Um dos maiores estudiosos de pobreza e desigualdade, o economista Ricardo Paes de Barros, ou PB, como é conhecido, volta à sala de aula, no Insper, para tratar dos problemas sociais que encarou nos últimos quase cinco anos na Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência.
Chegou ao fim o ciclo de ganhos baseado na renda?
Não há nada real na economia brasileira que diga que batemos em algum teto. Temos uma economia desarrumada, que precisa ser arrumada rapidamente. E podemos aproveitar esse momento para mudanças estruturais que vão permitir que entremos numa trajetória de crescimento acelerado.
Seria uma pausa?
É um acúmulo de pouco cuidado com os fundamentos da economia. Devemos aproveitar e melhorar o ambiente de negócios, a política tecnológica. Evidentemente que, no curto prazo, parte da sociedade vai sofrer bastante.
Os mais pobres vão sofrer mais?
Vai depender de como o governo vai ajustar o gasto público, porque a renda dos mais pobres está muito atrelada à maneira como o governo gasta. Uma das coisas que mais afetaram a (redução da) pobreza foi a interiorização do gasto público. O Brasil passou a gastar muito mais nos pequenos municípios, seja por transferência de renda, educação, saúde e infraestrutura.
O senhor vê intenção de poupar os pobres no ajuste fiscal?
É preciso ver como esse ajuste fiscal vai ser feito. Se for feito com preocupação com a população mais pobre, é possível passar sem grandes problemas com a pobreza. É claro que isso desde que a flutuação do crescimento econômico seja de curta duração, se fizer isso em dois anos.
E nas capitais?
Vai haver muito mais problemas. Esse pobre está muito mais vulnerável ao que vai ocorrer na economia e muito menos protegido com o gasto público, fora as transferências de renda, mas elas não são a coisa mais importante para combater a pobreza. À medida que a informalidade e o desemprego aumentem nas grandes cidades, a pobreza vai crescer.
Tem impressão de que o debate econômico ficou restrito à questão fiscal?
A melhor política social hoje no Brasil é o crescimento econômico. O que conseguimos nos últimos dez anos foi conectar a maior parte da população ao carro-chefe da economia brasileira. Antes, se a economia ia bem ou mal, os pobres ficavam isolados. Agora, estão se beneficiando de uma maneira mais direta.
A mudança no seguro-desemprego e no abono traz mais produtividade?
Nesses casos, tinha-se mais uma preocupação de reduzir gasto do que diminuir rotatividade. Isso requer mudanças inteligentes na forma como toda a legislação trabalhista é feita. Pode até haver mudanças que gerem aumento de gastos imediato, como redirecionar o gasto com qualificação profissional para o trabalhador empregado. Atualmente gasta-se muito para qualificar o desempregado. Se for dado a cada trabalhador empregado o direito de fazer um treinamento de 40 horas todo ano, isso muda. O desempregado não vai fazer um curso aleatório, mas um curso do interesse do empresário.
A nova classe média pode viver um retrocesso social?
Sou mais otimista e digo que não sei. Se a nossa flutuação econômica for de curta duração, e se o corte dos gastos públicos for cuidadoso, acho que ela pode ser muito pouco afetada e pode, com a retomada do crescimento, melhorar bastante. Tem alguns grupos que podem ser dramaticamente afetados, setores como a indústria e os serviços.
O baixo crescimento já não começou a bater no social?
Temos que diferenciar entre não estar melhorando e estar piorando. Se o pobre ou a classe média acham que vão melhorar nos próximos anos, isso é delírio. Acho que pobreza não vai cair, mas daí para a renda dos pobres começar a recuar é outra coisa.
Quais os desafios de longo prazo da sociedade brasileira?
Temos um desafio de longo prazo que é aumentar a produtividade. Todo ganho de políticas sociais brasileiras vai depender de um longo prazo sustentável. Para esse crescimento ocorrer, precisamos de avanços tecnológicos, e, na política educacional, de uma revolução. Estamos lentos e mal na educação.