O reajuste do salário mínimo não é o fator que explica a significativa queda na desigualdade de renda do trabalho desde 2004. A constatação é da pesquisa "Redistribuição à brasileira: ingredientes trabalhistas", divulgada nesta terça-feira pelo Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPS-FGV).
O economista Marcelo Neri, chefe do CPS-FGV, analisou os microdados da Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE e constatou que, entre março de 2002 e junho de 2006, a fatia da renda do trabalho apropriada pelos 50% mais pobres entre os trabalhadores das seis maiores regiões metropolitanas do país cresceu de 10,11% do total para 12,20% do total.O Índice de Gini - um termômetro da desigualdade que, quanto mais perto de zero, melhor - da renda domiciliar per capita do trabalho caiu de 0,633 para 0,6. E o percentual dos trabalhadores pobres caiu de 23,95% para 18,57% do total.
No entanto, o grande avanço nesses indicadores ocorreu entre abril e julho de 2004. Nesse curto período, a fatia de renda apropriada pelos 10% mais pobres cresceu de 10,50% para 11,62% do total, o Índice de Gini caiu de 0,626 para 0,609 e o número de pobres de 23,88% para 19,45% do total. E, em 2004, o salário mínimo sofreu um pequeno reajuste, de R$ 240 para R$ 260, apenas repondo perdas da inflação, ou seja, sem ganho real para os trabalhadores. Em compensação, em 2005 houve aumento real de 9% no salário mínimo e, este ano, de 13%. Entretanto, não houve uma redução drástica da desigualdade como ocorreu em 2004.
Neri analisou ainda os números do emprego formal no período do reajuste do salário mínimo. Entre abril e julho de 2005 - o reajuste do ano passado foi em maio - houve uma redução de 14,15% no número de postos de trabalho formais na faixa salarial afetada pelo mínimo, ou seja, entre R$ 260 (piso antes do reajuste) e R$ 300 (piso depois do reajuste).
Entre março e junho de 2006 - este ano, o salário mínimo subiu em abril - a queda no número de postos de trabalho na faixa mais sensível (entre R$ 300 e R$ 350, ou seja, valor anterior e posterior do piso) foi de 19,13%.
- Com o reajuste do salário mínimo, muitos trabalhadores perdem o emprego ou caem na informalidade. No passado, o efeito positivo do salário mínimo na redução da pobreza era muito forte. Os números mostram que a partir de 2004 isso já não é mais tão evidente. É preciso levar em conta que o salário mínimo aumentou 100% em termos reais desde 1995. Talvez seus efeitos adversos sobre o mercado de trabalho agora já superem os seus efeitos positivos - afirmou Neri.
O economista defende o que ele chama de "novas políticas sociais", como o Bolsa Família que, na sua opinião, tem um efeito na redução da pobreza e da desigualdade muito mais intenso do que o reajuste do salário mínimo.
- O problema é que o salário mínimo ocupa uma posição no imaginário popular como grande política social que, ao meu ver, não se justifica - completou.