Até junho, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) espera encaminhar ao conselho diretor da agência a minuta do edital de licitação das frequências de 5G, a chamada quinta geração de internet móvel. Após a aprovação do conselho, o edital será colocado em consulta pública e, depois de eventualmente incorporar as contribuições do mercado, será reencaminhado para aprovação final do conselho, para finalmente ser enviado ao Tribunal de Contas da União (TCU). Ou seja, o edital não sai em 2019, mas terá neste ano um período decisivo para a discussão de parâmetros de implementação do 5G no Brasil.
Devem ser ofertadas as frequências de GHz e 2.3GHz, além de sobras de 700 MHz. A frequência de 3,5 GHz é a mais harmonizada em nível mundial, isso significa que mais países também vão utilizá-la para a quinta geração de telefonia celular, o que é bom para se ter escala e equipamentos de rede e terminais mais baratos. Ocorre que essa frequência também é adotada no Brasil pelos usuários de TV aberta por meio de antenas parabólicas atendidas por satélite. Com isso, o Brasil dispõe de apenas 200 MHz de faixa para a 5G.
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Além do trabalho para impedir a interferência entre os dois serviços – telefônica celular e TV por satélite –, outro dilema da Anatel é o modelo de divisão do espectro para celular. A agência analisa as alternativas de dividir esses 200 MHz em quatro lotes de 50 MHz, de modo a contemplar as quatro principais operadoras móveis que operam no país; ou oferecer apenas dois lotes de 100 MHz para garantir maior qualidade para pelo menos duas operadoras nacionais. Há ainda a possibilidade de se oferecer pequenos lotes regionais para diversas operadoras.
Já a frequência de 2.300 MHz está desocupada e terá fundamental importância como capacidade adicional para a demanda de 4G nos próximos anos e no desenvolvimento e massificação futura de 5G e Internet das Coisas (IoT). Para a GSMA, entidade que reúne as operadoras móveis, a relevância dessa faixa está no suporte a serviços de banda larga móvel (como o 4G hoje), e pode ser um importante complemento à faixa 3,5 GHz na futura oferta de serviços de 5G. Este espectro está destinado ainda para os serviços de banda larga fixa e de telefonia fixa.
Carlos Baigorri, superintendente de controle de obrigações da Anatel, explica que deverá constar na minuta o modelo de divisão de espectro e se o leilão será decidido por valor da outorga (leilão arrecadatório) ou por técnica (obrigação de cobertura) e preço. “Essas regras precisam ser discutidas e avaliadas pelo conselho diretor”, resume Baigorri.
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Edital do leilão 5G só deve sair em 2020
Com isso, dificilmente o leilão ocorrerá este ano, devendo ser realizado no primeiro semestre de 2020. Esse cronograma atende aos anseios das operadoras móveis. A maior parte delas não quer o leilão em 2019 e não tem pressa para implementação do 5G porque ainda está realizando investimentos em 4G e em 4,5G, redes que ainda não tiveram seus investimentos amortizados.
“A expectativa da Anatel é de que a aprovação dos editais ocorra apenas no final do ano. Provavelmente, o leilão de fato só deve ocorrer em 2020. Mas, ao longo deste ano, vamos fazer todos os preparativos, a consulta pública, a discussão com o TCU. Na consulta pública, são discutidos com o mercado e a sociedade os modelos de lotes, como serão as rodadas dos leilões, se haverá obrigação de cobertura. Tudo isso afeta o preço mínimo do edital e é o que o TCU analisa”, justifica Baigorri.
Ele entende a falta de interesse das operadoras a despeito do frisson que o 5G vem provocando em países como os EUA, onde a Verizon e a AT&T já iniciaram o lançamento de serviços, e a China, cujo governo quer liderar a corrida do 5G. Sem falar em outros países que já realizaram leilões de frequência. Como agência reguladora, a Anatel não responde pela política nacional para o 5G, papel que cabe ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC).
“A Anatel entende que 2020 é o momento adequado. Ser pioneiro em 5G traz alguns riscos por causa da falta de escala dos equipamentos. Seguimos a política pública do ministério. A política de telecomunicações publicada no final do ano passado não menciona o 5G. A expectativa é de que o tema seja tratado no Plano Nacional de Internet das Coisas, que ainda deve ser publicado”, estima Baigorri.
Assim, a expectativa é de que as primeiras redes comerciais 5G sejam realidade somente no Brasil apenas no final do próximo ano ou no início de 2021. Ao contrário de Vivo, Oi e Claro, a TIM tem pressa e deve lançar testes ainda este ano. As mais reticentes são a Claro e a Vivo.
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“A gente acredita que o timing ideal para a entrada em operação comercial do 5G é final de 2020, início de 2021”, projeta André Sarcinelli, diretor de engenharia da Claro. O Grupo Claro é particularmente interessado porque conta com uma operadora de serviços de satélite, a StarOne.
Sarcinelli ressalta que é preciso que se resolva a questão da não interferência do serviço móvel nas transmissões de TV aberta por satélite, que ocupa a banda adjacente à faixa de 3.5GHz destinada ao 5G.
“Dependendo do grau de interferência nessa convivência, isso pode diminuir o espectro a ser leiloado para 5G (atualmente estão previstos 200 MHz). Os testes iniciados em janeiro podem recomendar que seja destinada uma banda de guarda para assegurar a não interferência entre os dois serviços – celular e TV aberta. Uma das vantagens da tecnologia 5G é sua capacidade espectral. Velocidades elevadas demandam espectro”, explica Sarcinelli.
Os testes estão sendo conduzidos numa instalação da Claro no Rio de Janeiro e devem ser concluídos até março. A solução poderá ser mais complexa do que a adotada na transição da TV Digital, quando foi feita a limpeza da faixa de 700 MHz ocupada pelo serviço de TV analógica.
“No caso da faixa de 700 MHz, o próprio cliente obtinha ou comprava um equipamento para assistir a programação em TV digital. Já em relação à faixa de 3.5 GHz é possível que seja necessário colocar filtros na antena do cliente. O teste vai definir se poderemos ter um filtro barato ou ter de colocar um filtro caro para garantir a não interferência. Isso é um trabalho de anos. E ainda está sendo discutido quem vai arcar com o custo desses equipamentos”, esclarece Sarcinelli.
A Claro tem focado os investimentos em projetos de modernização de rede, com novos equipamentos já preparados para o 5G. A rede já foi descentralizada e está sendo virtualizada (processo que consistem em transformar as funções de rede em software dispensando a exigência de equipamentos específicos) por meio de 12 datacenters, sendo oito regionais e quatro nacionais. “O objetivo é levar o ponto de decisão para mais perto do assinante”, justifica Sarcinelli.
Átila Branco, diretor de planejamento de redes da Telefonica Vivo, informa que a operadora também está avançando na virtualização da rede. Ele destaca que o 5G vai exigir uma quantidade de torres e antenas muito maior do que a que temos hoje.
“Temos que simplificar a legislação de instalação e licenciamento de rede de telecomunicações, sob o risco de não conseguirmos ter redes com capilaridade necessária para suportar os padrões de 5G. A Vivo vem realizando provas de conceito das principais tecnologias que farão parte do 5G. A Telefónica está se antecipando a isso, investindo muito em análise de dados e em ferramentas de inteligência artificial”, diz Branco.
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Ele observa que o 5G traz grandes oportunidades para o mercado de transportes inteligentes, com carros, vias e sinalizações conectadas, compartilhando informações em tempo real. O controle remoto de equipamentos, combinados com a realidade aumentada e realidade virtual, poderão alavancar grandes oportunidades para atividades de alta periculosidade.
“A Vivo possui um laboratório específico para testes e avaliações que segue os padrões abertos de evolução tecnológica, de modo a fomentar o desenvolvimento do ecossistema IoT em diversas áreas e frentes de desenvolvimento”, completa Branco.
Mauro Fukuda, diretor de estratégia, arquitetura e tecnologia de rede da Oi, destaca que há ainda no Brasil questões que precisam ser endereçadas no âmbito de políticas públicas e tecnológicas. Um leilão prematuro poderá acelerar a corrida para atualização tecnológica, sem ter estes pontos resolvidos. Além da identificação de espectro de frequência para o 5G, ele diz que é preciso rever o arcabouço regulatório para o 5G e concluir a definição dos padrões da tecnologia pelos organismos de padronização mundial.
“Os intervalos entre leilões de frequências móveis no Brasil foram muito menores comparativamente ao restante do mundo. O modelo ideal de leilão deverá considerar uma combinação entre valor da outorga e obrigações de cobertura. Seria bom também se houvesse a possibilidade de compartilhamento de infraestrutura de redes e de espectro. Para a Oi, cada um destes modelos traz suas vantagens e desafios”, diz Fukuda.
Dentre as iniciativas desenvolvidas pela companhia para a modernização da rede estão parcerias fechadas em setembro deste ano com a Huawei e a Nokia, para atuarem na reestruturação operacional, prevista no plano de recuperação judicial e focada na expansão da rede de fibra ótica e no aumento da cobertura de dados móvel.
“Vale destacar que o 5G promoverá uma transformação significativa nas redes, serviços e modelos de negócio das operadoras. Não há como implementar uma rede 5G sem uma ampla infraestrutura de redes de fibra óptica que proporcionem alta capacidade”, explica Fukuda. A Oi vem promovendo uma readequação de seu backbone nacional (espinha dorsal da rede celular) e de suas redes metropolitanas (backhaul) para suportar os requisitos de baixo tempo de resposta e alta capacidade exigidos pelo 5G.
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