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Acordos de leniência firmados com o Ministério Público Federal não livram empreiteiras implicadas na Lava Jato de riscos. Leia mais na Gazeta do Povo | Yasuyoshi Chiva/AFP
Acordos de leniência firmados com o Ministério Público Federal não livram empreiteiras implicadas na Lava Jato de riscos. Leia mais na Gazeta do Povo| Foto: Yasuyoshi Chiva/AFP

Os acordos de leniência firmados por Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Odebrecht com o Ministério Público Federal (MPF) parecem estar longe de ser o ponto final da página que as empreiteiras tentam virar na busca pela reestruturação.

Apesar de terem se comprometido a pagarem juntas quase R$ 10 bilhões em multas, os valores estão sob ampla contestação por órgãos do governo e pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Bruno Dantas, ministro do TCU, disse, em entrevista ao “Estado de S. Paulo”, que o acertado pelas empresas com o MPF era apenas um “aperitivo”.

Além dessa insegurança, a situação das empresas, na prática, não mudou após os acordos: a Petrobras não as retirou de sua lista negra, os bancos seguem restringindo crédito, outros países as investigam e os investidores ainda estão ressabiados em fechar negócios, alegando insegurança jurídica.

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Empreiteiras e MPF tentam acordo com TCU

“O acordo de leniência com o MPF não resolve a situação da empresa, pois ela fica sujeita a diferentes órgãos, que têm competência para também tratar do assunto”, disse a advogada Shin Jae Kim, do escritório Tozzini Freire. “Para tranquilizar credores e dar segurança às empresas, seria preciso uma nova legislação.”

Nos bastidores, executivos das empresas e seus advogados dizem que, se tiverem de pagar mais do que já acertaram em suas leniências ou forem declaradas inidôneas — ou seja, impedidas de firmar contratos com a administração pública — vão falir. As companhias alegam ainda que estão nas mãos de muitos órgãos do governo, que têm interesse direto nas delações.

“Todos os poderes que podem ser objeto de delação não podem estar nessa discussão”, diz o advogado criminalista Celso Vilardi, que ajudou a negociar os acordos da Andrade Gutierrez e da Camargo Corrêa. “É um desestímulo para as empresas fazerem acordo.”

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Andrade Gutierrez está com a faca no pescoço, diz presidente

Uma sequência de declarações dadas na semana passada por personagens envolvidos nessa história refletiu esse clima. Em entrevista à “Folha de S. Paulo”, o presidente da Andrade, Ricardo Sena, pôs em dúvida a liberação de crédito pelos bancos ao afirmar que a empresa tem “essa faca, de o TCU poder cobrar o que quiser, no pescoço”, referindo-se ao julgamento do tribunal.

Na semana anterior, o TCU havia decidido não declarar a inidoneidade das empresas em função da leniência com o MPF, mas disse que voltaria ao assunto em 60 dias.

Na quinta-feira, o ministro da Transparência (Controladoria-Geral da União — CGU), Torquato Jardim, disse que os acordos de leniência do MPF são válidos, mas deixou claro que a decisão para fechar contratos com o governo depende do crivo da CGU.

Na sexta-feira, o subprocurador-geral do MPF, Marcelo Moscogliato, responsável por aprovar as leniências, disse que as empresas sabiam que poderiam ter de pagar mais do que o acertado com o MPF, em função de pedidos de indenização. Mas o procurador defende que os outros órgãos não esqueçam de que só existe algo a ser cobrado porque as próprias empresas contaram quais eram os erros.

Empreiteiras podem ter de pagar bilhões

A Odebrecht tem a seu favor o fato de que o Departamento de Justiça americano, que também validou o acordo de leniência da empresa, considerou nas contas da indenização a capacidade financeira da empresa. Originalmente, a multa deveria ser de US$ 4,5 bilhões, ou R$ 14 bilhões. Mas a empresa conseguiu mostrar que só teria condições de pagar R$ 8 bilhões.

Andrade e Camargo, que fecharam acordos menores, podem ter de revisar suas indenizações. A Camargo Corrêa foi a primeira a fazer acordo, e acertou pagar R$ 750 milhões. A Advocacia-Geral da União (AGU), porém, cobra R$ 5 bilhões em um processo de improbidade administrativa. A Camargo diz que é uma ação parecida com a do MPF, que foi retirada em função da leniência. Já a Andrade Gutierrez está sendo cobrada em cerca de R$ 2,5 bilhões.

A confiança das empresas é que o Judiciário possa acabar com esse conflito entre os poderes. Na semana passada, o juiz da 1.ª Vara Federal de Curitiba decidiu, em um processo que bloqueava bens da Odebrecht, não ser razoável que a AGU continuasse a cobrar a empresa depois da leniência, já que tanto MPF quanto a AGU representam o Estado.

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Inidoneidade pode travar financiamentos

O grande temor das empresas que foram envolvidas na Lava Jato, acusadas de corrupção e desvio de dinheiro público, é de serem declaradas inidôneas, ou seja, de ficarem impedidas de fecharem contratos com o governo federal.

Tanto o Tribunal de Contas da União como o Ministério da Transparência podem hoje decidir o destino das empresas nessa questão.

Mesmo para as empresas que não dependem de contratos governamentais, uma decisão como essa pode ter efeitos colaterais graves. A Caixa Econômica Federal, que tem hoje R$ 78,4 bilhões em financiamentos de infraestrutura, resume a situação, em nota enviada ao “Estado de S. Paulo”:

Do ponto de vista de fundamentos de risco, as ilegalidades cometidas, e que provocarão a declaração de inidoneidade, são sinais da adoção de más práticas empresariais, afetando a credibilidade e o caráter das companhias e, por conseguinte, a confiança dos credores.

Caixa Econômica Federal Em nota

Os bancos privados Bradesco, Santander e Itaú também foram questionados sobre esse ponto, mas se esquivaram de responder em como a inidoneidade afeta os financiamentos. O Banco do Brasil também não comentou.

No BNDES, ainda não há uma definição de como o banco vai tratar o assunto. O diretor jurídico, Marcelo Siqueira, limitou-se a dizer que o banco ainda está estudando o acórdão recente do Tribunal de Contas da União que decretou a inidoneidade de cinco empreiteiras que fizeram parte da obra da usina nuclear de Angra 3.

No mesmo processo, técnicos do TCU recomendam que Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Odebrecht também sejam declaradas impedidas de fechar contratos com o governo. O tempo da proibição seria menor para a Camargo por ter fechado acordo com o Cade. Os ministros do TCU, porém, ponderaram que os acordos de leniência com o Ministério Público podem ser atenuantes e adiaram por 60 dias uma decisão para essas empresas.

Empreiteiras e MPF tentam acordo com TCU

As três grandes empreiteiras do país, junto com os procuradores da Lava Jato, estão tentando chegar a um consenso com o Tribunal de Contas da União e já têm uma proposta para apresentar aos ministros do TCU.

Segundo fontes que participaram na sexta-feira (31) de reunião com os procuradores para discutir o assunto, a ideia é propor que o TCU passe a fazer parte dos acordos de leniência. O papel do tribunal seria o de ajudar a definir o valor total dos danos provocados por atos de corrupção das empresas que fazem leniência.

O TCU, porém, não teria a prerrogativa de validar os acordos fechados com o Ministério Público. Além disso, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Odebrecht não teriam de fazer novos desembolsos além do já acertado com o MPF. Isso só aconteceria caso descumprissem o acordo. Já as empresas que estiverem envolvidas nos mesmos atos a serem analisados em processos administrativos do Tribunal, mas que não fizeram acordo de leniência, teriam de pagar o valor integral correspondente às suas participações.

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