A queda nos juros para empresas e famílias será gradual após a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de reduzir a taxa Selic de 13,75% para 13,25% ao ano.
Foi o primeiro corte em três anos, motivado pela melhora no quadro inflacionário e a queda nas expectativas da inflação em prazos mais longos, após decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN), em junho, em manter a meta da inflação em 3%.
Segundo Claudio Shikida, professor do Ibmec Belo Horizonte e especialista do Instituto Millenium, as mudanças na Selic demoram tempo para surtir efeito. Os impactos mais fortes sobre a economia podem levar de seis a nove meses.
“Como a Selic tem influência significativa sobre o custo de captação [quanto o banco paga para levantar dinheiro], que por sua vez responde por cerca de um terço do custo total de crédito, é razoável imaginar que o início do ciclo de redução da Selic pode contribuir ao longo dos próximos trimestres para uma redução do custo de crédito”, ressalta o economista-chefe da Porto Asset, José Pena.
Outro possível efeito, segundo Pena, é uma redução na inadimplência – cujo risco é parcela importante na composição do juro que é cobrado do cliente.
Bancos começam a fazer cortes pontuais em suas taxas de juro
Bancos já começaram a promover cortes pontuais nas taxas de juro de suas linhas de crédito. Um dos primeiros movimentos foi feito pela Caixa que, logo após o anúncio do Copom, promoveu uma redução nas taxas cobradas do consignado para beneficiários e pensionistas do INSS. Ela caiu de 1,74% para 1,70% ao mês.
O economista-chefe do Nomad e professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), Danilo Igliori, aponta que a redução nas taxas de juro deve começar nas modalidades que apresentam garantias, como empréstimos consignados e financiamentos de imóveis e carros.
Linhas emergenciais, como cartão de crédito e cheque especial, devem ser as últimas a terem as taxas reduzidas, diz ele. Em junho, segundo dados do Banco Central, a taxa média do rotativo do cartão de crédito para as pessoas físicas estava, em junho, em 15,04% ao mês. A do cheque, em 7,33%.
A Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac) calcula que, com a nova taxa Selic, uma pessoa que comprar uma geladeira de R$ 2 mil e dividir o valor em 12 vezes pagará parcelas de R$ 402,76 – antes do corte, o valor seria de R$ 405,91.
Os bancos também devem usar a redução de juros nas linhas de crédito como instrumento de marketing, diz o economista-chefe da Nomad. Ele aponta que os juros menores são uma das armas para tentar captar clientes em meio a um cenário de concorrência bancária crescente.
Inadimplência e "efeito Americanas" devem atrasar efeito da queda da Selic
Dois fatores que devem dificultar uma redução mais acelerada dos juros para o tomador, segundo Igliori, são o elevado endividamento das famílias e das empresas e os efeitos sobre o crédito corporativo causados pelo episódio das Lojas Americanas, cujo rombo supera os R$ 40 bilhões, segundo auditores.
“Talvez o fator mais importante [para os juros elevados] seja mesmo a inadimplência, que é bem maior entre pessoas físicas do que jurídicas, o que inclusive explica o apelo eleitoral que propostas de redução de inadimplência têm sobre a maioria dos eleitores”, diz Shikida.
Até junho, antes do lançamento do programa Desenrola de renegociação de dívidas, 71,45 milhões de pessoas físicas estavam com o “nome sujo”, segundo a Serasa. Isto equivale a 43,78% da população adulta. Mais de 6,5 milhões de empresas, principalmente de micro e pequeno porte, enfrentavam restrições ao crédito.
O especialista do Millenium também se preocupa com a possibilidade de que alguma mudança inesperada no cenário nacional ou internacional contribua para a interrupção do ciclo da queda nos juros. “Por exemplo, caso o arcabouço fiscal se revele apenas retórica ou se houver algum outro desdobramento indesejado da agressão iniciada pelo governo russo contra o povo ucraniano”, afirma ele.
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