Se o mercado mundial já oscilava frente à possibilidade de Donald Trump ser eleito, agora, com a vitória inesperada do magnata, a economia entrou em caos. As bolsas caíram na Ásia e na Europa e o preço do barril do petróleo sofreu recuo. Para economistas, a retração nos números pode ser o prenuncio de retrocessos ainda maiores tanto do ponto de vista socioambiental quanto do ponto de vista econômico.
Um levantamento da agência de classificação de risco Moody’s estimou que as propostas do republicano poderiam desencadear uma longa recessão no país.Para o ex-secretário do Tesouro do presidente Bill Clinton e ex-diretor do Conselho Econômico Nacional no governo Barack Obama, Larry Summers, se Trump fizer metade do prometido, desencadeará a pior guerra comercial desde a crise de 1929.
Em âmbito global, os transtornos seriam ainda maiores, segundo estudiosos. De acordo com o professor de economia da PUC-PR Wilhelm Meiners , com propostas protecionistas pautadas em um nacionalismo extremo, os Estados Unidos de Trump fecharão sua economia para o mundo, afetando inúmeros parceiros internacionais.
O país também poderá sofrer consequências a longo prazo, segundo Wilhelm. O economista explica que a nação tem o maior mercado importador e o segundo maior exportador do planeta e, embora consiga crescer isolada por um ou dois anos, dificilmente se manterá bem mediante políticas com tantos bloqueios.
Confira algumas das propostas de Trump e seus efeitos para a economia.
Deportar imigrantes ilegais
Combater a imigração ilegal nos Estados Unidos está entre as principais pautas de Donald Trump. O pacote de medidas apresentadas pelo candidato em vários discursos e entrevistas compreende a deportação de 11 milhões de imigrantes que vivem e trabalham ilegalmente no país e a construção de um grande muro na fronteira sul – que deverá ser pago pelo México.
No lançamento de sua campanha, no ano passado, o bilionário manteve um tom inflamado ao falar da medida . “Quando o México manda suas pessoas, não está mandando as melhores, mas cidadãos com problemas. Eles estão trazendo drogas, crime, são estupradores. Alguns, eu penso, são boas pessoas”.
Além disso, Trump quer oferecer incentivos fiscais a quem contratar nativos.
Para Meiners, embora possa haver um rearranjo no mercado estadunidense, com postos de trabalho ocupados por americanos, essa visão deverá gerar um clima de medo no país e uma forte perseguição a imigrantes, além de influenciar a maneira como a Europa olha para quem chega de fora. Esse contexto tende a fragilizar as relações entre os países, culminando em uma reversão no processo de globalização.
Proibir a entrada de muçulmanos “suspeitos”
Trump pretende aumentar as restrições à entrada de muçulmanos nos Estados Unidos. Em um de seus comícios, em agosto de 2006, chegou a defender a implantação de um teste de verificação ideológica sob os moldes dos instaurados à época da Guerra Fria. Além disso, já se mostrou a favor de uma proibição total da entrada de muçulmanos - pelo menos até que se comprovasse que eles não fossem terroristas.
Para Wilhelm, ações de bloqueio como estas só acentuam o ódio e prejudicam os vínculos comerciais entre as nações. Na perspectiva do economista, a fragilidade das relações dos Estados Unidos com o Irã, que estão sendo retomadas ultimamente, deverá se acentuar ainda mais. Isso poderá resultar em um aumento no preço do petróleo.
Revogar o acordo com México e Canadá
Criado em 1992, o Tratado Americano do Norte (NAFTA) nasceu para facilitar transações comerciais entre Estados Unidos, México e Canadá. Na visão do magnata, o acordo “destrói” empregos americanos, já que possibilita a criação de postos de trabalho do setor da indústria estadunidense no território de seus parceiros.
Segundo Meiners, revogar o bloco não depende exclusivamente do presidente. A maioria das medidas com relação a isso precisa passar pela esfera legislativa. Mas, segundo o economista, apesar de o tratado já estar bem consolidado, o bilionário poderá criar travas específicas para fortalecer as empresas nos Estados Unidos e colocar o país sob um patamar mais estratégico que seus parceiros.
Com o afastamento dos Estados Unidos, as plantas do México deverão buscar novos mercados. Esse fenômeno poderá beneficiar parceiros, como o Brasil. “Já existem acordos entre os dois países, sobretudo, no setor automotivo. Esse movimento deverá se acentuar”, diz.
Revogar o acordo com o Japão e outros dez países
No ano passado, depois de sete anos de negociações, o Tratado Transpacífico (TTP) foi assinado entre os Estados Unidos e 11 países (Cingapura, Brunei, Nova Zelândia, Chile, Estados Unidos, Austrália, Peru, Vietnã, Malásia, México, Canadá e Japão). A ideia era estabelecer o livre comércio entre os integrantes. Mediante a mesma argumentação hipernacionalista, Trump defende que o bloco é um “negócio terrível” para seu país e pretende revogá-las. De acordo com Meiners, por ser um tratado recém-assinado, pode ir por água abaixo e fragilizar ainda mais as relações econômicas internacionais.
Investir em termelétricas de carvão
Outra proposta de Donald Trump é investir pesado em termelétricas de carvão. Segundo Wilhelm, isso pode impactar o mundo não apenas do ponto de vista energético, como também no que tange a questões ambientais tão discutidas para uma economia mais sustentável. Tratados como o Protocolo de Quioto, estabelecido em 2007 para a redução de gases poluentes na atmosfera, poderão ser afetados. “Trump não acredita em aquecimento global. É possível que todos os acordos climáticos que o Obama acabou de assinar sofram com isso”, explica.
Criar 25 milhões de empregos em uma década e promover um crescimento anual entre 3,5 e 4%
É com toda esta política fechada que Donald Trump pretende promover um crescimento anual de 3,5 e 4% do PIB. Ele também prevê que, a partir de suas medidas, o país consiga gerar 25 milhões de empregos em uma década. Na visão de Meiners, isso é possível até certo ponto. Embora estes números possam ser atingidos a curto prazo, a longo prazo será impossível que o maior mercado importador e o segundo maior exportador do mundo se mantenha bem estando tão isolado. “Os bons índices deverão sobreviver por no máximo 3 ou quatro anos”, supõe o especialista.