Linha de produção da vinícola Famiglia Zanlorenzi: novos produtos e expansão para outros mercados conferem vigor ao crescimento da empresa, que produz o tradicional vinho Campo Largo| Foto: Brunno Covello/Gazeta do Povo

Oásis Paranaense

A produção industrial brasileira cresceu apenas 5,6% entre 2008 e 2013, pouco mais de um quarto do crescimento do PIB no mesmo período, de 19,9%. Nesse contexto, o desempenho da indústria paranaense foi excepcional. Puxada pelo setor automotivo – alvo preferencial dos estímulos do governo – e pela agroindústria, a produção estadual cresceu 28,6% de 2008 a 2013. Dentre os 14 estados pesquisados pelo IBGE, só Goiás cresceu mais nesses anos (33%).

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Desbravando o exterior – A Angelus Produtos Odontológicos, de Londrina (Norte do estado), é um caso raro na indústria. Não só porque continua crescendo – mais de 20% em 2014 –, mas principalmente porque essa alta se deve às exportações, que hoje respondem por 40% das receitas.
Paulo Calixto, diretor financeiro da Angelus: empresa colhe os frutos da internacionalização iniciada há dez anos
No embalo da internet – A Fibracem, de Pinhais (Região Metropolitana de Curitiba), cresceu em média 20% ao ano nos últimos três anos. E, segundo a diretora de marketing e qualidade, Carina Bitencourt, a empresa caminha para fechar o ano com avanço de 30%. Fabricante de cabos de fibra ótica e acessórios, a Fibracem tem como público-alvo os pequenos provedores de internet, que atuam em cidades menores, onde operadoras como Net e GVT não chegam.
Carina Bitencourt, diretora de marketing e qualidade da Fibracem, ao lado de novas máquinas compradas pela empresa
Mercado animal – Especializada em nutrição animal, a Alltech fornece aditivos naturais para os fabricantes de rações. Mas nos últimos anos decidiu estreitar os laços com a ponta final da cadeia – os criadores.
Diversificar é preciso – Até pouco tempo atrás, o desempenho da fabricante de compostos plásticos MVC dependia basicamente dos resultados do setor automotivo. Para reduzir o risco, a empresa – que tem sede em São José dos Pinhais, na Grande Curitiba – decidiu investir em novos produtos e mercados. Nos últimos anos, atacou três setores: agronegócio (peças para máquinas agrícolas), energia eólica (componentes para aerogeradores) e construção civil (sistemas construtivos). A receita anual subiu de R$ 73 milhões para R$ 272 milhões entre 2008 e 2013, e deve saltar para R$ 900 milhões neste ano.
Sem medo de investir – Em quatro dos últimos seis anos a fabricante de cozinhas industriais Rodriaço, de Curitiba, apareceu no ranking das pequenas e médias empresas que mais crescem no país, elaborado pela revista Exame. Em 2013, a alta foi de 30%. O ritmo caiu neste ano, mas a empresa ainda consegue avançar: no primeiro semestre, a receita subiu 7%.
Rodrigo Tavares, dono da Rodriaço: empresa abriu escritório em São Paulo e importou maquinário logo depois do estouro da crise internacional de 2008
Para todos os gostos – Se dependesse apenas do vinho de mesa, a vinícola Famiglia Zanlorenzi, de Campo Largo (Grande Curitiba) talvez nem existisse mais. Quem admite é o próprio diretor-presidente, Giorgeo Zanlorenzi.
Giorgeo Zanlorenzi, diretor-presidente da vinícola Famiglia Zanlorenzi: empresa aumentou o portfólio de produtos e deixou de atuar apenas no mercado regional
Aposta nos genéricos – A Prati-Donaduzzi mantém há sete anos um crescimento médio de 25% ao ano e, segundo seu vice-presidente, Eder Maffissoni, não está sendo diferente em 2014. Um dos pilares da empresa de Toledo (Oeste do estado), dona de um terço do mercado brasileiro de medicamentos genéricos, é o investimento em pesquisa e desenvolvimento, que neste ano chega a R$ 38 milhões, o equivalente a 5% do faturamento, estimado em R$ 800 milhões.
Eder Maffissoni, vice-presidente da Prati-Donaduzzi: fabricante de medicamentos genéricos destina cerca de 5% de seu faturamento à pesquisa e desenvolvimento de produtos
Areia artificial – Dois anos atrás, a Caltec montou em sua fábrica, em Itaperuçu (Região Metropolitana de Curitiba), um laboratório de concreto, para conhecer melhor as necessidades de seus clientes da construção civil. E foi ali que a empresa testou a chamada areia artificial, ou areia industrial, produzida a partir da pedra calcária. Alternativa à areia natural, extraída nas cavas de rios, o produto industrial confere mais pureza e resistência ao concreto.
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Pouco depois do estouro da crise internacional de 2008, em uma época repleta de incertezas na economia brasileira e mundial, o empresário Rodrigo Tavares tomou uma decisão ousada: resolveu que era hora de tirar sua metalúrgica do estágio quase artesanal. Para isso, importou uma máquina italiana que lhe permitiria produzir mais rápido e angariar mais encomendas.

INFOGRÁFICO: Veja como está o mercado da industria paranaense

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SLIDESHOW: Veja fotos das empresas citadas na reportagem

Quem financiou a compra foi o próprio fabricante do equipamento. A taxa de juros e a cotação do euro não eram as mais favoráveis, mas o preço, sim: com a forte queda da demanda global, a indústria estava dando descontos generosos para desovar a produção. Tavares suou para pagar as prestações, mas a aposta funcionou, e há alguns anos sua empresa, a fabricante de cozinhas industriais Rodriaço, passou a figurar nas listas das que mais crescem no país.

Enquanto Tavares confiou no investimento para não sucumbir à crise, o governo federal passou os últimos anos apostando no consumo como forma de dar impulso à indústria e à economia. E deixou de lado políticas e reformas que, embora não fossem capazes de produzir resultados imediatos, abririam espaço para um crescimento mais sustentado. A opção pelo estímulo ao consumo funcionou por algum tempo, mas hoje, nitidamente esgotada, mostra suas consequências negativas.

Sem acomodação

No primeiro semestre deste ano, a produção da indústria brasileira, que andava de lado desde 2011, caiu 2,3%. No Paraná, onde o setor vinha bem mais embalado, a queda chegou a 4,3%. De 12 segmentos monitorados continuamente pelo IBGE no estado, oito produziram menos no primeiro semestre – a retração mais disseminada desde 2009.

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Não são muitas, portanto, as empresas que continuam crescendo em meio a um cenário tão adverso. Quase todas as que conseguem têm em comum o fato de não terem se acomodado durante os anos de bonança. Investiram em pesquisa e equipamentos, desenvolveram novos produtos e buscaram novos mercados mesmo quando não era preciso fazer esforço para continuar faturando alto.

É o caso da MVC, especializada em compostos plásticos, que anos atrás decidiu diversificar sua linha de produtos e buscar clientes em setores como o de energia eólica, quando o mais cômodo era continuar fornecendo produtos apenas para a consolidada indústria automotiva, que por muitos anos cresceu de forma exuberante.

A Caltec, fabricante de cal, continua ganhando dinheiro com a construção civil, outro setor que vem perdendo fôlego. Mas a empresa só se mantém em alta porque, há dois anos, começou a produzir um tipo de areia que vem ganhando espaço entre as construtoras. Se não fosse por esse produto, as receitas já estariam encolhendo.

"As sondagens dos últimos dois anos mostram que o desenvolvimento de novos produtos e a abertura de novos mercados têm sido um foco das empresas. Quem achou um novo caminho está colhendo os resultados", comenta o economista Roberto Zurcher, do departamento econômico da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep).

Rodriaço, MVC, Caltec e as outras cinco empresas retratadas nesta reportagem fizeram uma aposta que se mostrou certeira. Poderia ter falhado; é um risco de qualquer aposta. Mas os exemplos bem-sucedidos sugerem que, em um país que não parece ter qualquer plano para a indústria – nem mesmo o plano de deixar o setor se virar sozinho, sem a miríade de "pacotinhos" e incentivos direcionados dos últimos anos –, depender das escolhas do governo pode ser um risco ainda maior.

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Endividamento esgotou modelo de incentivo ao consumo

As medidas de estímulo ao crédito e à compra de bens, em um cenário de aumento real dos salários e rápida expansão da renda, foram decisivas para sustentar o crescimento econômico – e a indústria – nos primeiros anos do pós-crise. O governo repetiria a fórmula muitas vezes, mas, com os consumidores endividados e o emprego e a renda perdendo fôlego, o efeito sobre a atividade econômica ficou mais fraco a cada dose.

Enquanto o incentivo ao consumo funcionava, o país pouco fez para atacar antigas deficiências que desde sempre impediram um crescimento econômico mais consistente e duradouro, entre elas o complexo e custoso sistema de tributos e encargos sociais; as deficiências na educação, em especial a de nível básico; a tímida abertura comercial; e a falta de poupança pública e privada, que limita os investimentos em obras e equipamentos e, consequentemente, faz perdurarem problemas crônicos de infraestrutura.

O resultado não demorou a aparecer. Depois de avançar 7,5% em 2010, o PIB brasileiro subiu apenas 6,4% na soma dos três anos seguintes. O setor mais afetado – e o primeiro a perder ritmo no pós-crise – foi a indústria, que, de 2011 a 2013, "cresceu" menos de 0,1% na média nacional.

Consequências

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A indústria perdeu espaço no mercado interno e, claro, lá fora. E não só porque o câmbio eventualmente não ajudou e porque os gargalos logísticos persistiram. Em muitos casos, as fábricas concederam reajustes salariais mais altos que o aumento da produtividade e em outros tantos a falta de profissionais qualificados impediu ganhos de eficiência.

Na tentativa de reanimar a indústria, o governo editou medidas de curto prazo, a maioria para segmentos escolhidos, e desonerou a folha de pagamentos de boa parte do setor, com poucos resultados. No fim de 2012, o governo criou um pacote para baixar a tarifa de energia. Além de o efeito já ter passado, as medidas bagunçaram o setor elétrico e despertaram uma insegurança que piorou ainda mais os índices de confiança dos empresários.

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