Em menos de uma semana, o setor de combustíveis foi alvo de duas "intervenções" do governo federal. A primeira, cogitada desde o fim de 2009, foi a alteração na mistura de álcool à gasolina, que na segunda-feira recuou de 25% para 20%, a fim de elevar a oferta do combustível vegetal e conter a alta de seus preços. A segunda medida a redução da Cide da gasolina de R$ 0,23 para R$ 0,15 por litro, que entra em vigor hoje serviu para anular um conhecido efeito colateral da primeira: o aumento dos preços do derivado de petróleo, que, com menos álcool, ficou mais caro. Não ficou claro, em especial para os motoristas que pagaram mais para encher o tanque, por que o governo não fez todo o serviço de uma só vez.
"O governo poderia não ter passado essa vergonha e criado todo um constrangimento no mercado. Quando sobem, e já estavam subindo, os preços são como foguetes; quando caem, são como plumas. Então somente na segunda ou na terça-feira a situação estará normalizada", prevê Roberto Fregonese, presidente do Sindicombustíveis-PR (que representa os postos). Segundo ele, a tendência é que no início da próxima semana os preços recuem aos patamares observados no fim da semana passada quando a gasolina era vendida, em média, a R$ 2,55 por litro em Curitiba.
De 15 postos consultados pela Gazeta do Povo na segunda-feira, 7 reajustaram os preços até ontem, elevando a média para cerca de R$ 2,58 por litro. "Muitos postos não reajustaram porque vendiam estoques comprados antes do aumento", explica Fregonese. Contrariando a intenção do governo, o álcool também ficou mais caro, passando de R$ 1,91 para R$ 1,93 por litro, em média. Desta forma, a relação álcool/gasolina continuou próxima de 75% acima da marca de 70%, limite máximo para que o etanol seja vantajoso nos veículos flex.
Se por um lado é possível que a gasolina retorne ao patamar anterior, poucos acreditam que o preço do álcool possa cair antes da colheita da nova safra, prevista para março. "Essa redução na mistura da gasolina não refresca muita coisa, não. O álcool deve cair mesmo a partir do segundo trimestre", diz Arnaldo Luiz Correa, consultor da Archer Consulting, consultoria especializada em gestão de riscos agrícolas. "Mas também não vejo muito espaço para o álcool subir até lá. "
Inflação
Por trás das idas e vindas do governo provavelmente está a preocupação com a inflação. O IPCA começou o ano acelerado, pressionado pelas altas de alguns alimentos e pelo reajuste das passagens de ônibus em São Paulo. Caso a tendência persista, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC terá mais motivos para elevar a Selic. Inflação e juros em alta formam uma combinação que, em ano eleitoral, causa ao governo bem mais incômodo que os R$ 91 milhões que ele deixará de arrecadar com a redução da Cide.
A gasolina têm peso expressivo na formação do IPCA de aproximadamente 4%. Com as altas desta semana, seus preços em Curitiba estão 2% acima da média observada em dezembro, e superam em 9% o preço médio observado há um ano (R$ 2,37 por litro). O álcool, por sua vez, "pesa" apenas 0,4% no índice de preços, mas, com as fortes oscilações dos últimos meses, tem tido influência maior sobre a inflação. Apenas de dezembro para cá, a cotação do combustível subiu 15%. Em comparação com o preço médio cobrado um ano atrás (R$ 1,45 por litro), o aumento chega a 33%.
"A redução da mistura de álcool vale por três meses. Por isso, o consequente aumento da gasolina teria efeito apenas temporário sobre a inflação", aponta o economista Gian Barbosa, da Tendências Consultoria. "Mesmo assim, o Ministério da Fazenda achou por bem reduzir a Cide, pelo mesmo período. Aparentemente, está preocupado com a inflação corrente."
Colaborou Carla Bueno Comarella
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