A aprovação da parceria com a Boeing, selada na última sexta-feira (11), deve dar um novo rumo para a área militar da Embraer. Em um acordo paralelo à criação da nova empresa (ainda sem nome), os americanos se comprometeram a abrir caminho para o esperado cargueiro KC-390, cujo controle fica nas mãos da fabricante brasileira.
Maior aeronave produzida na história da Embraer, o KC-390 entra em um segmento hoje dominado pelo Hércules, desenvolvido pela Lockheed Martin para a Força Aérea norte-americana nos anos 1950. O potencial de mercado do KC pode passar dos US$ 60 bilhões (em valores atuais).
A joint venture militar, firmada para “desenvolver novos mercados para o KC-390”, estabelece que a Embraer fica com 51% de participação e a Boeing, com os 49% restantes. Acordo diferente do firmado pelas empresas na aviação comercial — que prevê o deslocamento desta área da Embraer para a criação de uma nova empresa, vinculada à hierarquia da Boeing.
Mas ainda não está claro se a participação da empresa americana no projeto vai se limitar à área de vendas e pós-vendas (como manutenção), ou se irá incorporar a produção e desenvolvimento tecnológico da aeronave, avalia o professor Marcos José Barbieri Ferreira, da Unicamp. O que é crucial para entender se a fabricante brasileira terá apenas no papel (com 51%) ou de fato o controle de seu principal projeto na área militar.
Ao unir esforços com a Boeing, o principal interesse da Embraer é nas portas que podem ser abertas ao se vincular a um sócio norte-americano. A empresa considera que ter um produto com boa performance e tecnologia pode não ser o suficiente para concretizar vendas no segmento militar.
É um mercado muito dominado por influências geopolíticas, e as dos Estados Unidos são bem maiores do que as brasileiras. E expectativa da Embraer é de se beneficiar da força de vendas global, além de acessar incentivos disponíveis nos EUA.
Ao passo que, para a Boeing, a aeronave é um importante complemento para seu portfólio militar. A empresa enfrenta uma disputa ferrenha com a Lockheed Martin pelos contratos das forças aéreas Americana e de países aliados ao redor do mundo.
O acordo para a comercialização do KC-390 está no pacote de medidas aprovado pelo Conselho de Administração da Embraer, na última sexta-feira (11), depois que governo federal anunciou que não iria utilizar sua golden share, ação especial que dá o direito de vetar operações como a união com a Boeing.
Potencial de mercado
Projeto da Força Aérea Brasileira (FAB), o KC-390 é uma plataforma multimissão com capacidade para operações como: transporte de carga, lançamento de tropas ou paraquedistas, rabastecimento aéreo, busca e salvamento, evacuação aeromédica e combate a incêndios, além de apoio a missões humanitárias.
É um avião moderno, com forte potencial para substituir seu concorrente. Isto porque o C-130 Hércules, apesar de moderno em relação à primeira geração da família, dos anos 1950, é um avião considerado ultrapassado, com custos operacionais altos, explica o professor da Universidade de Campinas.
Barbieri, que coordena o Laboratório de Estudos das Indústrias Aerospaciais e de Defesa da Unicamp, estima que haja mercado para algo em torno de 700 unidades do KC-390, nas próximas duas décadas.
A Embraer não revela valores da aeronave, por considerar que a configuração dedicada de equipamentos pode alterar significativamente o valor de cada unidade, no mercado de Defesa. Mas sites especializados estimam que o preço de fábrica do produto é de US$ 85 milhões.
Em uma conta simplista, o mercado potencial do KC, para 700 unidades, seria de US$ 60 bilhões, no mínimo.
Prejuízo
Por outro lado, é uma aeronave que já deu fortes prejuízos para a Embraer. A empresa fechou o segundo trimestre do ano passado (2018) com prejuízo de quase meio bilhão (R$ 467 milhões), fruto de um “incidente” com o protótipo 001 do KC-390.
O avião derrapou na pista de testes, em Gavião Peixoto (SP), o que ocasionou danos na fuselagem e nos trens de pouso, sem deixar nenhum ferido. Para a conclusão dos ensaios de voo, a FAB cedeu a aeronave 003, e a entrada em serviço do modelo teve que ser adiada.
A receita do setor de Defesa e Segurança da Embraer no ano passado ficou entre US$ 800 milhões e US$ 900 milhões (estimativa com base nos resultados até o terceiro quadrimestre). O que representa cerca de 15% das receitas totais da empresa.
Futuro
Em operação desde fevereiro de 2015, o KC-390 encontra-se atualmente em campanha de ensaios de voo. Com mais de 2 mil horas no ar, a aeronave vem passando por uma série de testes.
Há um mês e meio, a Embraer obteve sucessos nos testes de desembarque de tropas e evacuação de cabine, em ensaios que contaram com cerca de 400 militares da FAB e do Exército Brasileiro.
A expectativa é de que a aeronave conquiste certificação militar final ainda este ano, no último trimestre. O que seria um passo importante para conquistar novos clientes.
O contrato com a FAB, assinado em 2014, prevê a aquisição de 28 aeronaves. Além disso, a Embraer está em fase final de negociação com o governo de Portugal para a venda de seis aeronaves (sendo cinco pedidos firmes) e já assinou carta de intenção com a empresa de serviços de aviação SkyTech.
Reforma tributária promete simplificar impostos, mas Congresso tem nós a desatar
Índia cresce mais que a China: será a nova locomotiva do mundo?
Lula quer resgatar velha Petrobras para tocar projetos de interesse do governo
O que esperar do futuro da Petrobras nas mãos da nova presidente; ouça o podcast