Na primeira vez em que ficou frente a frente com Edison Brittes Jr., assassino confesso do filho dela — o jogador de futebol Daniel Corrêa Freitas —, Eliana Aparecida Corrêa Freitas desabafou: "é uma tragédia tão grande quanto o próprio assassinato". O encontro foi durante uma das audiências de instrução e julgamento do crime — que completa um ano neste domingo (27) e tem três dos quatro réus do homicídio respondendo em liberdade. Apenas Brittes Jr., que naquele dia encarou friamente a mãe do atleta durante boa parte da sessão, segue preso.
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Passado um ano da morte de Daniel, que ocorreu em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, Eliana preferiu não conversar a respeito.
A vida sem o único filho tem seguido com a ajuda de terapia e remédios, e a chegada da data a manteve mais reclusa do que o normal. "Ela continua em estado de luto. Todos lá ainda vivem o luto e esta é uma data muito forte para eles", disse o advogado da família, Nilton Ribeiro, assistente de acusação no processo que, a pedido do Ministério Público do Paraná, pode acabar com sete pessoas no banco dos réus.
Além de Edison Brittes Jr., a alegação final da 1.ª Promotoria de Justiça do Foro Regional de São José dos Pinhais ainda pede que sejam levados a júri popular por homicídio triplamente qualificado os jovens David William da Silva, Ygor King e Eduardo Henrique da Silva e Cristiana Brittes, esposa do réu confesso.
Solta da prisão no dia 12 de setembro, Cristiana é quem aparece ao lado de Daniel em fotos compartilhadas pelo jogador com um amigo na madrugada do crime, após a festa dos 18 anos de Allana Brittes, filha do casal Brittes, em uma balada de Curitiba.
As imagens foram feitas durante uma pós-comemoração na própria casa da família Brittes, no quarto onde Cristiana dormia. Para a defesa da família, houve estupro e a reação do marido foi o assassinato. Para o delegado que investigou o caso, Amadeu Trevisan, porém, não houve estupro e a morte de Daniel foi "totalmente desproporcional e cruel", referindo-se ao fato de o atleta ter sido torturado e ter tido o pênis decepado.
A expectativa é de que até dezembro a juíza Luciani Regina Martins de Paula, da 1.ª Vara Criminal de São José dos Pinhais, se pronuncie sobre por quais crimes — e se — deve responder cada um dos réus.
Entre os acusados, Edison é o que deve ser julgado pelo maior número de crimes: homicídio triplamente qualificado, coação de testemunhas, ocultação de cadáver, fraude processual e corrupção de adolescente — um dia após o crime, ele teria tentado combinar uma versão da história com dois jovens de 17 anos que estavam na festa em sua casa.
David Willian, Ygor King e Eduardo Henrique, que teriam ajudado Edison a carregar o corpo do jogador até o matagal onde ele acabou de ser morto, foram denunciados por homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver e fraude processual. Nas alegações finais, o MP-PR voltou atrás e indicou que não cabe contra eles o crime corrupção de adolescente, como consta na denúncia.
Contra a esposa de Edison Brittes, Cristiana Brittes, constam os crimes de coação de testemunha, fraude processal, corrupção de adolescente e homicídio triplamente qualificado. A apuração da polícia não a indiciou pela morte direta de Daniel, mas o MP-PR entendeu que a atuação dela foi determinante para o assassinato.
Allana Brittes, filha de Edison e Cristiana, responde por fraude processual, coação de testemunhas e corrupção de adolescentes, e Evellyn Brisola, por denunciação caluniosa, fraude processual e falso testemunho.
A decisão da magistrada levará em conta o que falaram as mais de 80 testemunhas e os réus durante as audiências de instrução — sessões marcadas por bate-boca entre advogados, ironias a perder de vista e até selfies entre os réus.
"O que chamou muito atenção, e para a família principalmente, foi a frieza dos réus, de não mostrarem um pingo de arrependimento", observou o advogado da família do jogador. "Agora, a esperança é a sentença de pronúncia. Eu acredito que todos serão pronunciados e que Cristiana também vai a júri por homicídio. Embora não tenha praticado o crime, ela instigou a morte de Daniel", defendeu Ribeiro.
Reação
Claudio Dalledone Jr, advogado da família Brittes, sustenta o oposto. "Ficou comprovado que houve importunação sexual e as fotografias também materializam que Daniel cometeu o crime de importunação. Eu acredito que a juíza não vai reconhecer a participação de Cristiana no crime", reafirma.
Segundo o advogado, embora o processo até aqui tenha ocorrido de forma célere e sem percalços, a manutenção de Cristiana e de Allana Brittes na prisão por mais de nove meses foi desproporcional. Mãe e filha foram detidas cinco dias após a morte do jogador e soltas recentemente: Cristiana em 12 de setembro e Allana, 7 de agosto.
Agora, a defesa se empenha em estudar uma maneira de tirar Edison Brittes Jr. da cadeia. "As coisas caminham agora para a resolução desta primeira fase, mas não sem antes tentarmos a soltura de Edison", afirmou Dalledone.
Rodrigo Faucz, defensor de David Willian e Ygor King, também prevê uma decisão mais branda da Justiça. Para ele, relatos das testemunhas comprovaram que a dupla — que esteve no matagal onde Brittes Jr. terminou de matar Daniel — não participou diretamente do assassinato. "Ficou claro que eles não participaram. Nossa expectativa é de que eles não vão a júri popular pelo homicídio, mas que respondam por lesão corporal e os outros eventuais", disse.
Quanto ao envolvimento de Evellyn Brisola, advogado Luís Roberto de Oliveira Zagonel pretende fazer com que, como nas conclusões da polícia, ela volte a ser apenas uma testemunha do caso. "A polícia entendeu que ela era uma mera testemunha e foi extrema surpresa ela ser denunciada por quatro imputações. Nas alegações nos cabe com folga requerer a absolvição por esses quatro crimes".
A reportagem não conseguiu contato com Edson Stadler, advogado de Eduardo Henrique da Silva. Mas ao jornal Tribuna do Paraná, o defensor criticou o inquérito policial e disse que a investigação deixou muito a esclarecer. "Faltou o delegado fazer uma careação entre os réus, já que cada um falou uma coisa. Se o inquérito tivesse esclarecido tudo, não precisaríamos levantar tantas provas na instrução processual”, disse.
A 1ª Promotoria de Justiça do Foro Regional de São José dos Pinhais não quis conceder entrevista e, por meio da assessoria de imprensa do Ministério Público, esclareceu que todas as manifestações necessárias são feitas nos autos.
O caso
O corpo do jogador Daniel foi encontrado na manhã do dia 27 de outubro de 2018 em um matagal de São José de Pinhais. A vítima teve o pescoço quase degolado e o órgão sexual decepado.
Antes de ser assassinado, o atleta havia passado a noite na festa de 18 anos de Allana. Depois da comemoração em uma casa noturna no bairro Batel, em Curitiba, o jogador acompanhou a família e outros amigos da jovem para uma outra festa na casa da família Brittes, onde foi espancado e, depois, levado para um matagal em São José dos Pinhais.
Edison Brittes Jr. admitiu ter matado o jogador após supostamente tê-lo flagrado tentando estuprar sua esposa - tese que foi descartada pela investigação, mas é sustentada pela defesa da família.
Natural de Juiz de Fora, Minas Gerais, Daniel foi revelado pelo Cruzeiro, mas iniciou a carreira no Botafogo. Depois, passou por São Paulo, com quem ainda tinha contrato, e foi emprestado ao Coxa, Ponte Preta e São Bento, time que defendia atualmente. Pelo Alviverde, na temporada passada, disputou apenas seis jogos, devido a lesões crônicas no joelho, que o atrapalhou nos últimos anos.
A vítima não era casado, mas tinha uma filha pequena que, por decisão da Justiça, terá de receber pensão de R$ 5 mil por mês de Edison Brittes.
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