Uma das iniciativas adotadas pelo governo federal para mitigar os efeitos da pandemia da Covid-19 foi a possibilidade de empregadores suspenderem contratos de trabalho ou promoverem uma redução proporcional de jornada e salários dos funcionários. De acordo com o governo, o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda celebrou 18,6 milhões de acordos, envolvendo 9,7 milhões de trabalhadores. Com o fim de ano se aproximando, quem teve alterações no salário quer saber como ficará o cálculo do 13.º em 2020.
A questão está em uma espécie de limbo jurídico, e há diferentes entendimentos. Alguns juristas argumentam que o 13.º será calculado com base nos valores recebidos ao longo dos meses. Portanto, quem teve redução no salário veria esse efeito se repetir na gratificação. Outro grupo defende que o pagamento deve ser feito de modo integral.
Até o momento, o governo não fez nenhuma orientação formal sobre como deverá ser calculada a gratificação natalina, que é o nome oficial do 13.º. Por meio de nota, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia (Seprt-ME) informou que o entendimento do órgão é de que a lei que instituiu o BEm não altera a forma de cálculo das verbas trabalhistas. A pasta contatou a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional para que haja uma orientação uniforme sobre o tema.
Impasse sobre o 13.º ocorre por omissão na regra
Especialistas consultados pela Gazeta do Povo afirmam que o cálculo do 13.º salário em 2020 está numa encruzilhada de interpretações. Mas recomendam que as empresas façam o pagamento integral da gratificação, sem considerar a suspensão do contrato de trabalho e reduções salariais ao longo do ano.
Para o advogado trabalhista Fábio Ferraz dos Passos, sócio da Ferraz dos Passos Advocacia, esse impasse decorre de uma omissão legislativa sobre o cálculo de férias e do 13.º. Ele explica que a confusão que gira em torno da gratificação natalina pode ocorrer caso o empregador considere literalmente a indicação de cálculo que consta da legislação trabalhista.
A regra diz que o 13.º será calculado pela divisão da remuneração integral por 12 meses e a multiplicação pela quantidade de meses efetivamente trabalhados. Se um empregado trabalhou menos de 15 dias em um mês, por exemplo, esse período não entra no cálculo, o que pode implicar redução do valor a ser recebido no final do ano.
“Desse modo, os trabalhadores que tiveram redução de jornada ou suspensão do contrato, em tese, suportariam uma variação negativa no valor final do benefício. Porém, importante destacar que a CLT proíbe a redução salarial e que, no caso dos trabalhadores que aderiram às condições da MP, eles não tiveram redução salarial, mas sim uma adequação temporária e condicional do contrato”, argumenta.
“Considerando a omissão da norma quanto ao cômputo do 13º e férias, deve prevalecer a aplicação da legislação vigente, que veda a redução salarial. É importante que o empregador esteja atento na hora de fazer o cálculo desse benefício e que considere que não houve redução da remuneração”, recomenda.
Para Camilo Onoda Caldas, sócio do escritório Gomes, Almeida & Caldas, os argumentos que sustentam o pagamento parcial do 13.º tornam esse valor controverso, e isso é relevante no Direito do Trabalho: na hipótese de uma empresa não pagar o valor integral e o empregado reclamar a diferença posteriormente, a empresa não poderia ser multada pelo artigo 476 da CLT, que determina a punição apenas para verbas consideradas incontroversas.
Mas ele considera que a posição mais segura e juridicamente sustentável é o pagamento integral e cita dois argumentos principais. O primeiro é a consideração do contexto atual das empresas.
“O não pagamento do salário integral foi autorizado porque as empresas em grande medida permaneceram fechadas pelos períodos mais extremos da pandemia, sem fluxo de caixa para realizar esse pagamento, e agora essa já não é mais a realidade das empresas. Então no momento em que elas têm que desembolsar o 13º, já não estão mais na situação extrema na qual se encontravam anteriormente”, defende.
A outra razão é que não existe uma previsão expressa que autorize o pagamento proporcional do 13.º salário. “A tendência do Direito do Trabalho é garantir uma maior proteção ao trabalhador, de tal modo que existe um risco considerável às empresas que não fizerem o pagamento integral”, pontua.
O calendário de pagamentos do 13.º salário
O 13.º salário é um benefício que está previsto na Constituição Federal como gratificação natalina, e não foi alterado pela reforma trabalhista. O calendário de pagamento não é exatamente igual para os empregados da iniciativa privada, servidores públicos, aposentados e pensionistas.
As regras são mais bem definidas para quem trabalha na iniciativa privada. De acordo com a Lei 4.749/1965, o pagamento da primeira parcela do 13.º deve ser realizado pelo empregador até o dia 30 de novembro. A segunda parcela precisa ser depositada até 20 de dezembro. Essa mesma lei estabelece que o trabalhador pode pedir adiantamento da primeira parcela do benefício quando tirar férias.
No caso dos servidores públicos e aposentados ou pensionistas, tudo pode variar de acordo com quanto dinheiro está disponível no caixa do governo, que é obrigado a depositar a gratificação para os seus funcionários.
Para aposentados e pensionistas do INSS, desde 2006 o governo procura antecipar o pagamento da primeira parcela do 13.º salário. Neste ano, o governo já havia decidido fazer esse pagamento antes do prazo, ainda em março, como uma medida de mitigação dos efeitos do coronavírus.
No funcionalismo público, a situação é um pouco diferente. Os pagamentos são feitos de acordo com o que está no estatuto de cada categoria ou de acordo com o fôlego dos governos estaduais ou municipais.
Já os servidores federais – ativos, aposentados e pensionistas – costumam receber o adiantamento da gratificação natalina no contracheque de junho. Isso está determinado no Decreto-lei 2.310/1986, que prevê o pagamento da primeira parcela entre fevereiro e novembro.
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