Dinheiro para reforçar o estoque, comprar equipamentos e/ou financiar capacitação. São empréstimos desse tipo que mais de 603 mil brasileiros, entre microempresários e empreendedores individuais (formais e informais), acessaram de 2011 até agora. Foi em agosto daquele ano que o governo federal lançou o programa Crescer, que alterou o microcrédito disponível no mercado bancário até então.
"Além de juros mais baixos [que passaram de até 60% ao ano para 8% ao ano], o Crescer mudou a forma de conceder esse empréstimo. Até então, o microcrédito estava basicamente disponível nos caixas automáticos, mas acabavam sendo usados para problemas pessoais, como o pagamento de uma dívida, que para aumentar a geração de renda do cliente", observa o gerente de Mercado de Desenvolvimento Sustentável do Banco do Brasil no Paraná, Marcio Alexandre Rockenbach.
Objetivos
As metas para 2013 do BB e da Caixa Econômica Federal são os bancos públicos que têm levado o programa para frente, apesar de os privados também poderem usá-lo são ousadas. O primeiro pretende fechar o ano com uma carteira de 1 milhão de clientes no microcrédito em todo o país -- só no Paraná o número de beneficiados deve saltar dos 32.374 atuais para cerca de 65 mil. Já a Caixa vislumbra 730 mil (hoje são 153.670). Isso significa, ao menos, dobrar o montante que a instituição emprestou até agora, de R$ 504,8 milhões.
As metas pensadas em número de pessoas e não em volume de dinheiro faz parte do objetivo do programa, que é o desenvolvimento dos pequenos negócios e do reforço da geração de renda das famílias. "Neste conceito, é preferível cinco clientes emprestando R$ 300 [valor mínimo do microcrédito do Crescer] que um emprestando R$ 15 mil [valor máximo]", frisa Rockenbach.
A forma de concessão desses empréstimos também mudou. Eles não estão disponíveis no caixa automático, mas dependem de uma visita de um agente de crédito funcionário do banco ou, como no caso da Caixa, um jovem aprendiz de 18 e 22 anos de idade , que vai avaliar o potencial tomador, sua capacidade de pagamento e suas necessidades. "A atuação é bem próxima da comunidade, por isso essa opção de trabalhar também com jovens aprendizes, que acabam buscando nos lugares onde vivem seus primeiros clientes. Isso é importante para conhecer as necessidades do tomador de perto", diz a gerente de programas sociais da Caixa em Curitiba, Lígia Maki Ivama.
O dono de lanchonete Adriano Antônio Zanata encontrou no microcrédito um dinheiro mais barato. Ele já fez duas operações, em um total de R$ 7 mil, para capital de giro e fazer reforma do estabelecimento. "Devo terminar de pagar até o fim deste ano. Ano que vem, quero mais". Segundo ele, são essas pequenas intervenções, como uma cobertura, piso e cadeiras novas, que têm ajudado a garantir um crescimento ascendente nas vendas da lanchonete. "Em dez anos nunca tive queda de um ano para outro."
Paraná ganha seu primeiro banco comunitário, no papel
Neste mês, o estado ganhou seu primeiro banco comunitário ao menos no papel. Bem diferente das instituições financeiras convencionais, o NeuroBanco, registrado na Secretaria Nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego no último dia 18, foi criado a partir da iniciativa de Lutero Couto, diretor presidente da associação sem fins lucrativos Parque de Tecnologia Social (PTS).
Com uma moeda própria chamada Neuro, cotada em R$ 3, a instituição promete se instalar fisicamente no bairro Boqueirão e focar suas ações no fomento do comércio local em um raio de até oito quilômetros e também das entidades de economia solidária da capital como um todo. "É claro que quando falamos de uma base de entidades coletivas, cooperativas, associações e mesmo das pessoas que hoje estão na lista de programas de transferência de renda acabamos não nos limitando fisicamente a apenas uma região da cidade. É com essa base que o NeuroBanco vai trabalhar", explica Couto.
O endereço da primeira agência do NeuroBanco no Boqueirão ainda não foi decidido, mas o local vai começar como um correspondente bancário da Caixa, trabalhando com o microcrédito convencional, até criar um vínculo com a comunidade.
A ideia é que daqui a algum tempo o NeuroBanco esteja operando o Neuro principalmente na relação entre empreendedores e fornecedores locais. "Ao colocar um produto, como uma blusa, à venda em uma loja associativista local, o produtor vai receber um dinheiro que representará o valor de venda desse produto. A partir daí ele poderá trocar o valor por um crédito em Neuro [1 Neuro valerá R$ 3, portanto R$ 300 serão iguais a 100 neuros] e já trocar esse crédito imediatamente no comércio de armarinhos local por insumo (lã, tecidos etc) e continuar a produzir", exemplifica Couto.
Conceito
Os bancos comunitários existem há mais de 30 anos no mundo e nasceram no Brasil com o Banco Palmas, em um bairro de Fortaleza, Ceará, em 1998. São instituições financeiras criadas e geridas pela própria comunidade, com registro no MTE, com o objetivo de fomentar a geração de emprego e renda localmente. Ali, os negócios são feitos por meio de uma moeda própria, que só circula na comunidade, evitando que os moradores consumam em outros lugares. Ao todo, o país conta hoje com 103 bancos comunitários.