“É um pesadelo para o povo”. A frase do aposentado Aldo José, de 57 anos, reflete o sentimento da população de São José dos Pinhais, município da Região Metropolitana de Curitiba (RMC), em relação à saúde pública. Depois do fechamento da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Rui Barbosa para reformas, no começo de março, o pronto-socorro do Hospital e Maternidade do município fechou as portas na semana passada. “Isso é uma vergonha pro município. A população está sofrendo”, resume Eurides Natel dos Santos, 57, pedreiro.
A assistente administrativa Eliane Couto de Almeida, 42, fez uma biópsia no hospital há alguns dias. Ela tem o retorno agendado para dia 24 de maio, mas com o atendimento suspenso, não sabe o que vai acontecer. “Só por Deus mesmo. Tem que contar com a sorte e olhe lá ainda”.
Benedita Candido de Almeida, 67, relembra das promessas de campanha do prefeito de São José dos Pinhais, Toninho Fenelon (PSC). “Na eleição ele prometeu que ia cuidar da saúde de São José dos Pinhais. Ele falou muito sobre a saúde, que ia melhorar a saúde pra nós e agora ele acaba fechando”, desabafa. Em entrevista dada à Tribuna do Paraná em abril deste ano, o prefeito citou que apesar da queda histórica no orçamento de 2017, trabalhava para manter os serviços básicos. Ele enfatizou que a saúde era uma das prioridades.
Falta grana
Segundo a prefeitura, o pronto-socorro foi fechado por dois motivos: quase 100% das equipes médicas e de enfermagem eram de empresa terceirizada e desde 2013 os órgãos de controle estavam orientando para que se encerrasse essa situação – o que foi feito agora. Além disso, para manter o atendimento integral para alta complexidade, o HMSJP recebia um repasse de recursos estaduais e federais de aproximadamente R$ 1,4 milhão ao mês, enquanto o custo mensal para manter esses atendimentos estava entre R$ 5 milhões e R$ 6 milhões. O município vinha, inclusive, arcando com o tratamento de pacientes de outros municípios e de outros estados, quando eram trazidos por ambulâncias. Cerca de 30 ambulâncias com pacientes eram recebidas por dia.
Falta gente
Para suprir a dispensa dos terceirizados, foram chamados 122 médicos aprovados no último concurso público, mas apenas 78 já assumiram. De acordo com a administração, esse número de profissionais ainda é insuficiente para manter todos os serviços abertos do hospital.
A Secretaria Municipal de Saúde também está buscando profissionais médicos para assumir plantões presenciais por meio de hora extra ou via contrato direto pessoa física para quem não é médico estatutário. Já está em avaliação a modalidade de credenciamento, processo seletivo simplificado e abertura de concurso público devido à gravidade dos fatos.
A pasta notificou os órgãos públicos de controle externo, Câmara de Vereadores, Secretaria de Estado da Saúde e Conselho Municipal de Saúde, estabelecendo prazo de 180 dias para adequação do quadro de funcionários e avaliação do novo modelo de trabalho à realidade do Hospital São José.
Falta estrutura
Dos mais de 6 mil pacientes atendidos mensalmente pelo Siate e Samu da Grande Curitiba, 15% eram transportados e atendidos no pronto-socorro do HMSJP. Além disso, a grande maioria dos acidentados nas BRs 277 e 376, que são atendidos pelas ambulâncias das concessionárias Litoral Sul e Ecovia, eram levados para a unidade. Mais de 1,4 mil internamentos são realizados por mês no hospital nos 30 leitos de Unidade de Terapia Intensiva (adulta e neonatal), maternidade, pediatria, enfermaria adulta e bloco cirúrgico.
Conforme a Secretaria Municipal de Saúde, o bloqueio do pronto-socorro foi necessário para impedir que um número maior de pacientes provenientes de outros municípios, transportados pelo Samu e pelo Siate, colocassem em risco a vida dos pacientes já internados no Hospital São José.
Sem o pronto-socorro do hospital e com a UPA Rui Barbosa fechada, casos de urgência e emergência estão sendo direcionadas para a UPA Afonso Pena. A ajudante de serviços gerais Simone Veríssimo Ferreira, 39, conta que, na última quinta-feira, chegou às 18h nesta unidade, esperou até as 21h, não foi atendida e foi embora. “Ainda estavam atendendo as pessoas que chegaram às 11h da manhã. Se for pra ficar sentada com dor, é melhor ir pra casa e passar dor em casa”.
A dona de casa Larissa Lais de Brito, 20, tem um filho pequeno com bronquite. Na semana passada, foi até a UPA Afonso Pena e também desistiu do atendimento. “Estava lotado, não tinha nem onde deixar o carro”, relata. Para ela, a situação vai piorar com o fechamento do pronto-socorro. “É ruim, ainda mais pra quem tem criança pequena. Tem que ter paciência”.
Como a Tribuna do Paraná mostrou em fevereiro, a espera na UPA Afonso Pena chega a passar de sete horas. A prefeitura alega que segue o protocolo de Manchester, em que o tempo de atendimento varia de imediato (emergências) a 4 horas (casos não urgentes). Mas admite que “há dias que os casos de urgência e emergência tomam conta das equipes de tal forma que os casos pouco ou não urgentes esperam um tempo maior para consultar”.
A administração ressalta que “a demanda do hospital que migrou para a UPA Afonso Pena não tem impacto tão grande no número de atendimentos, pois o hospital já priorizava o atendimento de alta complexidade e uma parte significativa de seus atendimentos eram oriundos de emergências de outros municípios e das rodovias federais”. De acordo com a prefeitura, o movimento na UPA Afonso Pena está aumentando principalmente devido à época do ano (com registro de maior procura pelas síndromes respiratórias) e devido à migração de pacientes, já que outras UPAs foram fechadas na região metropolitana. A UPA trabalha com 10 médicos de dia, 6 à noite e 3 das 19h à 1h.
E a UPA Rui Barbosa?
A prefeitura alega que a reforma da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Rui Barbosa era emergencial. Segundo a administração municipal, o telhado tinha muitas infiltrações e apenas um dos quatro banheiros estava funcionando. “A reforma era necessária e não tinha mais condições de ser adiada. Um prédio com vários de anos de construção e que precisava passar por uma grande reforma para poder oferecer um atendimento de qualidade para a nossa população”, explica o prefeito Toninho. A reforma geral inclui reparo no telhado, troca do forro, encanamentos, rede elétrica, esgoto, banheiros, centro cirúrgico. “As obras têm previsão de conclusão para o segundo semestre deste ano”, informa.