Engana-se quem pensa que, em Curitiba, as bicicletas são usadas pela população apenas para passeios em parques ou aos fins de semana. Em 2018, quase 80% dos ciclistas da capital estão usando a bicicleta como meio de deslocamento até o local de trabalho, e 38,8% pedalam para a escola ou faculdade. Essas pessoas, no entanto, ainda apontam a falta de infraestrutura e a baixa segurança no trânsito como os principais problemas no dia a dia. Os dados são parte da recém-lançada pesquisa Perfil do Ciclista, que traça um panorama dos usuários de bicicletas em Curitiba e em outras 23 cidades do Brasil.
A pesquisa é uma iniciativa da Associação Transporte Ativo e do Laboratório de Mobilidade Sustentável da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Labmob-UFRJ), e na capital paranaense foi aplicada pela Associação de Ciclistas do Alto Iguaçu (Cicloiguaçu).
Veja os gráficos da pesquisa abaixo
Fernando Rosembaum, um dos responsáveis pela realização da pesquisa em Curitiba e um dos fundadores da associação e do posto de apoio Bicicletaria Cultural, destaca que a falta de segurança no trânsito foi um dos principais problemas apontados na pesquisa. “Um dos aspectos que mais chamam a atenção na pesquisa é que, diferente do que muita gente pensa, a segurança pública não é o problema que mais incomoda quem pedala em Curitiba. Isso mostra o quanto a segurança no trânsito está muito ruim por aqui”, opina Rosembaum.
De acordo com o ativista, foram 841 ciclistas entrevistados na capital - uma parte no anel central e outra no anel periférico. “A pesquisa começava justamente perguntando se as pessoas usavam a bicicleta apenas para passeio ou no dia a dia. O resultado é que, além de 78,8% usarem para ir ao trabalho, 73,8% também usam para lazer”, conta Rosebaum, que recebe cerca de 20 ciclistas diariamente na Bicicletaria Cultural. O local é um espaço para os usuários do pedal tomarem banho e deixarem a bicicleta após o trajeto, motivo pelo qual o ativista tem contato com diversas reclamações dos ciclistas.
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“É interessante que pessoas de todas as classes sociais usam a bicicleta. Mas, quanto mais diversidade de grupos - mulheres, jovens, estudantes - nós vemos, mais significa que a malha cicloviária tem qualidade”, considera. Chama a atenção, por exemplo, a quantidade relativamente pequena dos ciclistas que usam a bike para ir à escola ou à faculdade, que não chega nem à metade da quantidade que usa para ir ao trabalho.
Para o especialista em planejamento urbano Carlos Hardt, “isso está diretamente relacionado à pouca segurança do trânsito, que impede que esse grupo opte pela bicicleta”, avalia. Ele é arquiteto e urbanista e leciona na área de mobilidade na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
Apesar da pouca segurança, há principalmente dois motivos que fazem os curitibanos começarem a usar a bicicleta, de acordo com a pesquisa: a praticidade e a rapidez desse meio de transporte, apontadas por 35,9% dos entrevistados como o gatilho para iniciar nos pedais. A bike, porém, também é escolhida por motivos de saúde (27,1%), custo (18,7%) e preocupação ambiental (4,8%).
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Demandas e planos
Em seu plano de governo, o prefeito Rafael Greca (PMN) prometeu “dar continuidade a ações que incentivam o uso da bicicleta como meio de transporte”. A intenção foi reforçada quando, ainda em 2016, Greca assinou uma carta-compromisso em que garantia investimentos no setor. Os integrantes da Cicloiguaçu, porém, discordam que isso tenha acontecido. “A prefeitura continua sem um plano cicloviário, e os ciclistas se sentem desamparados”, conta Rosembaum.
Hardt, por sua vez, acredita que a solução vai além do plano estrutural, e engloba também a questão da educação no trânsito. “Precisamos quebrar a tendência de agressividade e individualidade que existe no trânsito de Curitiba, senão não há ciclovia que resolva a questão da segurança. Isso só acontece por meio de medidas educativas e informação sobre o trânsito, que também cabem ao governo planejar, e ao cidadão executar”, explica o urbanista.
Uma das principais pautas de mobilidade defendidas pelos ciclistas, a continuidade da área calma pode ser justamente um dos meios mais eficientes de melhorar a segurança no trânsito, na opinião do especialista. “Não há dúvida nenhuma de que a velocidade permitida ao automóvel e a intensidade do tráfego dão a sensação de segurança - ou insegurança - no trânsito para o ciclista e para o pedestre”, afirma.