Companhias estatais e do setor privado com planos para abertura de capital engavetados há meses, diante da ‘paradeira’ da economia brasileira, estão começando a se movimentar para uma eventual janela que possa se abrir ainda neste ano.
O otimismo, ainda muito moderado, tende a ganhar força após os ajustes fiscais serem endereçados pelo governo de Michel Temer e se for confirmado o impeachment da presidente afastada Dilma Roussef, o que pode ocorrer no próximo mês. Com isso, a volta das férias de verão do Hemisfério Norte vem sendo aguardada com ansiedade, uma vez que a percepção é de que está em curso uma inversão do fluxo de capital, desta vez de volta ao país.
As primeiras a estrear no mercado, após um período de mais de um ano de seca na Bolsa brasileira, devem ser as empresas com participação do governo, com maiores chances para o IRB Brasil Re. Isso pode acontecer já em outubro, uma vez que a empresa já está preparada desde o ano passado para uma oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês). Até lá, são esperadas ainda ofertas subsequentes (follow-ons), como a da Energisa, que já está na rua.
Com sinalizações de que o fluxo de capital estrangeiro deve retomar a rota ao Brasil, a fila de companhias estatais que podem abrir capital no curto e médio prazos tende a crescer, visto que a indicação do governo é de que haverá privatizações, ainda mais em um cenário em que é necessário amenizar o bilionário déficit fiscal previsto.
Além do IRB, a Caixa Seguridade está em compasso de espera, mas não está descartado que ela venha a mercado em dezembro ou início do ano que vem, com os dados do terceiro trimestre deste ano. Isso depende, no entanto, de serem vencidas as negociações que vêm desde o ano passado com sua sócia, a francesa CNP Assurance, conforme fontes.
Janela
Um advogado que estrutura IPOs afirma que a movimentação por parte das companhias já começou e que a surpresa vem sendo as empresas privadas, que estão reavaliando planos para irem captar no mercado, após meses sem que essa alternativa fosse considerada. No entanto, segundo ele, ainda não há confiança suficiente para garantir que essas ofertas poderão ocorrer ainda neste ano, dado o cenário de incerteza.
A elevada demanda pela oferta da Energisa, segundo fontes, contribui para as expectativas positivas em relação a uma abertura de janela em outubro. No caso da empresa de energia, o follow-on é, na prática, classificado como um re-IPO, visto que a empresa tem baixíssima liquidez no mercado atualmente. Mas especialistas apontam que esse movimento precisa ser analisado com cautela, já que o setor energético na Bolsa brasileira vem se diferenciando nas últimas semanas, com as empresas apresentando forte valorização e com as expectativas em alta em relação ao setor.
Outras companhias que mostraram resiliência também poderão ter espaço para uma emissão de ações, segundo o advogado sócio do escritório Mattos Filho da área de Mercado de Capitais, Jean Marcel Arakawa. “Não só aquelas com resiliência mas algumas com perspectiva de crescimento, diante do reaquecimento da economia”, afirma.
Condicionantes
Apesar desses primeiros sinais em vista, Arakawa afirma que além da confirmação do impeachment da presidente afastada Dilma Roussef, uma janela também depende do início da aprovação e implementação das medidas de ajuste nas contas públicas, procedimento que vem sendo aguardado com ansiedade pelo mercado desde o início do governo interino. “Para esse mercado efetivamente andar, precisamos de um cenário mais claro”, diz o advogado.
Apesar de ainda haver incerteza no radar, uma fonte de um banco de investimento disse que de três meses para cá o investidor estrangeiro voltou a querer saber sobre as oportunidades de investimento no Brasil e que a indicação é de que o fluxo de entrada fique mais intenso nos próximos meses, ainda mais com o cenário externo de pano de fundo, com países com juro negativo e ainda com as incertezas geradas com o Brexit – saída do Reino Unido da União Europeia. Historicamente, as ofertas de ações no Brasil são sustentadas pelo apetite do investidor estrangeiro, que acaba ficando com uma fatia de cerca de 70% do total.
À princípio, além das companhias estatais, que têm pressa para ir a mercado dada a necessidade da União levantar capital para ajudar a minimizar o rombo das contas públicas, empresas que em algum momento ingressaram com pedido de registro de oferta na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) – o que abriria o leque para dezenas de companhias – são candidatas a tentar uma oferta mais uma vez.
Ressaca
A despeito da enorme lista de empresas que chegaram a pedir o registro de companhia aberta à CVM ou que até arquivaram o pedido de oferta, algumas delas buscaram uma alternativa ao IPO, como a venda de uma fatia do negócio para um fundo de private equity, por exemplo. Já outras que ainda precisam de capitalização estão vivendo a ressaca da longa crise econômica no Brasil que ainda não chegou ao fim, o que vem se refletindo na plena deterioração dos números dos demonstrativos financeiros, tornando mais difícil a venda da empresa em uma eventual abertura de capital.
Uma fonte de mercado disse que as empresas que não tiveram um desempenho muito bom no primeiro semestre do ano tendem a esperar os dados do ano fechado para tentarem uma oferta, que ficaria, dessa forma, para o ano que vem.
Oferta
Marcos Ribeiro, da área de M&A do escritório Stocche Forbes, lembra que a valorização do Ibovespa vem abrindo mais espaço para que alguma emissão de ações aconteça, visto que esse movimento diminui a concorrência de uma nova emissão com uma ação com múltiplo atrativo. “Há na geladeira algumas operações e as empresas começaram a se movimentar”, afirma Ribeiro.
Há mais de um ano a Bolsa brasileira não é palco de nenhum IPO, sendo o último em junho de 2015, da Par Corretora. Em 2014, apenas um IPO também movimentou o mercado, a da empresa do setor veterinário Ourofino.
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