da falta de apoio do poder público. Atualmente, a via voltou a ser o que era antes do projeto de revitalização: um local a se evitar em determinados horários e dias.
É uma conta que os idealizadores do Boulevard Osório e prefeitura terão que colocar no papel, se decidirem tocar adiante o projeto, que ainda está na fase de desenho. Embora conte com a simpatia de Greca, a ocupação do espaço ainda depende de análise do Ippuc e da Secretaria do Urbanismo. Ainda há um longo caminho.
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