Um dos mais importantes compositores da música brasileira, o sambista Cartola foi jurado do carnaval de Curitiba duas vezes na década de 1970. A visita do grande sambista mangueirense aconteceu nos anos de 1974 e 1976. Nas duas oportunidades, Cartola que é autor de obras-primas do gênero, julgou o quesito samba-enredo.
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A presença de Cartola no carnaval curitibano hoje parece inusitada, mas na época fazia parte de um projeto da prefeitura de incentivar o carnaval de rua.
Era o período do primeiro dos três mandatos do prefeito Jaime Lerner (1971-1975) em Curitiba, período em que surgiu o embrião das primeiras políticas culturais do município, como a inauguração do Teatro Paiol e a criação da Fundação Cultural de Curitiba.
A partir de 1972, criou-se uma tradição de convidar nomes de expressão nacional ligados ao carnaval carioca para dar peso ao nosso, o que durou até o começo da década seguinte.
A prefeitura garantia a verba para pagamento das passagens e cachês dos jurados que chegavam na quinta, julgavam o desfile na sexta e voltavam para o Rio no sábado ou domingo para acompanhar suas escolas.
No carnaval de 1974, acompanhavam Cartola na comissão julgadora nomes como Sinval Silva (autor de Adeus Batucada, sucesso de Carmen) e o jornalista e pesquisador Ricardo Cravo Albin.
Em outros carnavais, bambas como Ismael Silva, Mano Décio da Viola e Leci Brandão também foram recrutados.
Um dos grandes foliões da cidade, o jornalista Carlos Fernando Mazza, ex-presidente da comissão de carnaval, conta como funcionava.
"O Cartola jurado de sambas-enredo mordeu e assoprou os compositores da província", disse. Em 74, a escola campeã foi a Dom Pedro II, atual Mocidade Azul, apesar da nota 7 dada por Cartola ao samba.
A segunda colocada, a Colarado, levou nota 10, mas perdeu por meio ponto na apuração final.
Em 1976, foi a vez da escola da Colorado vencer, com o enredo Paraná de Todas, também com a nota máxima de Cartola.
Cicerone e afilhado
Quem ciceroneou Cartola por aqui, como fazia com a maioria dos artistas que visitavam a cidade, foi o jornalista Aramis Millarch (1943-1992). Aramis foi o mais importante jornalista cultural de Curitiba.
Em três décadas de carreira no jornal O Estado Paraná, escreveu artigos e textos sobre todos os campos da cultura, produziu shows, entrevistou e gravou milhares de artistas.
Todo o seu acervo está disponível digitalmente no site Millarch, um baú inesgotável de raridades de onde se pode ouvir o áudio dos desfiles daqueles carnavais e também Cartola declamando a poesia de “O Mundo é um Moinho”, uma de suas canções mais famosas.
O compositor e jornalista Claudio Ribeiro é parceiro do mestre mangueirense em alguns sambas e uma espécie de afilhado de Cartola. Naqueles dias, Ribeiro rodou com Cartola pelos bares e rodas de samba da cidade e conta o que mestre aprontou por aqui.
Auge do carnaval de Curitiba
Quem conhece a fundo o carnaval de Curitiba, não tem dúvida em afirmar que a década de 1970 foi o grande momento da festa de rua da cidade
O músico Ricardo Salmazo que pesquisa esta história conta que o carnaval de ruas e blocos teve dois momentos distintos até o fim do século 20.
"Houve primeiro a fase do carnaval curitibano de blocos e escolas de samba na rua XV de Novembro de 1946 a1970, mais simples e romântico, cujos últimos anos marcaram o início da transição de um carnaval despretensioso, de brincadeiras, para um carnaval competitivo", conta.
A partir de 1971, o carnaval de rua migrou para a Marechal Deodoro onde ficou, em um primeiro momento até 1998.
“Muita coisa mudou em termos de estrutura e de apoio da prefeitura em prol da festa. As escolas se organizaram, alguns mecenas movimentaram a folia, muitas reivindicações foram feitas, a forma de se tocar mudou e as composições autorais começaram a “ganhar preço”, escreveu o pesquisador.
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