| Foto: Arquivo da Família
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Ao coletar horas de depoimentos de imigrantes, esmiuçar documentos de décadas atrás e escrever centenas de páginas de estudos, a professora, pesquisadora e doutora em História Eslava Oksana Olga Boruszenko eternizou a própria trajetória e a de milhares de ucranianos que se viram obrigados a sair do país natal e encontrar nova pátria. Reconhecida nacional e internacionalmente por seu trabalho de resgate e disseminação da memória ucraniana no Brasil, Oksana faleceu aos 80 anos, no dia 3 de janeiro, vítima de uma parada cardiorrespiratória.

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Antes de traçar grande parte de sua carreira acadêmica em Curitiba, ela e a família passaram por diferentes localidades. A viagem para o Brasil aconteceu em 1949, no porão de um navio, precedida por quatro anos em um campo de refugiados da Segunda Guerra Mundial em Regensburg, na Alemanha. Lá, um capítulo inusitado dessa história foi escrito, pois os Boruszenko dividiram apartamento – que apesar de pequeno, por necessidade comportava uma dezena de pessoas de diferentes famílias – com o então adolescente Roman Polanski e seus pais. Ele se tornou cineasta aclamado.

Ilha das Flores (RJ) e Marechal Mallet (PR) foram as cidades brasileiras pelas quais os Boruszenko passaram antes de fixar residência em Apucarana (PR), onde eram esperados, e onde, apesar de ser encabeçada por um engenheiro e uma professora, a família trabalhou com agricultura. Em Curitiba a partir de 1952, Oksana focou nos estudos. "Quando ela escolheu cursar História e Geografia na UFPR, nosso pai disse que seria muito bom porque nós, ucranianos, precisávamos de alguém que escrevesse a história dos imigrantes espalhados pelo mundo", conta a irmã e pianista Larissa Boruschenko.

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Lecionou na UFPR por mais de 20 anos. Ao orientar trabalhos, era empática e fazia amigos. Chegava a emprestar casacos do sobrinho para pesquisadores que vinham de estados de clima mais quente, despreparados para o frio curitibano. Na Universidade de Munique, na Alemanha, concluiu doutorado com tese sobre a “Integração dos Ucranianos no Brasil”. Foi professora visitante em universidades da Argentina, Canadá, Alemanha, Ucrânia e Estados Unidos, além de publicar mais de 50 trabalhos nesses e outros países.

Como primeira pesquisadora a aprofundar os estudos e a dedicar toda a trajetória acadêmica à preservação da memória da imigração ucraniana no Brasil e no mundo, prestou um serviço de grande valor à história do povo, reconhecido com Cidadania Honorária em Curitiba e em Winnipeg (Canadá) e Medalha de Honra ao Mérito na Ucrânia. Ela foi essencial para o progresso da história oral, com enorme acervo de depoimentos, e para a abertura de documentos essenciais para a identidade ucraniana – foi convidada pela então URSS, por exemplo, para atuar no resgate de documentos sobre a história do povo de origem.

Vice-presidente da Confederação Mundial de Mulheres Ucranianas e integrante da executiva da Representação Central Ucraniano-Brasileira, sua dedicação à comunidade ia além da academia. Quando não estava trabalhando, viajava. Passeou de balão pela Capadócia e conheceu as maiores concentrações de ucranianos fora da Ucrânia, como EUA e Canadá.

"Os traços mais importantes da personalidade dela eram a generosidade, o patriotismo, a fé e o senso de humor", relata Larissa. Entre os amigos e família, sua doçura era tão grande quanto seus feitos científicos.