Há pelo menos três anos a rotina do publicitário Guilherme Gomide incluia a análise de propostas para fusão ou compra da Mídia Digital, agência que ajudou a fundar em 1995, em Curitiba, e da qual era sócio. No último dia 13 de maio, depois de mais de um ano de conversas, ele assinou uma delas. Hoje, a Mídia Digital faz parte do maior grupo de comunicação do mundo, a WPP, com mais de 2,4 mil escritórios. Para Gomide, a venda deixa a Mídia Digital mais preparada para a "explosão de demanda" pela qual devem passar as agências digitais.
A negociação também envolveu a I-Cherry, criada em 2008 como braço de search marketing da agência e dirigida pelo publicitário Alexandre Kavinski. Juntas, as duas empresas somaram uma receita de US$ 5,3 milhões em 2009. Em entrevista exclusiva para a Gazeta do Povo, o presidente da Mídia Digital fala sobre a publicidade nos meios digitais e as mudanças que a negociação trouxe para as empresas.
As duas agências vivem um momento de expansão e têm planos para conquistar clientes além das fronteiras brasileiras. Mas a sede e a maior operação das duas empresas, garante o presidente da Mídia Digital, continuará na capital paranaense. "Antigamente, ter uma agência de Curitiba era um impedimento. Hoje é um diferencial", diz. "Temos acesso a profissionais tão ou mais qualificados que São Paulo, por exemplo, mas sem o componente de inflação salarial de lá, já que o custo de vida é menor. Além disso, a rotatividade de funcionários é menor algo que os clientes valorizam."
Quando e como foi a negociação com a WPP?Nos últimos 3 anos vínhamos conversando com vários grupos. A negociação com a WPP, em especial, estava acontecendo havia mais de um ano. As agências digitais acabaram, nos últimos anos, ficando muito em evidência por conta do crescimento do meio internet tanto no uso, como na migração de verbas publicitárias. Mesmo que elas não tenham migrado como deveriam, porque hoje existe muito mais consumo de mídia internet do que investimento nessa mídia, as agências com experiência digital ficaram atraentes para os grandes grupos de comunicação. Isso gerou interesse de vários grupos em fazer associações ou fusões. Nunca chegamos a evoluir muito com outros grupos, mas com a WPP houve uma sinergia, porque temos alguns clientes em comum como HSBC e Jonhson&Johnson. Os últimos seis meses foram efetivamente de negociação, porque não é simples fazer um contrato com o grupo que tem sede fora do Brasil. A parte contratual é bastante rígida e detalhada.
O que muda com a venda? Você e o Alexandre continuam na gestão das agências?
Continuamos na gestão por pelo menos cinco anos, conforme acertado em contrato. Mas meu desejo não é ficar cinco anos e ir embora. Fizemos um negócio para que a gente consiga construir um negócio maior do que conseguiríamos de forma independente. Seria hipocrisia dizer que não muda nada. Mas o que queremos é que as mudanças sejam muito mais em cima de coisas boas do que chatas. É óbvio que a forma de trabalhar de um grande grupo é diferente e mais rígida. Mas o que muda é a dimensão da demanda, dos clientes e, principalmente, da oportunidade que passamos a ter. E quando falo em oportunidade, me refiro aos colaboradores também. Já trabalhávamos para grandes marcas, e essa é uma tendência que deve se intensificar, inclusive com demandas internacionais.
O grande desafio que temos é conseguir usufruir dos benefícios que um grande grupo nos dá, sem perder ou mudar radicalmente a nossa cultura de proximidade junto aos nossos clientes, de agilidade e flexibilidade. Se perdermos a identidade das agências, podemos ter um impacto negativo, seja nos clientes, seja nas pessoas. Esses são justamente os nossos maiores ativos, que foram justamente o interesse do WPP. Estou muito preocupado em deixar que essa aquisição mude a nossa cultura e a nossa identidade. Se conseguirmos manter o que temos de bom com as duas coisas, vamos catalizar um crescimento muito maior.
A WPP vai fazer investimentos nas agências?
A Mídia Digital acaba de investir em uma nova estrutura em Curitiba, que vai se complementar à que temos hoje. Também vamos expandir a atuação em São Paulo. Hoje são 4 pessoas trabalhando lá e, em breve, serão 30. As duas agências passam a ter, juntas, mais de 220 funcionários (atualmente são cerca de 160). Mas como a empresa sempre foi sólida e deu lucros, não havia necessidade de investimentos neste momento. Estamos enxergando as sinergias com as outras empresas do grupo, e é possível que a gente traga pessoas de outras operações digitais da WPP, por exemplo.
Você mencionou que a compra prepara a agência para novas oportunidades. Onde você acredita que estão essas oportunidades do marketing digital?
Já existe uma demanda crescente, uma avalanche de demanda de trabalhos de comunicação digital seja investimento em mídia, seja em criação e produção de conteúdo digital. Os anunciantes descobriram os meios digitais, na internet e nas aplicações de telefonia celular. Isso naturalmente faz com que muitos anunciantes estejam revendo investimentos em outros meios e destinando uma parcela maior para internet. Somente isso já seria um motivo para esperarmos um crescimento, estando na WPP ou não. Fazendo parte do grupo, estamos um pouco mais preparados para realmente atender essa explosão de demanda.
O descompasso entre audiência e investimentos na internet tende a diminuir?
Sem dúvida. Se você olhar para países como a Inglaterra, mais de 15% do investimento em mídia é destinado à internet. No Brasil, estamos próximos de 5%, enquanto o tempo que o usuário passa usando mídias digitais está se aproximando de 20% do total destinado ao consumo.
Vamos chegar ao patamar inglês?
Imagino que sim. A questão é se vamos fazer isso em três ou em cinco anos.
O que falta ainda para diminuir esse descompasso?
Acredito que é um pouco de cultura do anunciante, que é uma barreira que está caindo. Temos clientes que investem até 30% do seu budget de marketing em mídias digitais. Um pouco talvez do modelo publicitário no Brasil ainda há uma grande concentração de verbas em dois grandes grupos, porque a mídia no Brasil não é tão fragmentada quanto é nos Estados Unidos, por exemplo. Um líder de audiência nos EUA vai ter 15% de alcance. Em um país como o Brasil, a Globo chega a ter 80% de alcance. Isso faz com que o ritmo migratório no país seja mais lento. Mas isso vai acontecer. Não tem outro caminho.
Como você vê as mídias digitais nessa avalanche? Elas são obrigatórias para as empresas?
Eu acredito que são obrigatórias, sim. Só que estão começando a surgir especialistas em redes sociais, e isso não existe. Tínhamos na agência uma equipe de mídias sociais e não temos mais. As redes sociais não mais são do que a conversa de boteco amplificada em canais que antes não existiam. Falar mal ou bem de uma marca, recomendar um produto, nada mais é do que um comportamento que já existia e foi transportado para os meios digitais. A diferença é que agora você consegue ouvir e interagir. Por isso, não pode ser tratado como algo a parte, e sim dentro da estratégia de marketing como um todo. A comunicação virou algo de mão dupla. As mídias sociais são um ingrediente para o qual devemos ficar atentos, mas não ser tratado como um mundo a parte.
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