A equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avalia que a indicação do nome que ocupará o Ministério da Fazenda não é essencial para reverter a impressão negativa que o mercado criou com as falas iniciais do petista após a vitória na eleição.
Os apoiadores de Lula creem que o quadro poderá ser modificado com o andamento da transição governamental, com a exposição do histórico de Lula durante seus dois outros mandatos na Presidência (2003-2010) e com a tramitação da proposta de emenda à Constituição (PEC) Fura-teto, que deverá assegurar recursos para o pagamento do Auxílio Brasil/Bolsa Família a partir de 2023.
"O presidente Lula não cede a pressões. Ele indicará o Ministro da Fazenda quando acreditar que deve indicar", declarou o deputado federal Enio Verri (PT-PR), membro da equipe de transição.
Para ele, "o mercado está sendo injusto" com o presidente eleito. "Lula dirigiu o Brasil por oito anos. E sempre mostrou compromisso com a responsabilidade fiscal. Diferentemente de [Jair] Bolsonaro, Lula entende de economia. E sabe que sem responsabilidade fiscal os juros sobem, a inflação cresce, enfim, todo mundo perde", afirmou.
Também integrante da equipe de transição, o deputado federal Marcelo Ramos (PSD-AM) ressaltou que Lula "não vai ser irresponsável" e que "um país quebrado não atende as demandas sociais", o que seria a prioridade atual do petista ao desejar o rompimento do teto de gastos.
As reações do mercado se intensificaram após Lula minimizar a importância de práticas de responsabilidade fiscal.
“Por que as pessoas são levadas a sofrerem para garantir a tal da estabilidade fiscal nesse país? Por que toda hora as pessoas falam que é preciso cortar gasto, fazer superávit, teto de gastos? Por que essas mesmas pessoas que discutem com seriedade o teto de gastos não discutem também a questão social desse país? Por que a gente tem meta de inflação e não tem meta de crescimento? Por que a gente não estabelece um novo paradigma de funcionamento nesse país?”, disse o petista em 10 de novembro.
Uma semana depois, Lula deu outras declarações que desagradaram setores do campo financeiro: "Temos de fazer um país mais humano. Se não resolvermos a situação social, não vale a pena governar o país. Vai aumentar o dólar, cair a bolsa? Paciência”.
Favoritismo de Haddad ajudou a estremecer o cenário
O fato de o nome do ex-prefeito Fernando Haddad ter crescido na bolsa de apostas para ocupar o Ministério da Fazenda também ajudou o mercado a olhar de forma mais negativa para o futuro governo Lula.
Haddad, que foi o candidato do PT derrotado ao governo de São Paulo na eleição de outubro, se tornou o favorito para o cargo, segundo noticiou o jornal "O Globo" na sexta-feira (18).
O ex-prefeito seria o titular do Ministério da Fazenda, que ressurgiria com a dissolução do atual Ministério da Economia, processo que levaria também à recriação do Ministério do Planejamento.
A indicação de Haddad corresponderia a um dos propósitos desejados por Lula para a Fazenda: a de que a pasta seja comandada por uma personalidade de currículo político, e não por alguém que tenha apenas formação técnica na área.
Na opinião da economista-chefe da corretora CM Capital, Carla Argenta, a eventual confirmação de Haddad ou a indicação de outro nome da vertente política poderia dificultar ainda mais as coisas entre Lula e o mercado financeiro, pelo menos num primeiro momento. Ela avalia que a ideia tende a repercutir mal entre os operadores do setor e prevê reações exacerbadas nas cotações até que seja definida a nova política fiscal do país.
Apesar das especulações de bastidores, Lula e seu entorno evitam falar publicamente em nomes. "Apenas o travesseiro dele e, talvez, a Janja [esposa de Lula], sabem quem será o novo ministro", brincou o deputado Verri. Ele citou que tem feito reuniões periódicas com Lula sobre a transição e que a menção a nomes não é algo que faça parte dos debates.
Retorno e diálogo
O presidente eleito retoma suas atividades habituais na transição nesta semana após o giro por Egito e Portugal para participar da COP27 e se encontrar com Marcelo Rebelo de Sousa, presidente do país europeu.
Para Enio Verri e Marcelo Ramos, o retorno de Lula deve ser decisivo para o arrefecimento dos ânimos do mercado. "O mercado tende a se acalmar ao longo de dezembro", declarou Verri, que põe sua confiança na evolução dos trabalhos da transição e em esclarecimentos que, segundo ele, os membros do novo governo devem apresentar nas próximas semanas. "A reação do mercado irá se arrefecer com o tempo. Lula tem lastro para que as pessoas confiem nele", disse Ramos.
O deputado do Amazonas ressaltou que o suposto antagonismo entre os investidores e as políticas de Lula refletem, também, a disputa eleitoral. "O mercado fez de tudo para eleger Bolsonaro. Já quem recebe salário mínimo e os beneficiários do Bolsa Família votaram em Lula. Então o mercado não pode esperar que Lula fale por eles", acrescentou.
Tanto Verri quanto Ramos têm confiança de que a PEC Fura-teto será aprovada pelo Congresso a tempo de garantir o pagamento dos benefícios no próximo ano. A análise de ambos é que o tema parte de um ponto que é desejado também pelos apoiadores de Bolsonaro, o pagamento do benefício social na casa dos R$ 600. O fato de a tramitação se iniciar no Senado é também um ponto positivo, na avaliação deles, já que o presidente da casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), tem mais proximidade com Lula do que o comandante da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
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