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rodízio de água
Principalmente as chuvas de março acabaram ajudando a enterrar de vez volta de rodízio de água em Curitiba este ano.| Foto: Jonathan Campos/Arquivo/Gazeta do Povo

Os 649 dias que a população de Curitiba e Região Metropolitana viveu sob o rodízio de água, que teve início em março de 2020, ficaram para trás com as chuvas dos últimos dois meses.

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Se os rodízios no abastecimento de água para este ano estão descartados desde janeiro, quando foram suspensos em função de o nível médio das barragens ter atingido 80%, as chuvas que se seguiram nos meses posteriores trouxeram ainda mais alento e segurança em relação a este prognóstico. Segundo consulta à Sanepar, não há nenhuma alteração nesse cenário.

Na última sexta-feira (20), as barragens que abastecem o Sistema de Abastecimento de Água Integrado de Curitiba, como a de Piraquara 1 e 2 estavam com 100% da capacidade, do Iraí em 99,62%, enquanto a do Passaúna se encontrava em 61,17%, resultando em um nível médio de 87,75%, quase 10% superior ao nível à época da suspensão do rodízio.

Julho seco tornou rodízio de água inevitável

O cenário é muito diferente dos níveis de julho de 2020, quando a barragem de Iraí chegou a 12% de sua capacidade, a de Piraquara 1 a 19% e a do Passaúna a 34% e, ao longo de 2021, quando em apenas um único mês todas as barragens superaram, ao mesmo tempo e cada uma delas, 60% do nível máximo de capacidade, em novembro. O rodízio de água naqueles períodos era inevitável.

O panorama atual, com três das barragens em torno de 100% do nível, não ocorria desde novembro de 2019, e isso aponta para bons prognósticos até o fim do ano.

Março foi de retomada

O mês de março deste ano consolidou a cheia das barragens, com chuvas que foram consideradas boas em todas as regiões do Paraná, principalmente no Norte, extremo Oeste e Sul do estado, como avaliou o meteorologista do Simepar Fernando Mendes. “Esse regime de chuvas caracterizou março como o mês da recuperação em razão do déficit acumulado em meses anteriores”, disse ele à época.

Naquele mês, impactou em Curitiba o volume de chuvas bem acima da média, com 203,2 mm ante uma expectativa de 128,1 mm, ou seja, 58% maior do que o esperado e quase o dobro do que foi verificado no mesmo mês, mas do ano anterior, 2021, com apenas 107 mm.

No mês de abril as chuvas também ficaram acima da média no Paraná, segundo o Simepar. Foi assim no Noroeste, Oeste, Sudoeste e Sul do Paraná. “Esse comportamento pode ser associado ao gradual enfraquecimento fenômeno La Niña e também a uma maior interação entre as frentes frias e a umidade que vem da Amazônia”, analisou a meteorologista do Simepar, Lidia Mota. Em Curitiba, o mês de abril não foi tão chuvoso quanto o mês anterior, com 87,4 mm, mas 7% acima do esperado.

Em janeiro deste ano, o diretor-presidente da Sanepar, Claudio Stabile, destacou que, além das chuvas e da grande economia feita pelos usuários, de até 89,8 bilhões de litros de água, obras realizadas pela Sanepar incrementaram maior volume de água no sistema de abastecimento integrado.

Integrar é preciso

Apesar da dependência das chuvas para ter reservatórios sempre cheios, planejamento e investimento poderiam limitar uma escassez futura, diz o presidente do Crea-PR, Ricardo Rocha. “Seria fundamental uma grande política pública na gestão das bacias hidrográficas e dos aquíferos para mitigar o problema”, argumenta o engenheiro civil.

Ele cita que, ainda hoje, algumas bacias hidrográficas têm Comitês de Bacias ou em implantação, ou em não pleno funcionamento, e que as informações dos órgãos públicos em relação a recursos hídricos deveriam estar disponíveis a esses comitês. "Assim, eles ajudariam a dar diretrizes e a construir um balanço estadual, criando uma política integrada em caso de extrema estiagem”, diz Rocha, que lembra que esta última seca surpreendeu por ter ido muito além das séries históricas.

Rocha cita que é importante que bacias hidrográficas e aquíferos busquem equilíbrio com um gerenciamento que promova o uso eficiente das águas pela indústria, agricultura e grandes cidades. "Devíamos ter claros os planos de uso de águas, com declaração sobre quantidades usadas, estímulo a políticas de redução de consumo, ao reúso e ao retorno das águas para as bacias com qualidade. E, em caso de restrição hídrica, que se tenha uma hierarquia dos usos mais fundamentais, estabelecendo prioridades”, diz ele.

O momento de escassez extrema e de rodízio de água, segundo o presidente do Crea-PR, também foi um período de aprendizagem. "Conseguimos avançar com técnicas como a de nebulização de nuvens para induzir a precipitações em certas bacias e a transposição de água de represas e cavas com água potável, mas aprimorar a gestão de bacias hidrográficas é fundamental, assim como fazer um plano integrado e  ter sistemas de informação e monitoramento bastante eficientes”, diz.

Gestão de riscos aprimorada

A falta de uma cultura de gestão de riscos nessa área, fortemente atingida ciclicamente pelo clima, é um desafio na hora de se manter reservatórios cheios, como explica o geógrafo Pedro Augusto Breda Fontão. “Como é um fenômeno que geralmente leva décadas para se repetir, o planejamento acaba não sendo o ideal e, quando é feito, é pontual, afetando a população mais vulnerável com perdas agrícolas, falta de água, problemas na geração de energia elétrica e aumento dos custos/inflação”, avalia.

Para otimizar a gestão de riscos no abastecimento de água, segundo ele, deveria-se investir na coleta de dados e na pesquisa científica das áreas onde estão os reservatórios, dando o máximo de transparência possível nos dados e nas metodologias aplicadas, para poder, assim, se aplicar soluções no campo da hidrologia e engenharia.

Além disso, aponta Fontão, é fundamental levar em conta o crescimento da demanda e da população na região. "Nas últimas duas décadas, os reservatórios e o sistema de abastecimento de água de Curitiba (e região metropolitana) acompanharam o crescimento da demanda e da população de forma proporcional?", questiona o geógrafo.

Fontão explica que exemplos ou mais tradicionais, como o do Nordeste brasileiro, ou recentes e próximos, como o da grande seca de 2013-15 que atingiu o Sistema Cantareira, em São Paulo, deveriam ter alertado os gestores regionais para a aceleração de obras e construção de reservatórios. "No sul da Espanha, em que as secas são recorrentes, há os Planes Especiales de Sequía, cujo planejamento é feito de forma diferenciada para situações de secas e escassez hídrica, distinguindo condições incontroláveis (meteorológicas) de condições que poderiam ser evitadas (por falta de recursos/obras insuficientes)", cita ele, que é professor adjunto no Departamento de Geografia do Setor de Ciências da Terra da Universidade Federal do Paraná.

O geógrafo acredita que, como a ocorrência de secas meteorológicas, hidrológicas e socioeconômicas no Paraná não é algo tão comum, e que pode levar décadas para se repetir com forte intensidade, muitas vezes o planejamento de obras necessárias não recebe a devida atenção. "A água para o abastecimento urbano deve ser armazenada em momentos de abundância, com obras e reservatórios que considerem o crescimento da demanda e da população das cidades e região metropolitana, considerando a climatologia, suas séries históricas de precipitação e demais variáveis", assinala.

Caso a seca extrema ocorra, diz ele, se o planejamento não foi feito da maneira correta, "a solução a curto prazo acaba se baseando em ações emergenciais e medidas paliativas, que muitas vezes são mais caras e causam impactos à população".

Investimentos em andamento

Recentemente a Sanepar divulgou que, em outubro, deve ter início a captação de água na Reserva Hídrica do Futuro, cavas que serão ligadas ao sistema de abastecimento. As obras começaram no fim do ano passado, com o trabalho de limpeza das cavas de Piraquara.

Esta estratégia se soma à construção da quinta represa a ser operada pela Sanepar, a do Rio Miringuava, em São José dos Pinhais, no intuito de mitigar problemas que podem ocorrer no futuro. A previsão é que entre em operação no fim de 2022, com dois anos de atraso.

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