A chuva dentro da média histórica em maio deve dar uma folga na pressão climática sobre o setor de energia. Mas o cenário ainda está longe da normalidade. Além de o sistema depender da geração térmica para compensar o nível baixo dos reservatórios, há uma conta bilionária a ser paga que pode engrossar ainda mais a tarifa de energia, inflada por um aumento médio de 40% só no primeiro trimestre deste ano.
Embora São Pedro tenha sua parcela de culpa na crise do setor elétrico, boa parte do passivo estimado em R$ 66 bilhões pela consultoria PSR e pelo Instituto Ilumina tem origem na mudança regulatória promovida no setor pela MP 579, que, entre outras medidas, antecipou a renovação das concessões em troca de um desconto de 20% na tarifa de energia. A maior fatia dessa conta – equivalente a R$ 27,6 bilhões – está relacionada justamente às indenizações ofertadas como contrapartida às empresas de geração e transmissão que aceitaram antecipar seus contratos.
Se essa conta bilionária fosse incorporada de uma só vez à tarifa de energia, teríamos um aumento médio de 33% na conta de luz, mas a PSR não acredita em um repasse único ao consumidor. O mais provável é que esse valor seja diluído em encargos na conta de luz nos próximos anos. Segundo Priscila Lino, sócia da consultoria, alguns desses custos já estão equacionados, como a dívida da Eletrobras coma a Petrobras, parcelada em 10 anos a partir de 2015. Outros, porém, não têm recurso disponível, como é o caso das indenizações. “O recurso previsto deveria vir da conta Reserva Global de Reversão (RGR), que está zerada. Ou o Tesouro banca ou isso terá de ser pago por meio de encargos na tarifa”, afirma Priscila.
O levantamento da PSR dá uma ordem de grandeza ao passivo existente no setor elétrico. Como ainda há valores indefinidos na questão das indenizações, o custo pode, inclusive, ser maior. Por outro lado, Priscila lembra também que há fatores que podem contribuir para a redução das tarifas, entre eles, a melhora do cenário hídrico, que reduziria a dependência térmica e o custo das bandeiras tarifárias. Na prática, porém, continuamos dependendo de chuvas abundantes para que o setor possa respirar mais aliviado. Pelo menos em 2015, a pressão sobre as tarifas vai continuar, avalia a consultora.
O cálculo R$ 64 bilhões feito pela PSR agrega ainda outros custos, a maioria deles sem provisionamento definido pelo governo, como a insuficiência dos recursos das bandeiras tarifárias, medidas emergenciais para reforçar a oferta de energia, ajuda às hidrelétricas devido ao risco hidrológico e dívida da Eletrobras com a Petrobras.
O Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico (Ilumina) lista outro item que engrossa em R$ 2 bilhões o passivo do setor. Trata-se da defasagem das tarifas de operação e manutenção das usinas nos contratos firmados pela MP, que estão abaixo do custo real de operação, avalia Roberto Pereira D’Araújo, diretor do Ilumina. Segundo ele, a maioria dessas empresas mantém investimentos à espera da contrapartida tarifária.
“Quando esses custos forem anunciados vai ser uma bomba. Os consumidores não conhecem o tamanho desse rombo. O sistema elétrico brasileiro está caminhando para ter a energia mais cara do mundo, uma situação completamente esdrúxula se comparada à de países com uma matriz semelhante à nossa”, afirma D’Araújo.
Sem luz no fim do túnel
Além dos custos que serão repassados à tarifa de energia dos consumidores nos próximos cinco anos, o setor acumula uma conta bilionária que ainda não tem provisionamento definido. A experiência acumulada nos últimos dois anos indica que ela deve recair sobre o bolso do consumidor
Indenizações de ativos de transmissão existentes até 2000
Pela proposta original da MP 579, os ativos de transmissão anteriores ao ano 2000 ainda não amortizados não seriam indenizados, mas o governo voltou atrás e decidiu indenizar as transmissoras. O acordo prevê que as empresas enviem ao governo laudos técnicos com estimativas do valor a ser indenizado. Até o momento, o saldo das reivindicações dessas empresas, que exclui Furnas, por exemplo, soma R$ 17,9 bilhões.TOTAL ACUMULADO DA CONTA DO SETOR ELéTRICO
é a soma do passivo do setor elétrico com custos que, em sua grande maioria, não tem recursos previstos para pagamento. Se essa conta bilionária fosse repassada de uma só vez às tarifas de energia, os consumidores teriam um aumento médio de 33% na conta de luz. O mais provável é que esse valor seja repassado como encargo parcela do na tarifa de energia.