Viu que iria fazer sol, mas choveu? Não culpe o Simepar. A previsão do tempo é uma ciência complexa. Veja como a meteorologia está tentando diminuir os erros de previsão e impactos econômicos-sociais decorrentes deles.
Não há por aqui, infelizmente, um levantamento semelhante. Mas um instituto de pesquisa do Reino Unido, o ICM Research, chegou à conclusão em 2010 de que os britânicos gastam seis meses de suas vidas apenas falando sobre “que frio é esse”, “será que chove” e toda sorte de agouros do tempo. Fosse para apostar, certamente esse small talk roubaria mais semanas dos curitibanos, já que a cidade parece ter um humor climático um tanto mais temperamental, digamos, do que a sempre sisuda Londres. Uma pequena surpresa diária que até pode parecer bobagem para quebrar o gelo com desconhecidos no papo de elevador, mas que tem importância extrema em setores da economia e infraestrutura – e, claro, na escolha do suéter correto para sair de casa.
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O fato é que, embora seja fundamental para agricultura, pecuária, energia, comércio de bens e prevenção de desastres, por exemplo, a previsão do tempo ainda não é 100% confiável. E é bem provável que o homem chegue a Marte (algo calculado para 2030) antes que ela seja completamente eficiente. Sobretudo em regiões abençoadas com padrões caóticos de atmosfera, como o Paraná. “A região Sul como um todo é bem complicada para previsão. E aqui, entre o Paraná e São Paulo, está bem na divisa entre uma região mais fria [Sul do Brasil] e com clima mais determinado e a uma com características heterogêneas, a Sudeste. Estamos bem no meio”, diz Ana Beatriz Porto da Silva, meteorologista do Simepar, o mais conhecido instituto de medição atuando no estado.
Não é uma percepção isolada. Todo profissional do tempo leva um baile às vezes. “Não conseguimos captar esse excesso de chuvas que tivemos aí no Paraná. Estamos ainda buscando entender por que está ocorrendo este fenômeno nesse período”, descreve Luiz Carlos Pittol Marini, meteorologista do Inmet, o instituto federal de meteorologia – que faz as medições em todo o solo nacional e envia para centros de estudos internacionais. A chuva correu por baixo de suas barbas.
A região leste do Paraná parece especialmente reservada ao acaso. Fatores importantes para acertar na receita do bolo das previsões tornam tudo aqui, com muito trocadilho, nebuloso –como a (pouca) incidência de luz solar e a Serra do Mar. “Nesta faixa, a temperatura é bem diferente da do interior do estado. Estamos a quase mil metros do nível do mar e a Serra influencia muito. Temos dificuldade de ter uma mesma temperatura por vários dias consecutivos por conta disso tudo”, aponta a especialista do Simepar.
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Quando o cálculo sai errado, vira reclamação no boteco, fila do banco, ponto de ônibus, táxi ou Facebook dos institutos de medição. “Cadê a chuva em Curitiba hoje, Simepar? [Previsão de] 22,6 mm para hoje e até agora não deu 0,1 mm”, bradou um dos seguidores nos comentários de um post. O instituto não tem, porém, o cálculo de margem de erros e acertos em um ano.
Está melhorando
Como em tudo, o erro marca mais do que o acerto. Os números de outros institutos mostram que os erros na previsão vêm diminuindo. Há cerca de duas décadas, a margem de acerto era só de 50%, na média. Saltou para mais de 90%. Muito por causa do método como os cientistas calculam a previsão no curto prazo. Basicamente, chegar àqueles números de temperaturas mínima e máxima anunciados no jornal exige contas matemáticas assustadoras. Elas eram feitas na mão em um passado próximo. Hoje, são trabalho para supercomputadores, capazes de organizar o mar de números sobre a atmosfera e fazer o cálculo em frações de segundo.
No Simepar, o homem deu lugar à máquina neste ano. “Antes eram os meteorologistas que faziam toda a previsão. Fazíamos cálculos para até cinco dias e disponibilizávamos no site. Agora é direto saído do modelo [o nome técnico para este cálculo feito pelas máquinas]”, explica Ana beatriz. O software faz a equação complexa e dá o diagnóstico: tempo chuvoso, ensolarado, etc... “Esses supercomputadores conseguem simular a atmosfera para o futuro. Até temos como fazer correção no primeiro e segundo dias, mas até o 15º, tudo vem do computador”, explica.
Em comum, qualquer instituto que você consulta na internet trabalha de uma forma parecida: operam com sensores e radares espalhados em terra e com informações fornecidas por satélites e outros instrumentos. Esses equipamentos mandam as informações que serão processadas pelo software. No modelo mais eficiente de medição, que é o regional, consegue-se detalhamento mais preciso. Mas por um tempo curto. Para o professor de Meteorologia da USP, José Pereira Filho, a eficiência é alta nos primeiros dias e diminui nos seguintes. Por isso, programar uma viagem para a praia olhando a previsão de tempo já na segunda-feira é péssima ideia.
Após esta equação ter sido feita pela máquina, os meteorologistas fazem correções que acharem necessárias e enviam as informações para os sites (Simepar, Climatempo, Inmet, entre outros). “Claro que há erros [da máquina]. Já teve dias em que tínhamos a previsão para até seis dias, que deu problema na saída do modelo. Às vezes o profissional olha para a saída e pensa: ‘acho que este modelos está diminuindo muito a temperatura; acho que vou aumentar’ Mas de uma forma geral, está correndo certo”, explica Ana Beatriz.
E o quanto exatamente o computador é melhor do que o humano nesta previsão? O Simepar está em busca desta resposta. Como este novo modelo acabou de ser implementado, o instituto está comparando a previsão feita exclusivamente pelos humanos com as feitas pela máquina para saber quem se sai melhor. A vantagem deste novo modelo, aponta a meteorologista, é poder ter previsões ainda mais regionalizadas. Em vez da região metropolitana de Curitiba, por exemplo, ele pode dar a temperatura exclusiva de Pinhais.
Tempo é dinheiro
Conhecer o tempo não é perfumaria. Este tipo de tempo também é dinheiro. “Pagamos um serviço de meteorologia para fazer análise em nossa região. Por exemplo, quando há previsão de geada, precisamos saber na véspera ou dias anteriores para poder proteger a lavoura”, conta Jandir Paula de Ramos, que é produtor de hortaliças em Tijucas do Sul. Ser pego de surpresa, ele garante, já lhe causou prejuízo de alguns milhares de reais. “Está muito melhor hoje. Sinto que os erros diminuíram muito. Mas ainda tem o olho do agricultor. Como estamos no campo há algum tempo, sabemos nos antecipar a algumas mudanças”, aponta.
Há uma série de outros campos em que conhecer o tempo é essencial. “Os nossos institutos são perfeitos para o prazo curto. O problema é o longo prazo. O mês que vem. O grande problema é errar o mês. O inverno que deveria vir em abril e vem só depois. Hoje, por exemplo, fez frio. Mas não tem um lojista preparado pra vender cachecol”, define Camilo Turmina, vice-presidente da Associação Comercial do Paraná (ACP). “Já é uma aventura você quantificar seus estoques [em períodos normais]. Aí o inverno não está na estação certa... Se ele vem atrasado, o indivíduo já não compra porque o verão chegará logo. Em uma cidade como Curitiba é imprevisível tudo. É terrível”, define.
A mudança não reflete exatamente em prejuízo, neste caso, mas na perda de lucro. “Quando acontece um fator diferente, desaparece a margem de lucro. O lojista vai vender do mesmo jeito, mas vai ter que torrar o estoque”, aponta. “O lojista tem que torrar [o estoque], mesmo sabendo que daqui a pouco muda de novo. Se ele perder o timing, só vende no ano quem vem. E daí já mudou a tendência, já mudou a moda. O indivíduo vive com uma bola de cristal”, diz.
“O tempo quando não é coerente com a época, ele bloqueia as vendas. Quem ia comprar inverno não compra e quem iria comprar verão não compra porque não esquentou. Esse é o principal fator nas vendas de confecção, tirando a economia”, destaca Rui Machado, da loja de roupas Lua Nova. “Em relação ao clima, esse ano de 2018 foi o mais complicado. O frio só veio em junho e o pessoal tinha mercadoria de inverno em março, abril e maio. O comércio passou a liquidar”, define.
A arte de vender guarda-chuvas
Se comerciantes tradicionais são engolidos pela mudança de tempo, os informais fazem a festa. É justamente nas falhas da previsão que os vendedores ambulantes de guarda-chuva faturam mais. Em uma tarde chuvosa da última semana, próximo à estação central de biarticulado de Curitiba, Adelino Cruz carregava por volta de 25 guarda-chuvas pretos tradicionais, pelos quais pedia R$ 10 cada. “Hoje não é um dia tão bom porque muita gente já saiu de casa com guarda-chuva”, conta. Naquele dia, as nuvens pesadas pela manhã e o alerta dos meteorologistas foram eficientes.
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Mas “dá para ganhar uma graninha” com a surpresa, ele explica. Morador de São José dos Pinhais e sem emprego formal há dois anos, ao menor sinal de garoa, ele corre para uma rede atacadista na Avenida das Torres. Ali compra uma média de 40 guarda-chuvas a R$ 7 ou R$ 8 e revende em pontos estratégicos do centro de Curitiba a R$ 10 ou R$ 12. Com sorte, leva para casa algo em torno de R$ 100. “Não dá para cobrar mais porque as pessoas se acostumaram a pagar R$ 10”, diz. “Tem muita gente vendendo. Mas sai bastante quando é aquela chuva forte umas 5, 6 da tarde. Quando vira o tempo e ninguém espera”, justifica.
É quase uma orquestra do caos. “Ninguém aqui olha a previsão, não. A gente para o céu mesmo”, brinca um colega, com mais uma porção de artefatos ao seu lado.
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A ciência da previsão
Parece algo simples, mas não é. Os dados que levam à previsão do tempo são fruto da análise de uma série de variáveis que só são possíveis de conhecer graças a uma grande rede de colaboração mundial:
Dados dos países: cada país contribui para conhecer o perfil do tempo no globo. Instituições nacionais – no Brasil é a Inmet – reúnem dados sobre sua atmosfera, temperaturas, ventos, chuvas e o que mais ocorre e envia esses números para centros mundiais de análise.
Os centros: são vinculados à Organização das Nações Unidas – em um braço que se chama Organização Meteorológica Mundial. Estão em Washington (Estados Unidos), Moscou (Rússia) e Melbourne (Austrália). Cabe a estes escritórios traçarem um mapa mundial de como o tempo está ao redor do globo. Assim como os países alimentam os centros com dados, os centros abastecem os países com informações contextualizadas.
Como se capta a informação: de várias formas. Os institutos nacionais fazem acordos com navios e aviões comerciais para instalar sensores e descobrir, por exemplo, pressão atmosférica no oceano e diferenças de temperaturas nos ares. Além disso, balões meteorológicos, sensores em terra e radares de chuva fornecem dados adicionais.
O que acontece com os dados: supercomputadores analisam todo esse conjunto de informações para prever o que pode acontecer nas próximas horas e dias. O cenário atual tende a se manter? Há uma frente fria se aproximando? Correntes do oceano podem trazer nebulosidade para determinada região?
E o papel do humano? Cabe ao meteorologista entender se o cenário descrito pelo computador é plausível. Parece um contrassenso, mas não é. O problema é que os dados capturados por todo esse sistema mostra apenas uma parte do que acontece na atmosfera. Há vários outros fenômenos que os cientistas ainda não conhecem. Portanto, uma análise bem feita exige, também, uma boa dose de interpretação subjetiva – algo que as máquinas ainda não fazem.
Clima X tempo
Não são a mesma coisa. O que olhamos todos os dias no celular, jornal ou programa de tevê é a provisão do tempo, que é, via de regra, como as condições atmosféricas se comportarão no curto prazo – um dia, semana ou mês. Clima é a característica no longo prazo. O conjunto do comportamento histórico do tempo no Brasil mostra que o país tem clima tropical.
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