A cada nova cena que se acendia projetada na tela da Cinemateca, a cada linha escrita sobre um diretor, a cada debate nos cineclubes curitibanos e a cada fita VHS alugada para assistir com os amigos em casa, Lélio Sotto Maior Jr. viveu o cinema. Falecido em julho deste ano, aos 73 anos, foi um dos maiores críticos de cinema e cinéfilos do estado, transformando a crítica em meio atemporal de falar sobre uma arte que dá ainda mais vida à realidade.
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Apesar de admirar representantes de diversos movimentos, o Cinema Novo, diretores italianos, Alfred Hitchcock e também o cinema feito no Paraná, Lélio é sempre lembrado por causa da Nouvelle Vague, movimento francês dos anos 1960 que revolucionou o cinema mundial. Foi essa escola que decretou seu amor pela sétima arte antes dos 18 anos, quando já dedicava horas e horas se deliciando com clássicos na tela grande. Ganhou da mãe uma assinatura da revista francesa Cahiers du Cinéma, uma das mais importantes publicações sobre o tema da história e para a qual alguns de seus grandes ídolos escreviam, como Jean-Luc Godard, Claude Chabrol e Agnès Varda.
Passou da leitura à escrita, desenvolvendo suas próprias críticas. Por seis anos escreveu críticas semanais para o jornal O Estado do Paraná. Também colaborou com o Diário do Paraná, Revista da Cinemateca, Correio de Notícias, Folha do Paraná, Jornal do Estado, Folha de Londrina e para a revista americana Florida Review Magazine. Além disso, publicou cadernos de ensaios pelo Museu da Imagem e do Som do Paraná (MIS-PR). Fazia questão de reunir, imprimir e distribuir textos seus, mesmo que fosse de maneira caseira.
Com textos que envolviam mais do que impressões de um especialista sobre os filmes, Lélio praticava uma crítica única que misturava ensaio e filosofia. "O texto dele transcende a crítica, tem um lado poético e por isso o conteúdo sobrevive até hoje, não é datado. Ele tinha uma cosmovisão que faz com que textos de décadas atrás sejam lidos hoje como se tivessem sido escritos ontem", conta o cineasta Fernando Severo, que guarda como tesouros as coletâneas de Lélio. Uma característica peculiar de seus escritos sobre cinema é que envolviam astrologia, tema que muito lhe interessava, perguntando para cada nova pessoa que conhecia qual era seu signo. Sabia o signo de dezenas de diretores e diretoras, e levava isso em conta na hora de escrever.
O escritor influenciou gerações de apaixonados por cinema não apenas com suas publicações, mas também nas rodas de discussão, debates e cineclubes dos quais era assíduo. Com a abertura da Cinemateca, em 1975, antigamente no Museu Guido Viaro, espectadores se reuniam após as exibições para trocar impressões. Lélio era uma fonte de referências e de opiniões ponderadas que todos os presentes ansiavam por ouvir.
Amigo de personalidades da cidade como o poeta Paulo Leminski, o escritor Valêncio Xavier e o jornalista Aramis Millarch, não dava pausas para o compartilhamento de ideias, mesmo quando não estava perto das salas de cinema. "Às vezes ele decidia 'Vamos ver Um corpo que cai [de Hitchcock]', ou outro clássico, preparava o VHS e reunia os amigos para um café ou chá com cinema", relembra o jornalista e produtor audiovisual Tiomkim.
Um intelectual carismático, fascinava pelo conteúdo do que dizia e escrevia, mas também por seu jeito de se comunicar. "Ele era muito dinâmico e fascinante intelectualmente. Fazia críticas profundas sem ser pretensioso. Uma pessoa muito alegre e antenada, era muito agradável o convívio com ele", conta Fernando Severo.
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