O estágio mais agudo da crise global foi o pânico que varreu os mercados financeiros entre agosto e novembro de 2008. Foi o momento em que os investidores adaptaram suas posições a um mundo à beira da recessão causada pela falência do sistema de crédito. Na prática, eles respondiam à expectativa de que haveria efeitos sérios sobre a economia real. Agora, o mercado tenta prever o tamanho e a duração do estrago.
As expectativas são formuladas com base em processos reais. É normal, por exemplo, que, sem crédito, a demanda em diversos setores industriais caia. A reação das empresas é demitir. Quando o desemprego sobe, a tendência é que as negociações salariais sejam menos bem-sucedidas e que a renda do trabalho recue. Isso leva a uma retração do consumo que, por sua vez, pode causar uma nova rodada de cortes nas empresas. Antecipar um movimento como esse é uma forma de proteção.
"O sentimento sobre o futuro influencia as decisões econômicas. As pessoas tomam crédito e fazem suas compras com base na expectativa de ter um emprego e um salário", explica Éverton Gonçalves, economista da Associação Brasileira de Bancos (ABBC). O mesmo vale para os empresários, que contratam e investem após fazer uma previsão do que será vendido. "Acontece que uma expectativa alimenta a outra. Em momentos de grande insegurança, o pessimismo pode até virar uma profecia que se autorrealiza."
Isso não quer dizer que a desaceleração de 2009 será provocada por expectativas, mas que, ao ver o ambiente econômico, as pessoas fazem um jogo de adivinhação que influencia o comportamento real. Uma empresa, por exemplo, pode cancelar encomendas quando não está segura quanto à demanda futura. Na incerteza, o consumidor deixa de gastar e economiza. O resultado pode ser uma retração ainda mais aguda.
Teoria
Os modelos econômicos incorporam expectativas de maneira sistemática desde a década de 70, ao ponto de hoje a principal variável levada em consideração por dezenas de bancos centrais ao redor do mundo ser uma previsão de mercado, a taxa de inflação futura. "Foi um avanço teórico importante, porque os bancos centrais aprenderam que podem influenciar expectativas através da política monetária", destaca o economista Fábio Kanczuk, professor da Universidade de São Paulo (USP). Isso foi possível porque a relação entre as previsões e a inflação real é forte e estável. "A precisão é bem menor com outras variáveis, como câmbio e crescimento do PIB", completa Kanczuk.
Algumas das mais graves distorções econômicas estão relacionadas a expectativas que influenciam as decisões de maneira enviesada. Bolhas e depressões estão nessa categoria e, por isso mesmo, são difíceis de serem evitadas. No caso das bolhas, os investidores ficam eufóricos com os ganhos que determinado mercado propicia e acabam aplicando muito mais do que seria razoável. Foi o que ocorreu no mercado imobiliário americano, no qual não faltou dinheiro para quem quisesse comprar casas, mesmo que sem capacidade de quitá-las.
Agora, o Fed, banco central dos EUA, tenta evitar uma depressão. Ela pode ocorrer se as pessoas se convencerem de que suas compras ficarão mais baratas no futuro. Assim, valeria a pena economizar agora e esperar os preços baixarem. Se todos os consumidores fizerem isso, setores imensos, como construção civil, montadoras de veículos e fabricantes de bens duráveis, teriam de enxugar drasticamente a produção, gerando uma espiral que combina deflação, desemprego e sucateamento da capacidade produtiva. A resposta do Fed é convencer o mercado de que haverá inflação.