A alta do dólar em relação ao real nos últimos meses deixou o brasileiro mais pobre. Apesar de o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, divulgado na sexta-feira, 30, ter ficado acima das expectativas, com alta de 1,5% sobre o trimestre anterior, o fato é que, em dólar, o brasileiro já perde poder de compra.
O PIB per capita, que mostra a divisão da criação de riqueza do país pelo número de habitantes, vem encolhendo. Depois de atingir o pico de US$ 12.690 em 2011, caiu para US$ 11.460 no ano passado. O repique do PIB no segundo trimestre fez esse ganho voltar para a casa de US$ 12 mil; mas, para o encerramento deste ano, a perspectiva de baixa permanece.
Segundo cálculo da analista Alessandra Ribeiro, da Tendências Consultoria Integrada, ao final de 2013, a cota de riqueza de cada brasileiro será de US$ 10.920, quase 5% abaixo do valor ao final do ano passado - considerando-se um crescimento de 2,1% do PIB e uma taxa de câmbio de R$ 2,40. Será a primeira vez, desde 2009, que o resultado ficará abaixo de US$ 11 mil. Naquele ano, o PIB per capita foi de US$ 8.470.
A queda na riqueza individual não é um mero efeito contábil. Na vida real, a cotação do dólar baliza - direta e indiretamente - o preço de uma série de produtos. Os importados exprimem a variação de maneira instantânea. Se há alta, como agora, o preço sobe na hora.
Um iPad básico, na loja em Nova York, custa US$ 499 desde o lançamento pela Apple, em 2010. O turista brasileiro pagou o equivalente a R$ 989 por ele em abril deste ano, quando o dólar estava abaixo de R$ 2,00. Mas vai desembolsar R$ 1.189 se quiser levá-lo hoje.
Insumos
Mas não é preciso sair do País para ver o efeito do câmbio nos preços. Insumos e componentes importados estão embutidos numa incontável lista de produtos produzidos dentro das fronteiras.
O Brasil importa mais da metade do trigo que consome - e trigo vira farinha, a essência do pãozinho. Apesar de as cervejas nacionais terem na composição misturas a base de milho e arroz produzidos no mercado interno, por volta de 40% dos ingredientes de uma loira gelada são importados.
No celular, o aparelho que está na mão de praticamente todos os brasileiros, 70% dos componentes são comprados com moeda estrangeira. De 2007 para cá, o chamado índice de penetração de importados, que mede a participação de insumos e componentes estrangeiros nas linhas de produção brasileiras, só fez aumentar. Nos produtos feitos a base de petróleo, passou de 11% para 21%. Nos têxteis, de 12% para 22%. Na metalurgia, foi de 13% para 20%.
"O câmbio pega de forma generalizada", comenta o economista Juarez Rizzieri, professor da Universidade de São Paulo. "Assim, não apenas o consumidor fica mais pobre em dólar, mas também o empresário, que paga mais para importar e para investir."
AlimentosUm simples passeio por uma padaria pode dar a dimensão de como a valorização do dólar tornou-se parte do dia a dia do brasileiro. A Galeria dos Pães, no bairro de Higienópolis, na capital paulista, é um bom exemplo. O estabelecimento é praticamente uma fábrica de guloseimas. Instalado num prédio de 600 metros quadrados, nunca fecha e, para oferecer mais de 200 tipos de pães, bolos e doces aos 5 mil clientes que recebe diariamente, compra quase duas toneladas de farinha por mês.
De acordo com Milton Guedes de Oliveira, sócio-fundador da Galeria dos Pães, os aumentos dolarizados estão vindo de todos os lados. Suas castanhas, frutas cristalizadas, vinhos, salames e queijos mais finos, como brie, são importados e acompanham a variação do câmbio. Curiosamente, o preço do cacau, do açúcar, da castanha de caju e do óleo de soja - 100% brasileiros - também seguem o câmbio, porque são produtos típicos de exportação e têm seus preços formados no exterior.
Nos últimos meses, três dos sete ingredientes básicos utilizados na fabricação do pão francês tiveram alta: a farinha (18%), o açúcar (15% no acumulado, mas chegou a ter alta de 40%) e o fermento (10%). Oliveira nem repassou os aumentos e já sente a retração dos clientes. "Estamos voltando no tempo", diz ele. "Os fornecedores temem fazer encomendas porque não sabem quanto vão pagar pelo pedido e há quem faça o reajuste sem nenhum planejamento." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.