Já passava das 4 horas da madrugada quando o engenheiro Guilherme* saiu de frente do computador em sua casa no Bairro Alto, em Curitiba, e olhou pela janela. No céu de verão, levemente estrelado, viu um objeto se movimentando. Era redondo, de cor amarelada e piscava constantemente. Ao se deslocar pelo céu, emitia feixes de luz na vertical e não fazia qualquer barulho.
“Era um objeto diferente, não tinha nada a ver com aviões ou coisas parecidas. Nenhum objeto feito pelo ser humano emite luz daquele jeito”, contou o engenheiro à reportagem da Gazeta do Povo, sem antes recordar de outros quatro casos anterior que vivenciou na capital paranaense e no Litoral.
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Esse último, porém, ele entendeu que precisava reportar à Aeronáutica. “Eu registrei porque achei um absurdo aquilo e ninguém fazer nada. Se fosse um objeto armado, vai saber. É questão de segurança nacional. Liguei para o Cindacta [Segundo Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo, localizado no aeroporto do Bacacheri] e relatei essa situação”, revela.
O oficial de plantão ouviu o relato e preencheu o formulário padrão de ocorrência de “Tráfego Hotel” - expressão utilizada pelas Forças Armadas para se referir a Objetos Voadores Não Identificados (OVNIs). O documento foi enviado ao Comando de Defesa Aeroespacial (Comdabra) e posto em sigilo. Isso até 2017, quando esse episódio se juntou a outros cerca de 700 dessa natureza ao serem desclassificados e liberados para consulta pública no site do Arquivo Nacional.
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Entre os relatos, há um pouco de tudo. Objetos redondos, em forma de estrela e com desenhos diferentes, das mais diversas cores. Movimentam-se ora lentamente, ora param e aceleram rapidamente. Tudo visto a olho a nu, seja de dia ou de noite.
A fama de Curitiba
Na leva de arquivos que perderam a confidencialidade, um detalhe chamou a atenção: 84 registros de avistamento de OVNIs ocorreram em Curitiba e Região Metropolitana. Número superior a qualquer outra cidade ou região do país. E apesar de conter casos que datam da década de 1950, a maioria relacionada à capital paranaense é do ano 2000 em diante.
Essa peculiaridade foi suficiente para que Curitiba ganhasse o título informal de “capital oficial dos discos voadores”. E casos, além dos disponíveis abertamente, não faltam e nos levam para mais de 60 anos atrás. Objetos que sobrevoaram a região central em 1954, o pouso de um disco voador no Bacacheri com direito a contato com seres extraterrestres, avião precisando arremeter próximo ao aeroporto Afonso Pena para evitar a colisão com um OVNI. Sem contar os misteriosos casos de abdução.
Apesar da quantidade de casos relatados, ufólogos dizem que cidade não é tão especial assim para quem vem de outros lugares do universo. “Curitiba não é tão diferente de outras regiões. Os objetos aparecem em todos os lugares do mundo. Temos grandes ufólogos aqui e vários eventos do tema. Por serem mais expostas ao assunto, as pessoas acabam ligando para a Aeronáutica e fazendo o registro. E aqui o Cindacta tem dado mais atenção aos relatos”, comenta o ufólogo Jackson Camargo.
No ano passado, por exemplo, a cidade sediou um grande evento de ufologia chamado International UFO Summit Brazil 2018, que recebeu nomes importantes do ramo, como Giorgio Tsoukalos, apresentador do programa Alienígenas do Passado, do History Channel, além do pesquisador Erich von Däniken, que defende que seres extraterrestres visitam a Terra há milênios.
O ufólogo Ademar Gevaerd atribui a fama da cidade ao Cindacta, especialmente a partir da virada do século. Segundo ele, um militar da Aeronáutica que esteve à frente do órgão incentivava que os comandados preenchessem o formulário de Tráfego Hotel a cada ligação que chegasse. “Acredito que por ele ser interessado no assunto e mais zeloso com os relatos, havia mais registros. E isso não aconteceu em outras cidades do Brasil”, diz.
Desconfiança
Os relatos não significam necessariamente que os objetos avistados sejam de fora da Terra. Segundo os especialistas, na maioria das ocorrências que chegam que a público são facilmente descartados. Em geral, há a confusão com aeronaves comerciais, satélites e mesmo planetas.
“Nós temos um feeling sobre as ocorrências. É muito raro alguém tentar nos enganar, inventar uma história. O que é mais comum é alguém achar que viu algo e não ter visto nada. De 100 pessoas que ouvimos, descartamos pelo menos 90, e somente de três a quatro casos que consideramos como fenômenos de interesse para a ufologia”, explica Gevaerd.
São os ufólogos que buscam elucidar os avistamentos. Oficialmente, nenhum órgão público, inclusive das Forças Armadas, se encarrega de investigar os casos. “O Comando da Aeronáutica não dispõe de estrutura e de profissionais especializados para realizar investigações científicas ou emitir parecer a respeito desse tipo de fenômeno aéreo”, informou a Força Aérea Brasileira (FAB), via assessoria de imprensa.
Esse distanciamento gera desconfiança entre os estudiosos do ramo. Para eles, a FAB mantém secretamente informações sobre os episódios mais significativos, até para evitar que se jogue pânico sobre a população. Sem contar que seriam casos que podem interferir no aparato de defesa.
“Eu acredito que [a Aeronáutica] liberou de 10 a 20% de tudo que produziram. O restante não foi liberado. O que foi liberado é ponta do iceberg. O mais importante e mais quente não são liberados, é de segurança nacional”, lamenta Gevaerd.
*O nome real foi omitido a pedido do entrevistado.
Relatos de Curitiba
Tráfego desconhecido
“É... não, negativo, ele tá aqui, tá parado agora, ele tá acompanhando a gente, está parado aparentemente, na subida ele tava vermelho, todo vermelho, aí ele foi mudando branco, vermelho, branco, vermelho, agora ele tá todo branco, entendeu?”
Piloto do voo 9063 da Varig, 7 de agosto de 2003, às 19h40, no espaço aéreo entre Curitiba e o Litoral do Paraná.
Os discos que fecharam o centro
Aproximadamente às 13 horas do dia 14 de dezembro de 1954, três pontos luminosos surgiram no céu de Curitiba. A população saiu à rua para ver e a Rua XV de Novembro parou. Aos poucos foram diminuindo a altitude, aproximando-se de alguns prédios do centro. Os comerciantes fecharam as lojas com medo. A Força Aérea Brasileira mandou duas aeronaves para tentar alcançar os objetos, mas nada feito.
Os três do Bacacheri
Em uma noite de 1977, um soldado da Aeronáutica avistou um disco voador pousando na base aérea do Bacacheri. Atônito, viu três seres com vestimentas escuras deixarem a nave e se dirigir a um hangar da Força Aérea Brasileira. De lá, chegaram a arrastar um avião. Não demorou muito e retornaram ao objeto de onde saíram e levantaram voo. No local do pouso, a grama ficou queimada, mas foi retirada na manhã seguinte.
Disco do Hospital Cajuru
Uma mulher com três filhos transitavam em um carro próximo ao Hospital Cajuru. Avisados por motoristas que vinham no sentido contrário, viram que acima do veículo havia um disco voador. Rapidamente chegou à sua casa. Da janela do apartamento, ainda viram o objeto estacionado ao lado hospital. Logo depois decolou e não foi mais visto.
Como acessar
Os documentos estão disponíveis no Sistema de Informações do Arquivo Nacional (Sian). Para acessar o sistema, é necessário fazer um cadastro rápido no site. Após feito isso, basta fazer o login e acessar a aba Favoritos e depois Objetos Voadores Não Identificados. Os registros estão em ordem cronológica, mas é possível fazer buscas por local.
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