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A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realiza nesta quinta-feira (7), a partir das 9 horas, a 17ª rodada de licitações de blocos para exploração e produção de petróleo e gás natural, sob fortes críticas de ambientalistas. Ao todo, serão ofertados 92 blocos no leilão, com área total de 53,9 mil quilômetros quadrados, localizados em quatro bacias sedimentares marítimas brasileiras: Campos, Pelotas, Potiguar e Santos.
As concessões são consideradas de risco exploratório, ou seja, o risco de investir e encontrar, ou não, petróleo ou gás natural é da empresa concessionária, que, por outro lado, tem a propriedade de todo o material que venha a ser descoberto e produzido na área. Nesse modelo, a empresa paga ao governo bônus de assinatura, um montante por ocupação ou retenção de área (no caso de blocos terrestres), royalties e, em alguns casos, participação especial.
As companhias interessadas oferecem um valor em bônus de assinatura e propõem um programa exploratório mínimo em que se comprometem a executar determinadas atividades, como pesquisas sísmicas, perfuração de poços exploratórios, entre outros. Vence aquela que apresentar a proposta mais vantajosa de acordo com os critérios previstos no edital.
Ao todo, nove empresas apresentaram interesse em participar do leilão: Petrobras, Chevron, Shell, Total, Ecopetrol, Murphy, Karoon, Wintershall e 3R Petroleum. Embora inscritas individualmente, elas podem fazer oferta também em consórcio. As vencedoras passarão por processo de qualificação, podendo ser classificadas como operadora A, B ou não-operadora, com base nas experiências comprovadas nas atividades a que se destinam os blocos.
Conforme essa distinção, operadoras A podem atuar em águas ultraprofundas, profundas e rasas, além de em terra. Operadoras B só podem atuar em águas rasas e terra, enquanto as não-operadoras podem compor consórcio, mas não podem ser as responsáveis pelas operações.
Leilão inclui blocos próximos a Fernando de Noronha e Atol das Rocas
A rodada ocorre sob pressão de ambientalistas, que criticam particularmente a inclusão de blocos das bacias Potiguar e de Pelotas. A primeira está próxima ao Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha e da Reserva Biológica do Atol das Rocas, áreas reconhecidas como Patrimônio Natural Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). No caso da bacia de Pelotas, além do risco ambiental, especialistas apontam riscos à atividade turística e pesqueira, especialmente no litoral de Santa Catarina.
Um parecer do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) aponta a ocorrência de 89 espécies ameaçadas de extinção nas áreas dos blocos que serão leiloados. Destes, 32% são considerados criticamente em perigo, 20% em perigo e 48% vulneráveis. O estudo do ICMBio, órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, foi feito a pedido do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
“Considerando a propagação por longas distâncias de ondas sísmicas, a grande mobilidade de algumas espécies marinhas, a ação das correntes marítimas sobre a propagação do óleo e o histórico de invasão de espécies exóticas associadas às atividades de exploração de petróleo e gás, torna-se temerária a inclusão dos blocos exploratórios da Bacia Potiguar devido a sua proximidade à Reserva Biológica do Atol das Rocas e ao Parque Nacional Fernando de Noronha”, afirma a analista ambiental Mayra Pereira de Melo Amboni no documento. “Tanto as atividades exploratórias quanto um evento acidental podem trazer danos irreparáveis a diversidade biológica desses ecossistemas.”
O parecer diz que não há como avaliar o impacto real ou potencial da atividade sobre cada espécie ameaçada por estarem inacessíveis informações mais precisas, como modelos de dispersão da pluma do petróleo, rotas das embarcações associadas às atividades de determinados blocos de exploração e a técnica empregada.
Em setembro, a bancada do Psol na Câmara dos Deputados chegou a apresentar um projeto de decreto legislativo visando sustar os efeitos do pré-edital da rodada de concessões da ANP, que acabou devolvido pelo presidente Arthur Lira (PP-AL) por extrapolar competência da Casa. Na plataforma change.org, uma campanha intitulada “Juntos por Fernando de Noronha”, contra o leilão dos blocos, acumulava cerca de 135 mil assinaturas até esta quarta-feira (6).
No último dia 24, a Agência de Notícias dos Direitos dos Animais (Anda), o Instituto Internacional Arayara e a Associação Nacional de Advogados Animaistas (Anaa) entraram com uma ação civil pública contra a ANP e a União na Justiça Federal do Distrito Federal em que pedem a suspensão do leilão dos blocos.
A preocupação dos ambientalistas repercute também entre investidores. Na sexta-feira (1º), a Associação Nacional dos Petroleiros Acionistas Minoritários da Petrobras (Anapetro) acionou a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) com uma representação em relação à participação da Petrobras na 17ª rodada de licitações da ANP. A entidade pede abertura de processo fiscalizatório para apurar o interesse da estatal nos blocos ofertados.
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“Particularmente nas áreas de Pelotas e da Bacia Potiguar ofertadas na rodada, a atividade exploratória de hidrocarbonetos pode ocasionar impactos ambientais nocivos irreversíveis a ecossistemas sensíveis. Por isso, a eventual compra e consequente exploração geram insegurança para acionistas da Petrobras, já que podem ocasionar sérios prejuízos financeiros à empresa em caso de efetivo dano ambiental”, explica a associação, que encaminhou ofício à presidência ao conselho de administração da empresa para que a estatal não participe do leilão.
Procurada pela reportagem, a ANP diz que houve prévia manifestação conjunta dos ministérios de Minas e Energia (MME) e do Meio Ambiente (MMA) e que os normativos em vigor a respeito das diretrizes ambientais foram cumpridos integralmente. “Os ajustes demandados pelos órgãos vinculados ao Ministério do Meio Ambiente foram acatados e todas as informações ambientais relevantes e disponíveis foram tornadas públicas aos interessados e à sociedade em geral”, informa a nota.
“Ressaltamos, contudo, que a aprovação dos blocos na manifestação conjunta MMA/MME para oferta em determinada bacia não significa aprovação tácita para o licenciamento ambiental. As informações ambientais existentes acerca de determinada área, decerto, serão utilizadas por ocasião do respectivo licenciamento ambiental e não suprem a necessidade de estudos ulteriores, cuja exigência é própria do licenciamento ambiental específico de determinado bloco ou área geográfica”, prossegue.
De acordo com o órgão regulador, na fase de licenciamento ambiental serão avaliados os potenciais impactos e riscos ambientais da atividade, o que permitirá concluir pela viabilidade ou não da exploração de petróleo e gás natural na região.
A realização do licenciamento ambiental apenas após a licitação é uma das críticas feitas por ambientalistas. Ao aprovar a realização da 17ª rodada de licitações da ANP, entendendo que a agência atendeu a todos os requisitos para a realização da concorrência, o Tribunal de Contas da União (TCU) recomendou que o Ministério de Minas e Energia avalie medidas para aprimorar os procedimentos relativos ao licenciamento ambiental de áreas para exploração e produção de petróleo e gás em futuros leilões.