O que você estava fazendo aos 12 anos? Correndo atrás de um sonho profissional ou de uma bola? O curitibano Lucas Benites estava começando a formar um portfólio para realizar o sonho de estudar animação e efeitos visuais em uma universidade prestigiada. Sete anos depois, ele está às portas dessa realização. Ele é o único latino-americano entre os seis finalistas da Michal Makarewicz 3D Animation and Visual Effects Scholarship, oferecida pela Vancouver Film School, no Canadá.
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No total, o programa vai dar US$ 250 mil (R$ 965 mil reais) em bolsas de estudo parciais e integral. O processo seletivo começou em fevereiro e o curitibano se destacou entre milhares de candidatos do mundo todo. Todos os finalistas receberão bolsas parciais, sendo que os respectivos valores e o grande vencedor da bolsa integral devem ser divulgados nos próximos dias.
A Vancouver Film School (VFS) é reconhecida como a melhor escola de animação e efeitos visuais do mundo, segundo ranking da ACR Magazine, e melhor escola de cinema de 2019 tanto pela revista Variety quando pela Hollywood Reporter. Mesmo tendo apenas 32 anos de história, ex-alunos estiveram envolvidos em vários blockbusters, incluindo sucessos recentes, como "Homens de Preto - Internacional" e "Aladdin". Segundo o presidente da instituição, James Griffin, "como um todo, nossos ex-alunos alcançaram os mais altos níveis de sucesso nas produções mais lucrativas nos setores de entretenimento e design".
Com um "currículo" desse, não é surpresa que o nome da faculdade tenha atravessado o continente e chegado ao imaginário de Benites. "Esse curso é um grande sonho. Nos últimos cinco anos, eu venho me preparando para uma oportunidade [de bolsa de estudos] porque esse curso de efeitos visuais está ranqueado como o melhor do mundo", diz.
Despertar cedo
Também não é surpresa que o portfólio do jovem de 19 anos tenha impressionado os avaliadores. "Eu comecei a trabalhar profissionalmente, a ter alguns projetos, com 12 anos. Sempre fui fã de cinema, animação e sempre tive muito interesse nessa área", conta. Com síndrome de Asperger, uma forma leve de autismo, ele tinha uma dificuldade grande em se expressar, especialmente socialmente, para o mundo. "A arte foi a melhor forma que eu encontrei para fazer isso", afirma.
Ainda criança, escrevia roteiros para filmes que ele mesmo gravava com a câmera VHS dos pais. Também gostava de desenho e pintura, mas a grande paixão sempre foi o cinema. A brincadeira o levou para a edição de vídeos, que lhe deu o primeiro contato com o trabalho de pós-produção que, poucos anos depois, o levaria para a animação digital.
Como dedicava seu tempo a estudar e desenvolver essas habilidades, aos 10 anos começou a divulgar o resultado de suas produções em edição de vídeo em um canal no YouTube. À medida que foi acumulando acessos, surgiram as primeiras oportunidades de trabalho como freelancer. Autodidata, aos 12 anos, Benites começou a formar seu catálogo de clientes.
Dois anos depois, quando descobriu a VSF, começou a focar seu trabalho na área de animação e efeitos visuais, estudando e até criando técnicas alternativas. Tanto esforço acabou trazendo frutos e, aos 16 anos - antes mesmo de concluir o Ensino Médio Técnico no Tecpuc, onde era bolsista - ganhou a emancipação dos pais para fundar, junto com um amigo da escola, o estúdio de criação Nexlab. "Hoje o estúdio tem dez pessoas. É um coletivo de artistas, programadores e designers e a gente trabalha de uma forma mais alternativa e descontraída, mas, claro, com a estrutura de uma empresa", explica.
A participação dos pais foi essencial para o sucesso do jovem curitibano. "Meus pais sempre me deram o maior suporte. Nós somos em cinco irmãos, então, claro, não dá para dar um foco tão grande para cada filho. Mas eles viam que eu me destacava e sempre me deram o maior apoio, até com investimento em equipamentos". A retribuição vem em forma de ajuda nas contas da casa. "Quando eu comecei a trabalhar a gente estava com uma dificuldade financeira, por isso desde então eu contribuo para o orçamento familiar. Houve necessidade junto com a vontade", diz ele.
Michal Makarewicz Scholarship
Michal Makarewicz, que dá nome à bolsa de estudos, é um animador da Pixar que se dedica a investir em educação e parte do valor será custeado por ele. Em um traço comum ao curitibano, ele também começou a trabalhar cedo com cinema. Aos 17 anos, entrou na Pixar como estagiário e de lá nunca saiu. "Eu trabalhei na maior parte dos filmes [da companhia] desde o primeiro 'Os Incríveis', além de vários curtas. Na verdade, eu nunca quis ser um animador, sempre quis fazer filmes live action. Acabei caindo na animação como uma espécie de concessão", relata.
O animador acredita que a indústria do cinema acolhe bem jovens talentos e que é importante promover o seu crescimento. E foi justamente a multiplicidade de habilidades de Benites, sendo tão jovem, que chamou a atenção de Makarewicz ao selecioná-lo como finalista. "Eu gostei muito do quão dedicado à arte ele é e como ele tentou melhorar o seu próprio desempenho artístico em várias plataformas. O seu trabalho é ótimo e eu amo como parecia que ele estava se divertindo [enquanto produzia]", conta.
Benites, que acredita no poder transformador da sétima arte, diz que mesmo que não consiga a bolsa integral, vai tentar parcerias com empresas para financiar o valor não coberto pela bolsa. Como o curso é um super intensivo, ele vai precisar dedicar manhã, tarde e noite aos estudos e não sobraria tempo para trabalhar em paralelo. "Vou buscar um jeito, porque é uma oportunidade que eu não posso perder", garante. Se tudo der certo, o plano é continuar morando no Canadá depois da conclusão do curso - Vancouver está entre os maiores polos mundiais de pós-produção em audiovisual.