Viajar de avião na classe econômica é sinônimo de desconforto. Os passageiros mais altos que o digam. No espaço entre as poltronas, um dos territórios mais disputados do avião, cada centímetro quadrado conta. Quando o apoio de braço é uma conquista digna de comemoração e reclinar o assento se torna motivo de brigas, surge a questão: as companhias aéreas foram longe demais?
Nas últimas semanas, nos Estados Unidos, três voos desviaram de suas rotas e fizeram pousos não programados devido a discussões entre passageiros por causa da falta de espaço. Em um dos incidentes, o motivo foi um dispositivo chamado Knee Defender (defensor de joelho). Inventado pelo americano Ira Goldman, que tem 1,90 m de altura, o produto é composto por um par de travas de plástico que, engatadas na mesa de refeição, impedem que o passageiro da frente recline seu encosto.
O registro de confusões em voos, porém, não parece sensibilizar as companhias aéreas e fabricantes de aeronaves, que continuam indo na contramão do conforto. Em julho deste ano, a Airbus solicitou a patente de um novo modelo de assento que se assemelha ao selim de uma bicicleta, com um pequeno encosto, que reduz o espaço entre os assentos, aumentando a capacidade de transporte e a receita por voo.
"O conforto reduzido é tolerável pelos passageiros desde que o voo dure apenas uma ou algumas horas", diz o documento. Isso sem contar a companhia irlandesa Ryanair, que em 2010 levou a redução de custos ao extremo sugerindo um assento no qual os passageiros viajariam em pé.
Otimização
O número de poltronas de cada aeronave é uma decisão da companhia aérea e não do fabricante. O alto custo do transporte aéreo leva as companhias a colocarem cada vez mais poltronas, otimizando o espaço e a margem de lucro. "As fileiras de assentos não são compatíveis com as janelas, pois há mais poltronas do que a proposta inicial do fabricante", diz Cláudio Candiota Filho, presidente da Associação Nacional em Defesa dos Direitos dos Passageiros do Transporte Aéreo (Andep).
Novas tecnologias
Segundo o engenheiro Cyro de Moraes Campos Júnior, professor da Faculdade de Ciências Aeronáuticas da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), fabricantes como a Boeing e a Airbus estão investindo em novas tecnologias para diminuir o peso e a espessura das poltronas para aumentar o espaço e reduzir o uso de combustível, responsável por quase 50% dos custos. "O transporte aéreo é muito caro, mas o consumidor quer preço baixo. Se o espaço e o peso não forem otimizados, se torna inviável, basta lembrar das companhias que desapareceram nos últimos anos."
Em julho, a Embraer lançou a segunda geração (E2) do avião comercial E-Jet, que tem apenas assentos de corredor e janela, eliminando a desconfortável poltrona do meio. No novo modelo, a largura das poltronas é de 64 centímetros e os assentos vêm em uma versão mais fina, deixando mais espaço livre para o passageiro.
Aéreas cobram por poltronas mais espaçosas
Empresas brasileiras como TAM e Gol passaram a cobrar uma taxa extra de R$ 20 a R$ 40, dependendo do tempo e da distância do voo, por assentos mais espaçosos na classe econômica, como os da primeira fileira e os que ficam em saídas de emergência. A prática é comum em companhias europeias e norte-americanas.
Entidades de defesa do consumidor questionam a cobrança, visto que estes assentos são mais espaçosos por uma questão de fabricação e nunca houve taxa extra por sua ocupação, uma vez que a primeira fila é destinada a idosos, gestantes e deficientes e os acentos de emergência só podem ser ocupados por pessoas aptas em situações imprevistas.
A defesa se dá com base no Código de Defesa do Consumidor, que proíbe elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços. Atualmente, não há restrição da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) quanto à prática.