A obra da prefeitura de Curitiba que transformou o aquário do Passeio Público no chamado Coreto Digital está sendo investigada pela Ministério Público do Paraná e pela Coordenação do Patrimônio Cultural, órgão vinculado à secretaria estadual de Comunicação e Cultura, responsável por autorizar intervenções em imóveis tombados.
Após receber, no dia 28 de outubro, uma denúncia sobre supostas irregularidades na obra, o promotor de Justiça, Sérgio Cordoni, encaminhou uma representação à Coordenação do Patrimônio Cultural perguntando "se a edificação mencionada se trata de bem tombado e se foi expedida autorização à Prefeitura de Curitiba para a execução de obras e restauro".
O chefe da Coordenação do Patrimônio Cultural, Vinício Bruni, informou à Gazeta do Povo que o órgão está estudando o caso, mas não deu prazo para que o processo seja concluído. O MP deu prazo de 30 dias para o órgão prestar os esclarecimentos.
O Coreto Digital é uma estrutura tecnológica, com uma enorme tela curva de LED com 25 metros por 2 metros e um sistema de som turbinado, que reveste a fachada do Aquário e que transformou o edifício num cinema ao ar livre. Bancos foram instalados na praça para que a população possa assistir à programação. A obra custou pouco mais de R$ 1 milhão e foi inaugurada pelo prefeito Rafael Greca (DEM) em 26 de junho.
Por causa da pandemia, porém, o Coreto Digital começou de fato a funcionar em 29 de setembro. Desde que começou a campanha eleitoral, a obra tem se tornado um dos trunfos da gestão do prefeito, que é candidato à reeleição. Imagens do edifício são exibidas com frequência nas peças de propaganda na TV e na internet.
“Aproveitando a reconstrução da estrutura do antigo coreto que, em 1915, o grande prefeito, meu querido antecessor, Cândido Ferreira de Abreu, fez erguer, nós instalamos, junto da cobertura tradicional, uma moderna tela de Led que permitirá aulas de história ao ar livre, concertos ao ar livre, espetáculos transmitidos online ao ar livre e até exibição de cinema com grandes clássicos e filmes de sucesso, gratuitamente, para toda a população”, afirmou Greca no vídeo de inauguração.
A obra, porém, está sendo contestada por ocultar o antigo Aquário, imóvel tombado pelo governo do Paraná, em 1999. A lei estadual 1.211 de 1953 estabelece que qualquer intervenção em bens tombados deve ser autorizada pela Coordenação do Patrimônio Cultural.
“As coisas tombadas não poderão em caso nenhum ser destruídas, demolidas ou mutiladas, nem sem prévia autorização do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural do Paraná, ser reparadas, pintadas ou restauradas”, diz a lei. A visibilidade do objeto também não pode ser escondida por trás de outras construções, anúncios ou cartazes.
A prefeitura informou em nota que a instalação do Coreto Digital não danificou o imóvel e que “os painéis de Led foram instalados de forma sobreposta à edificação. Tratam-se de equipamentos móveis e instalação temporária e que podem ser retirados a qualquer momento”. Questionado, o órgão não informou até quando o equipamento digital vai ficar no local.
A gestão municipal afirmou também que “as obras de revitalização do Passeio Público tiveram início em março de 2018 e foram realizadas de acordo com o Plano de Trabalho desenvolvido para o Passeio Público e aprovado junto à Coordenação do Patrimônio Cultural do Paraná”.
Documentos obtidos pela reportagem revelam que a Coordenação do Patrimônio Cultural autorizou de fato a revitalização do Passeio, mas, em relação ao aquário, permitiu apenas a manutenção - realizada em 2017 - e a construção de uma nova rampa de acesso que “deve buscar a menor interferência na visualização do edifício do aquário”. Não há qualquer menção à instalação do Coreto Digital.
As informações históricas sobre o Aquário são escassas. Ele foi construído no lugar do antigo coreto do Passeio Público, que remonta a 1915. A fachada tem estilo modernista e a construção se ergue em cima de um pequeno lago artificial que forma uma gruta decorada com duas estátuas de ninféos e onde, segundo os poetas, moravam as musas.