As fortes chuvas voltaram a castigar Curitiba nos três primeiros meses de 2019. Enchentes, quedas de árvores, corte da energia elétrica, caos no trânsito e abertura de buracos foram alguns dos desafios que os moradores e comerciantes tiveram de enfrentar em mais um verão chuvoso na cidade. O ápice foi no dia 21 de fevereiro, quando em apenas duas horas o volume de água alcançou 118 milímetros, o equivalente a 80% de todo o volume de chuva previsto para fevereiro inteiro.
O resultado, além do cenário descrito no início do texto, foi a reabertura da cratera na Rua Desembargador Westphalen, entre as avenidas Visconde de Guarapuava e Sete de Setembro, um dos trechos mais movimentados do Centro de Curitiba. Situação agravada pela chuva do dia 7 de março, quando reabriu o buracão na Wespthalen, levando à interdição para consertos pontuais e exigindo que o prefeito Rafael Greca (PMN) determinasse uma obra emergencial para 2020 ao longo de toda a via, do Centro à Linha Verde, para substituir a tubulação pluvial da década de 1940, que há anos não dá conta da vazão.
O temporal do dia 21 de fevereiro foi exatamente na mesma data de uma das enchentes mais marcantes na cidade, 20 anos antes. Em 1999, uma tempestade atingiu em cheio as bacias do Rio Belém e do Rio Barigui, resultando na maior enchente dos últimos 40 anos. Na ocasião, a água chegou a 70 cm de altura na Boca Maldita, coração do Centro de Curitiba. A foto de uma Kombi cruzando o “rio” formado pela enchente na Avenida Luiz Xavier, na frente do Palácio Avenida, marcou aquela inundação.
Independentemente da força das chuvas, especialistas apontam que a cidade precisa encontrar novos caminhos para evitar mais transtornos e prejuízo.
Dos cerca de 480 rios curitibanos, entre 70% e 80% são canalizados. Entretanto, o caminho apontado por especialistas seria reabrir os rios que estão enterrados. O movimento é visto como tendência em metrópoles desenvolvidas e já é realidade em algumas cidades.
Em novembro de 2017, algumas propostas sobre a despoluição da bacia do Rio Belém começaram a surgir. Com extensão de 84 km², o rio possui nascente e foz dentro do perímetro urbano de Curitiba, mas desapareceu do Centro da cidade em 1978, quando foi canalizado o trecho até a Avenida Cândido de Abreu, no Centro Cívico. A engenheira civil Lucy Schellin, da Secretaria Municipal de Meio Ambiente chegou a defender, em reportagem de dois anos atrás, o que poderia vir a ser um projeto piloto de navegação da bacia do Rio Belém. “Bastaria ajustar a vazão e dar o suporte para a navegabilidade”, pontuou.
Outra possibilidade é a descanalização de rios urbanos, o que já acontece em algumas metrópoles desenvolvidas. No entanto, o arquiteto e professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) Marlos Hardt, especializado em arquitetura sustentável e mestre em gestão urbana, acredita que é um movimento difícil de acontecer por aqui. "Muitas vezes é inviável a descanalização porque já se retificou o curso da água. O rio possui meandros que têm a intenção de diminuir a velocidade da água que corre", argumenta. "Descanalizar é uma tendência mundial, mas não é solução dos problemas", pontua.
O arquiteto defende que a infraestrutura precisa acompanhar o adensamento da cidade. A Secretaria Municipal de Obras Públicas (SMOP) afirma que nos últimos dois anos tem concentrado esforços e investimentos para garantir que a população sinta cada vez menos os impactos das chuvas. Uma série de obras de drenagem já está em andamento e outro lote de intervenções está para começar. As ações para combater enchentes e alagamentos somam, ao todo, R$ 480 milhões. A maior parte dos recursos será repassada pelo governo federal à prefeitura. Em contrapartida, o município deve investir R$ 2,4 milhões.
Novas possibilidades
Em entrevista recente à Gazeta do Povo, o pesquisador Roberto Fendrich, do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Universidade Federal do Paraná (UFPR), diz que é preciso agir adotando soluções inteligentes, principalmente diante do alto índice de hipermeabilização do solo de Curitiba. Ele, que há três décadas estuda as enchentes nas cidades paranaenses, defende mais redes de microdrenagem (redes coletoras de águas pluviais, sarjetas, bocas-de-lobo e meios-fios) e indica a necessidade de microrreservatórios em todas as residências e edifícios.
“Acredito que os mecanismos para diminuir os impactos sejam as infraestruturas verdes, como biovaletas, jardins de chuva, telhados verdes e paredes verdes. Essas são estruturas que conseguem retardar a quantidade de água que vai para o curso d'água", defende. "A enchente é um fenômeno natural. Com infraestrutura verde a gente tem mecanismos para mitigar boa parte dos casos, mas resolver completamente é muito difícil", aponta
Tecnicamente, a enchente é um fenômeno esperado. O volume de chuvas no primeiro trimestre de cada ano possui uma média mais alta que no restante do ano. Os prejuízos só acontecem, portanto, quando existe ocupação humana sobre as áreas marginais dos rios. Visando minimizar os problemas, os municípios brasileiros passaram a investir em obras de macrodrenagem. As intervenções, feitas nos rios e seus afluentes, ajudam a diminuir a erosão, o assoreamento, as inundações ao longo dos fundos de vale. São serviços em galerias, canalizações, perfilamento de rios, lagoas de contenção e detenção.
A estratégia não é diferente em Curitiba. Na área de macrodrenagem, o maior volume de recursos está destinado à Bacia do Rio Belém, segundo a SMOP. Há ainda recursos para obras nas bacias do Barigui, Ribeirão dos Padilhas e Atuba e para a elaboração de projetos na Bacia do Rio Iguaçu.
Nos últimos dois anos, há também um serviço permanente de limpeza dos rios e canais, para evitar o acúmulo de lixo, complementa a SMOP. Serviços de limpeza em rios, córregos e canais foram realizados para minimizar os efeitos dos temporais e recuperar o meio ambiente.
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