A grave doença de um dos dois filhos levou a agricultora Josinete da Silva Moraes a superar as maiores dificuldades de sua vida: a leucemia do caçula Italo Gregório da Silva Lima, de 7 anos, e o analfabetismo. Por causa do tratamento do menino, Josinete está aprendendo a ler aos 35 anos de idade no Hospital de Clínicas (HC) de Curitiba, onde o menino se recupera do transplante de medula óssea feito em 26 de abril.
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Este domingo (12) será especial para mãe e filho. Além da comemoração do Dia das Mães com Josinete sabendo ler algumas palavras, o menino completa 8 anos.
Desde que chegou à cidade, vinda da distante São Vicente do Seridó, no sertão da Paraíba, a quase 2,5 mil quilômetros de Curitiba, Josinete passou a ser alfabetizada justamente para poder medicar o filho quando deixar o hospital. Após passar por uma semana de quimioterapia e o transplante, a previsão é de que Italo seja liberado no prazo de um mês da ala de transplantes do HC. A partir daí, a medicação do filho ficará por conta da mãe.
As aulas de Josinete começaram há um mês, dentro do Programa de Escolarização Hospitalar do HC, voltado para crianças internadas, o mesmo em que o menino está matriculado, e que vai do ensino infantil ao fundamental em parceria com a prefeitura de Curitiba. “Já junto as sílabas e estou conseguindo ler algumas palavras. Esses dias consegui ler um texto”, conta a mãe, orgulhosa.
A oportunidade de a agricultora ser alfabetizada apareceu quando chegou com o filho a Curitiba para o tratamento antes do transplante. “A médica que atendia o Italo no hospital notou que eu não entendia algumas coisas escritas que ela me passava. Então, me apresentou o Programa de Escolarização Hospitalar”, conta a agricultora. O próprio Italo também foi matriculado no programa assim que foi internado no HC.
Por ser paciente da ala de transplante de medula, o menino tem aulas particulares no leito para evitar infecções. Sem cabelos por causa do tratamento e impossibilitado de falar por causa dos efeitos colaterais da medicação, Italo está se comunicando apenas por gestos.
Mãe e filho têm aula com a professora Maria Elisa Bartosievicz no HC. “A Josinete é muito dedicada. Presta atenção em tudo que eu passo e se esforça ao máximo para entender”, elogia a professora.
Mesmo tendo aulas juntos, os processos de escolarização de Josinete e Italo são diferentes. Para ela, os exercícios são focados no principal motivo de a mãe ter iniciado a alfabetização: os medicamentos do filho. Para que haja similaridade, a professora tem montado tarefas com palavras parecidas com os nomes dos cinco remédios que Italo terá de tomar após receber alta. “Eu monto exercícios com a palavra flor, e destaco a primeira letra, que é a mesma do remédio Fluconazol”, exemplifica a professora, citando um dos remédios utilizados para tratar infecções prescrito em casos de transplantes de órgãos.
Dificuldades na cidade grande
Não é somente para leitura dos medicamentos que a alfabetização vai servir para Josinete. Ela sempre teve vontade de aprender a ler, mas, como trabalha na área rural e cuida dos filhos, não teve oportunidade. “Para tudo eu tinha que pedir ajuda da minha filha mais velha, de 13 anos, e do meu marido, que sabe ler um pouco”, explica.
A dificuldade com a leitura veio mesmo quando chegou a Curitiba para o tratamento de Italo. Hospedada na Associação Paranaense de Apoio à Criança com Neoplasia (APACN), no bairro Tarumã, mãe e filho precisavam ir de ônibus para as consultas. “Cidade grande é complicada. Eu precisava pegar ônibus, mas não conseguia ler o nome e saber se era o certo. Nessas horas, procurava ajuda de quem estivesse por perto”, relata a agricultora.
Agora que está aprendendo a ler, Josinete não pretende mais parar os estudos. “Eu digo para concluir o segundo grau. Ela tem muita capacidade para isso. Em apenas um mês já está lendo textos”, afirma a professora Maria Elisa. Voltando para a Paraíba, a agricultora pretende se matricular no ensino para adultos na escola perto de onde mora.
Tratamento complexo
A mãe conta que o filho sempre teve bom comportamento, inclusive ao longo de todo o tratamento pesado, mas sentia falta da escola. “Ele sempre cooperou com os tratamentos porque sabia que era para o bem dele. Mas quando via os amigos indo à escola, me implorava para ir também. Isso foi muito difícil. Era de cortar o coração”, emociona-se a mãe, que chega a chorar quando se lembra do pedido do caçula.
Durante um ano, Italo ficou indo e vindo de hospitais na Paraíba, aguardando um transplante de medula. Foram os profissionais dos hospitais na Paraíba que indicaram que ele fizesse o tratamento em Curitiba e que a família se hospedasse na APACN. “Na vinda, minha filha e minha cunhada acompanharam a gente. Mas quando descobrimos que minha menina não era compatível 100% para a doação, as duas voltaram para São Vicente do Seridó e ficamos somente eu e Italo aqui”, conta a mãe.
A doação da medula veio de uma pessoa que não é da família. Em menos de um mês no HC, Italo conseguiu o transplante. A previsão agora é de que em quatro meses o menino volte para casa e possa não só brincar com os amigos, mas também comer seu prato favorito, macarrão.
Escolarização hospitalar
No HC há dois programas de escolarização que atendem crianças internadas, realizados em parceria com as secretarias municipal e estadual de Educação. O Programa de Escolarização Hospitalar vai do ensino infantil ao 5.° ano do ensino fundamental em parceria com a prefeitura. Já o Serviço de Atendimento à Rede de Escolarização Hospitalar (Sareh) vai do 6.° ano até o ensino médio em parceria com o governo do estado.
Os programas acompanham o aprendizado das crianças internadas no HC que não podem frequentar a escola, além de realizar o processo pedagógico. “As aulas trazem vida a essas crianças. No momento em que estão tendo aulas, esquecem que estão em um hospital em meio a um tratamento médico. Isso melhora até a aceitação da sua realidade, mudando o comportamento com o procedimento interno, como tomar medicação”, explica a coordenadora do Comitê de Humanização, Regina Tanaka Nunes.