O governo Kirchner tenta abafar as preocupações com a inflação apresentando dados de crescimento da economia, que avança num ritmo chinês alavancada, principalmente, pelo alto preço da soja. A Casa Rosada também afirma que o país vive uma explosão de consumo, e aponta o volume recorde de vendas de automóveis no mercado doméstico, além de demonstrar que protege o país com a manutenção de grandes reservas internacionais.
"A Argentina está num momento econômico formidável", disse, em entrevista recente a uma emissora de rádio, o ministro do Interior, Florencio Randazzo. Para muitos economistas, entretanto, isso é apenas parte do problema. O consumo doméstico está ultrapassando os limites da capacidade produtiva da Argentina e gerando inflação. O governo não inspira confiança para impulsionar investimentos e, por consequência, impede o aumento da oferta. Por fim, dizem os analistas, ao interferir nas estatísticas econômicas, a administração Kirchner criou um ambiente no qual fornecedores e produtores operam desnorteados pela falta de números confiáveis dessa maneira, também sentem-se livres para reajustar preços quando bem entendem.
Ilusão
Os aumentos salariais têm sido maiores do que 20% ao ano, mas nem sempre conseguem acompanhar o preço dos alimentos. Em 2010, os argentinos compraram menos bebidas, frutas e vegetais, um sinal de que a inflação já está fazendo suas vítimas, diz o ex-presidente do BC argentino Martín Redrado. "As pessoas viviam sob uma ilusão monetária que começou a ser desfeita, uma vez que os reajustes dos salários não permitem a compra da comida necessária", diz.
Não há dúvida de que os argentinos continuam comprando, mas a prazo eles antecipam a compra de carros, eletrodomésticos e televisores com medo de os produtos ficarem mais caros. O crescimento anual do endividamento em cartões do país foi de 45% em novembro passado, contra 20% no período entre 2008 e 2009, diz o economista Esteban Fernández Medrano, da consultoria MacroVision. Ainda assim, a Argentina tem a menor proporção da América Latina de dívidas pessoais em relação ao Produto Interno Bruto: entre 10% e 20%, comparados a cerca de 40% no Brasil e de 65% a 70% no Chile. "As pessoas não fazem mais poupança", disse Mercedes Fontao, 31 anos, ao fazer compras no shopping Alto Avellaneda. "Elas gastam o que têm e vivem para o momento, enquanto criam dívidas pesadas no cartão para continuar comprando."
Alguns ainda tentam economizar. No balneário argentino de Pinamar, o movimento dos restaurantes diminuiu neste verão na medida em que mais pessoas preferiram fazer refeições em casa. Carlos Bermejo, 74 anos, conta que procura as pechinchas e aproveita o desconto de 15% que um supermercado local oferece a quem faz compras no cartão de débito às quartas-feiras. Ainda assim, diz, ele precisa fazer dívidas no cartão de crédito para atravessar o mês. "Eu vivi durante a inflação muitas vezes", lembra Bermejo, que tem uma casa de praia em Pinamar. "Mas os mais jovens não têm essa experiência. Eles se endividam pensando que podem vencer a inflação. Só que você nunca vence a inflação."
-
Escola Sem Partido: como Olavo de Carvalho, direita e STF influenciaram o fim do movimento
-
Igreja e direita francesa criticam cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos
-
“Quando Maduro fala é crítica, quando eu falo é crime?”, diz Bolsonaro após ditador questionar urnas
-
Dois cientistas católicos históricos que vale a pena conhecer
Reforma tributária promete simplificar impostos, mas Congresso tem nós a desatar
Índia cresce mais que a China: será a nova locomotiva do mundo?
Lula quer resgatar velha Petrobras para tocar projetos de interesse do governo
O que esperar do futuro da Petrobras nas mãos da nova presidente; ouça o podcast
Deixe sua opinião