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A China está crescendo menos. E isso vai ter impactos no Brasil

Movimento de contêineres em porto chinês | Anthony Kwan/
Bloomberg
Movimento de contêineres em porto chinês (Foto: Anthony Kwan/ Bloomberg)

O ritmo de crescimento da economia chinesa, a segunda maior do mundo, está perdendo força. Em 2013, a segunda maior economia mundial viu o PIB expandir 7,8%. Para este ano, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), as expectativas são de uma expansão de 6,2%. “A China está fazendo um pouso suave”, diz Álvaro Bandeira, economista-chefe da Modalmais. 

 Os impactos desse arrefecimento no crescimento vão ser sentidos pelo Brasil, aponta Lia Valls, pesquisadora sênior do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). O peso pode vir de duas formas: os preços das commodities não devem se valorizar com tanta força como aconteceu em anos anteriores e o ritmo de expansão dos investimentos chineses no Brasil pode crescer com menos vigor. 

E não há forma como o Brasil possa compensar essa contenção nos preços das matérias-primas. “Nossas vendas para lá não são muito diversificadas”, diz Lia. A pauta de exportações para a China, o principal cliente dos produtos brasileiros, é extremamente concentrada. Cinco produtos - Soja, petróleo, minério de ferro, celulose e carne bovina - são responsáveis por 90% dos negócios com os orientais, segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex). 

 Outro impacto da redução no crescimento chinês pode vir nos investimentos que empresas daquele país fazem no Brasil. Muitas estão dando prioridade ao mercado chinês, dado o foco do governo daquele país nos segmentos de infraestrutura e imobiliário. 

 “Pode ser que o ritmo de crescimento seja um pouco menor, mas o Brasil continua sendo um parceiro bem atraente para a China”, destaca Michela Chin, da PwC. Somente em 2017, último dado disponível, o investimento direto da China no Brasil foi de US$ 11,7 bilhões, segundo levantamento feito pelo Banco Central. 

 Os motivos da retração no crescimento

 A retração no crescimento chinês está sendo causado pela reorientação da política econômica. Sílvio Campos Neto, economista da Tendências Consultoria aponta que a China está em um momento de transição. A intenção é aumentar a participação do consumo privado no PIB, que, segundo a The Economist, é de 39%. Só para comparar, o peso do consumo no Brasil é de 64%. 

Segundo o economista:

  O modelo de crescimento baseado em investimentos se esgotou e para isso a China está priorizando o consumo.

 E diante desse quadro, os CEOs chineses vêm repensando suas ambições de crescimento. A segunda maior economia mundial vem adotando uma série de estratégias para estimular o consumo. Uma delas passa por uma política monetária menos restritiva, com redução dos compulsórios bancários e estímulos para o crédito. Outra arma é expansão dos gastos em infraestrutura e no setor imobiliário. 

 O país também passou recentemente por uma reforma tributária. E um dos aspectos fundamentais dela, segundo Michela, foi a redução da Imposto de Renda corporativo para 25%. 

Soja: expansão menor nos negócios 

Para os produtores de soja, o principal produto exportado pelo Brasil para China, o arrefecimento no crescimento do PIB chinês significa possibilidade menor de expansão nos negócios. “Há um incremento menor na demanda do produto”, diz Márcio Bonesi, presidente da Associação dos Produtores de Soja do Paraná (Aprosoja-PR). 

 No ano passado foram negociados US$ 27,34 bilhões, 34,6% a mais do que em 2017, de acordo com dados da Secex. A oleaginosa respondeu por 42,6% dos negócios brasileiros com a segunda maior economia mundial. 

Os preços também podem ser impactados. Com a guerra comercial entre Estados Unidos e China, os asiáticos redirecionaram as compras para o Brasil. “Boa parte da safra americana acabou sendo estocada”, afirma o dirigente rural. O estoque americano corresponde a 9,5% da produção local, aponta o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês). 

Segundo ele, os chineses estão em uma situação extremamente confortável no atual momento. Por um lado, tem à disposição a safra americana. Por outro, a safra brasileira que começa a ser colhida. “Eles estão com a faca e o queijo na mão”, ressalta o presidente da Aprosoja-PR. 

Lucilio Alves, professor da Esalq/USP e pesquisador do Centro de Pesquisa em Economia Aplicada (Cepea), afirma que os preços continuam atrativos, mas as cotações estão menores do que há um ano, quando a tonelada chegou a US$ 400. Os valores FOB para exportação pelo porto de Paranaguá indicam para cotações entre US$ 355 por tonelada entregue em fevereiro a US$ 370, para entrega em julho. 

Um porém em relação à oleaginosa está nas negociações entre os Estados Unidos e a China para pôr fim à guerra comercial entre os dois países. O prazo vence em 1° de março e o presidente americano, Donald Trump, admite a possibilidade de estender as negociações. 

O estabelecimento de um acordo pode resultar em quantidades menores de soja exportadas. Bandeira, da Modalmais, vê boas possibilidades que isso ocorra, já que a China tem um grande superávit comercial com os Estados Unidos, que nos 12 meses compreendidos entre o quarto trimestre de 2017 e o terceiro de 2018 foi de US$ 363,8 bilhões, segundo o Departamento de Comércio dos EUA. 

 Mas no médio prazo, as expectativas podem ser favoráveis. O país asiático está se urbanizando rapidamente e vai demandar soja, que é usada na alimentação e na ração para os animais. Segundo o Banco Mundial, atualmente 58% dos chineses moram nas cidades. E o governo de Xi Jinping planeja ampliar a taxa de urbanização para 80% até 2040. 

 “O fluxo irá depender dos acordos comerciais entre as partes, mas também da capacidade do Brasil em incrementar sua infraestrutura de transporte doméstica, como as estradas, ferrovias e portuária”, diz Alves. 

 Minério de ferro: expectativa afetada 

O crescimento menor da China também afeta as expectativas em relação a demanda futura de minério de ferro, um dos principais produtos exportados pelo Brasil. No ano passado, foram comercializados US$ 10,93 bilhões, 5,2% a mais do que em 2017, segundo a Secex. 

“Atrapalha caso a desaceleração for maior do que a prevista. Aí teria a necessidade de buscar novos mercados”, diz Glauco Legat, analista-chefe da Necton Investimentos. 

Até a tragédia de Brumadinho, no final de janeiro, e que matou pelo menos 134 pessoas, a leitura do mercado era de que este ano seria de equilíbrio. A Vale não iria aproveitar toda a capacidade instalada. Segundo ele, agora, o cenário de curto prazo para o minério de ferro é melhor. 

Só que por uma semana não vai haver um referencial de como a China vai reagir, por causa do longo feriado do Ano Novo Lunar. “Vai ser preciso esperar esse período passar.” 

 Carne: busca por mais volume 

Uma estratégia que o segmento de carnes está adotando em relação à China é ganhar espaço com mais volume. “Estamos prospectando mais clientes na China, um mercado que tradicionalmente paga bem”, diz Péricles Salazar, presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo). 

No ano passado missões foram realizadas, facilitando uma maior abertura e a habilitação de frigoríficos brasileiros para o embarque da carne. O peso da China e Hong Kong entre os maiores compradores do produto vem crescendo. Em 2017, respondiam por 37,6% do total exportado. Em 2018, 43,7%. 

 Segundo a Secex, no ano passado foram exportados US$ 1,49 bilhão, 60% a mais do que em 2017. As exportações foram mais rentáveis: o preço médio do quilo de carne exportada atingiu US$ 4,61,5% a mais do que no ano anterior. 

 Thiago Bernardino de Carvalho, pesquisador da área de pecuária do Cepea, avalia que a tendência de alta nas exportações deve permanecer, devido à necessidade de carne no país asiático e à maior abertura comercial junto a frigoríficos brasileiros. 

 “A economia chinesa cresce menos do que nos anos anteriores, mas é um crescimento sustentável e sem oscilação. A população chinesa segue aumentando e o país tem uma taxa de crescimento do PIB ao redor de 6% tende a manter o consumo de carnes, entre eles, carne bovina. O Brasil deve continuar com grande importância no mercado chinês, devido a uma carne altamente competitiva. O Brasil possui oferta e o tipo de carne que o chinês demanda. Portanto, o mercado deve ser manter favorável ao país.”

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