O cineasta Fernando Meirelles não faz joguinho de cena. Ao menos, é essa a impressão que fica quando se conversa com ele. Às vésperas do lançamento de Ensaio Sobre a Cegueira, ocorrido na semana passada, o mais internacional dos cineastas brasucas diz que o seu filme "é do tipo ame ou deixe a sala (de exibição)". Não é o tipo de declaração que se espera de alguém que divulga um novo trabalho.
Mas é assim que Meirelles funciona. E isso fica muito mais claro ao ler o blog mantido por ele entre agosto de 2007 e março deste ano. No site, ele contava de forma franca as agruras para adaptar o livro mais vendido do português José Saramago, considerado "infilmável" por muitos.
O escritor, prêmio Nobel de literatura, inclusive já conferiu o longa, que abriu a última edição do Festival de Cannes, em maio. Ao término da sessão, emocionado, Saramago foi flagrado pelo filho de Meirelles, que estava na sessão com uma câmera MiniDV. Está tudo no YouTube (confira em tinyurl.com/ensaio).
À primeira vista, a impressão que se tem é a de que Meirelles está sempre conectado. Ele não desgruda do seu MacBook branco para checar e-mails e assistir a DVDs. Além disso, planeja a compra de um item extravagante: um toca-MP3 que funciona debaixo dágua.
Por outro lado, o cineasta, indicado ao Oscar por Cidade de Deus, não quer nem saber de celular. "Não sou o Iraque e nem fazenda no Pontal do Paranapanema para ficar sendo invadido assim a toda hora", sorri, ao confessar a sua ojeriza ao telefone móvel.
Tal qual já ocorreu com a venda de música, o cinema também está perdendo público. Apenas no primeiro semestre de 2008, no Brasil, o público recuou 11%, segundo a consultoria Filme B. Meirelles está ligado nesse movimento. Para ele, as novas mídias e tecnologias, além da pirataria, têm tirado o sono dos grandes grupos envolvidos nesse negócio.
Mesmo assim, ele, que é sócio da produtora O2 (o2filmes com), garante não se angustiar com a nova realidade. "Tento ficar focado apenas nas histórias. Fecho os olhos e sigo em frente. (É) Cegueira voluntária", filosofa. O diretor segue independente, apesar de ter nomes estelares, como Julianne Moore e Rachel Weisz, no elenco de Cegueira e O Jardineiro Fiel, seu filme anterior.
É bem verdade que hoje os estúdios não dependem apenas da venda de ingressos. Os blockbusters, como Batman e Indiana Jones, dão origem a uma série de licenciamentos para produtos que podem ir de uma simples caneca até complexos games.
As ações de marketing também evoluíram. No último Batman, a Nokia apresentou seu primeiro celular touchscreen. Perdeu? No YouTube (sempre ele!), dá para ver o aparelhinho. Tudo isso, claro, representa muitas moedinhas nos cofres dos estúdios.
Para Meirelles, porém, apesar dos milhões que envolvem a indústria cinematográfica, o cinema não é apenas um negócio; é arte. "Os maiores gênios da pintura ou da música fizeram suas obras por encomenda e isso não tira em nada o valor artístico de seus trabalhos", argumenta.
Enquanto isso, os exibidores, os mais interessados em fazer com que as pessoas voltem a freqüentar os cinemas, contra-atacam com as salas 3D, que propiciam uma experiência mais "sensorial" por parte dos espectadores.
Meirelles, porém, não se anima com a novidade. "Nunca pensei em fazer filmes nesse formato, mas acho muito interessante a idéia de colocar o espectador cada vez mais dentro da história", afirma. "Mas um bom roteiro e uma boa atuação também fazem isso muito bem", conclui.
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