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Inflação
Alta da inflação deve gerar sobra orçamentária no teto de gastos de R$ 38,9 bilhões em 2022.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A alta da inflação verificada nos últimos meses tem pressionado as famílias e boa parte da economia, mas terá efeito contrário no Orçamento federal. Ela jogará para cima o teto de gastos, a regra constitucional que fixa um limite anual para despesas com base na variação da inflação, abrindo margem para mais gastos. E isso acontecerá justamente em 2022, ano eleitoral, quando há maior pressão por aumento de despesas, como investimentos e reajustes salariais.

O projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2022, que estabelece as diretrizes para elaboração do Orçamento do ano que vem, prevê que o limite para as despesas sujeitas ao teto de gastos crescerá R$ 106,1 bilhões em relação a este ano. O valor é mais que a soma do reajuste de despesas feito nos últimos dois anos do governo Bolsonaro.

Isso ocorrerá porque o limite do teto de gastos do ano subsequente é reajustado pela variação da inflação oficial, medida pelo IPCA, no período de 12 meses encerrado em junho do ano corrente. O governo estima que essa variação da inflação nesse intervalo de tempo será de 7,14%, a mais alta dos últimos anos, permitindo aumento das despesas sujeitas ao teto em R$ 106,1 bilhões.

Enquanto isso, as despesas obrigatórias atreladas ao salário mínimo, que é corrigido pela inflação de janeiro a dezembro, devem crescer apenas 4,27% em 2022, segundo as projeções do governo, pois a tendência é de desaceleração da inflação no segundo semestre deste ano. São várias as despesas atreladas ao mínimo, como o piso dos benefícios da Previdência Social, o Benefício de Prestação Continuada (BPC), o abono salarial e o seguro-desemprego. Essas despesas respondem pela maior parte do Orçamento.

Como o percentual de reajuste dessas despesas obrigatórias atreladas ao piso será menor do que o reajuste do teto de gastos, a tendência é de sobra de espaço dentro do teto. Segundo cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado, essa sobra será de R$ 38,9 bilhões. Em outras palavras, é quanto o governo deve poder gastar a mais em 2022 com novas despesas ou aumentando ainda mais as já existentes, além do que é obrigado por lei. Os números podem mudar, a depender de quanto a inflação vai variar de fato, tanto no acumulado de 12 meses até junho quanto no acumulado até dezembro.

Essa sobra de R$ 38,9 bilhões deve surgir justamente num ano eleitoral, em que há pressão para aumento do gasto público. Neste ano, o governo cedeu e aumentou as emendas parlamentares, verbas indicadas por deputados e senadores para obras públicas, normalmente em seus redutos eleitorais. Para o ano que vem, além do aumento do investimento, haverá uma pressão pelo reajuste do salário dos servidores públicos federais. A última vez que eles tiveram aumento foi em 2016, no governo Temer.

Em relatório, a IFI defende a não utilização da sobra orçamentária estimada para 2022. “Folga fiscal no teto de gastos não avaliza aumento de despesas, dado contexto fiscal desafiador. Ocorre que o déficit público ainda será elevado, no ano que vem, e a dívida continuará em trajetória de alta”, diz o texto. Nos cálculos da IFI, a dívida bruta do governo deve atingir 92,7% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2021.

Governo tenta evitar uso de sobra orçamentária no teto por obra da inflação

O governo tenta evitar o uso dessa sobra orçamentária. No PLDO de 2022, encaminhado ao Congresso no último dia 15, o Ministério da Economia projetou as despesas sujeitas ao teto de gastos a exatamente o mesmo montante permitido pela regra fiscal no ano que vem: R$ 1,592 trilhão. Ou seja, o Executivo não previu a sobra de R$ 38,9 bilhões.

Segundo os cálculos da IFI, o governo superestimou as despesas obrigatórias, principalmente as previdenciárias, para não ter essa sobra. A instituição acredita que os gastos com a Previdência estão superestimados entre R$ 15,6 bilhões e R$ 21,1 bilhões. Ao todo, as despesas obrigatórias no PLDO de 2022 estão R$ 35,2 bilhões maiores do que as projetadas pela IFI no seu relatório fiscal.

A IFI suspeita que o governo fez isso justamente para conter as tentativas de aumento de gastos em 2022, em especial de reajuste do funcionalismo público. “Ao projetar despesas sujeitas ao teto exatamente iguais ao teto, mesmo havendo diferença expressiva ao se cotejar com o quadro atual de projeções da IFI, evita-se iniciar discussão sobre a divisão dessa folga. Seria, como já dito, a repetição do que ocorreu em 2021, mas agora em cima de um espaço fiscal real, ao menos à luz do teto de gastos”, dizem os técnicos da instituição.

O PLDO de 2022 precisa ser aprovado pelo Congresso. Os parlamentares podem fazer alterações. Neste ano, os congressistas fizeram mudanças nas projeções de despesas obrigatórias, o que não era comum. O governo também pode pedir alterações enquanto o projeto estiver tramitando, se verificar que superestimou ou subestimou algum gasto.

Reajuste de salário entra no radar

Porém, ao mesmo tempo que pode ter superestimado as despesas obrigatórias para evitar o uso da gordura do teto de gastos com outros gastos, o governo abriu a porteira para aumento salarial no ano que vem.

O Ministério da Economia incluiu no PLDO de 2022 um dispositivo que autoriza o governo a fazer uma avaliação das contas públicas para eventualmente conceder reajuste salarial a servidores públicos federais. O aumento virá, entre outros fatores, se for verificada a existência de recursos orçamentários suficientes e se um eventual aumento caberá dentro do teto de gastos.

A decisão final sairá até 31 de agosto, quando o governo tem de enviar o Orçamento de 2022 para aprovação do Congresso. O último reajuste para os servidores foi dado em 2016, durante o governo Michel Temer. Em 2019, houve aumento somente para as Forças Armadas e para a polícia militar e bombeiros do Distrito Federal, corporações que são bancadas com recursos da União.

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