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O desafio do Ministério da Fazenda de equilibrar as contas públicas este ano está sob ameaça com a crescente tensão entre o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Desde o fim do ano passado, uma série de atritos entre Executivo e Legislativo fizeram azedar a relação que outrora fora mais pacífica. Agora, o risco de ver avançar no Congresso as chamadas “pautas-bomba”, que podem fazer disparar os gastos da União, faz com que o governo se movimente em diversas frentes na tentativa de conter danos sobre o Orçamento.
Nesta segunda-feira (22), Lula cobrou publicamente que seus ministros entrem em campo para ajudar na articulação das pautas com o Congresso, citando nominalmente o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, e os titulares da Fazenda, Fernando Haddad, da Casa Civil, Rui Costa, e do Desenvolvimento e Assistência Social, Wellington Dias.
“Isso significa que o Alckmin tem que ser mais ágil, tem que conversar mais. O Haddad, ao invés de ler um livro, tem que perder algumas horas conversando no Senado e na Câmara. O Wellington, o Rui Costa, passar a maior parte do tempo conversando com bancada A, com bancada B”, disse o presidente.
Nesta semana, o próprio Lula deve se encontrar com Lira e Pacheco para tratar das “pautas-bomba” e de outros temas que tensionam a relação entre os Poderes. “A articulação das duas Casas está arrumada, mas é sempre bom requisitar a participação do presidente Lula nas negociações”, disse Randolfe Rodrigues à GloboNews nesta segunda.
Haddad, que estava em Washington, nos Estados Unidos, já havia antecipado o voo de retorno ao Brasil na última quinta-feira (18), em razão das negociações do governo com o Congresso, segundo a assessoria de comunicação do Ministério da Fazenda.
Na sexta (19), Lula convocou uma reunião de emergência com Rui Costa e os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social), além dos líderes do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), na Câmara, José Guimarães (PT-CE), e no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP). O objetivo seria tratar justamente da relação do governo com as instâncias parlamentares.
O clima de conflito ocorre notadamente com o presidente da Câmara, que, no último dia 11, classificou o ministro de Relações Institucionais como “desafeto pessoal” e “incompetente”. Mas a edição da medida provisória (MP) 1.202, que estabeleceu a extinção gradual da desoneração da folha de pagamento de municípios e de empresas de 17 setores, ainda em dezembro, já havia criado uma indisposição também do presidente do Senado com o governo.
Propostas nas mãos de Lira e Pacheco podem gerar impacto de até R$ 152,2 bilhões para governo
Entre as propostas que dependem de Lira e Pacheco para avançar, estão matérias que, no limite, podem criar um rombo de até R$ 152,2 bilhões nas contas da União.
A primeira batalha que o governo enfrenta ocorre nesta quarta-feira (24), quando uma sessão conjunta do Congresso analisa vetos presidenciais. Um deles é o veto feito por Lula na Lei Orçamentária Anual (LOA) a R$ 5,6 bilhões em emendas parlamentares de comissão.
À época, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse que a decisão foi tomada em razão da necessidade de adequação orçamentária a uma inflação que se verificou menor, o que reduziu a margem de gasto do governo.
Nesta segunda, à GloboNews, Randolfe Rodrigues, líder do governo no Congresso, disse que o governo está disposto a liberar parte do valor vetado em emendas para atender a reivindicações do Legislativo.
“Estamos construindo um acordo com o conjunto de vetos, são 32 vetos que nós devemos apreciar, inclusive remanescentes, desde o governo anterior, que estamos dispostos a enfrentar com o apoio de nossa base”, disse.
Curiosamente, uma proposta de iniciativa do próprio Rodrigues pode representar uma derrota para o governo e gerar impacto fiscal adicional de R$ 6,3 bilhões. Já aprovada no Senado, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 7/2018 prevê a incorporação na folha de pagamento do governo federal de até 50 mil servidores públicos que eram contratados dos antigos territórios federais de Rondônia, Amapá e Roraima, transformados em unidades federativas nos anos 1980.
Encaminhada à Câmara em setembro do ano passado, a PEC aguarda despacho de Lira para instalação de comissão especial para análise do texto. No último dia 9, o deputado Fernando Monteiro (PP-PE), aliado do presidente da Casa, apresentou requerimento solicitando urgência na criação do colegiado.
A matéria que mais impactaria os cofres públicos é a chamada PEC 10/2023, ou PEC do Quinquênio – também apelidada de “PEC dos privilégios” ou “PEC dos penduricalhos”. O texto é patrocinado por Pacheco e recria um adicional de 5% a cada cinco anos de exercício da função para membros do Judiciário e do Ministério Público.
Um levantamento do Centro de Liderança Pública apontou que o impacto da proposta seria de R$ 1,8 bilhão somente em 2024, para beneficiar cerca de 32 mil funcionários públicos. Mas o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), disse, no dia da aprovação da proposição na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que o impacto poderia chegar a R$ 42 bilhões por ano a depender do número de carreiras públicas beneficiadas.
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Segundo o jornal O Estado de S.Paulo, o governo negocia com Pacheco e com o relator da PEC, Eduardo Gomes (PL-TO), a possibilidade de alterar o texto da proposta no plenário da Casa, restringindo as categorias beneficiadas pelo adicional por tempo de serviço. A proposta inicia nesta semana o ciclo de cinco sessões de debates antes de ser votada no plenário.
A equipe econômica tem especial interesse ainda nas propostas que visam extinguir gradualmente o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) (PL 1.026/2024), a desoneração da folha de 17 setores (PL 493/2024) e a de municípios de até 156,2 mil habitantes (1.027/2024).
Nesses casos, o objetivo do governo é ver os textos aprovados, de modo a reduzir a renúncia fiscal recorrente com a manutenção das medidas. A equipe de análise macroeconômica da corretora Warren Rena estima que eventual rejeição das propostas implicaria em perda de receita de R$ 25,6 bilhões para a União em 2024.
Desse montante, R$ 16 bilhões viriam da necessidade de compensação no caso da manutenção da desoneração da folha de empresas (R$ 12 bilhões) e de municípios (R$ 4 bilhões).
Outra pauta-bomba para o governo é a PEC 15/2021, que permite o parcelamento de dívidas previdenciárias municipais em 20 anos e concede desconto de 60% em multas, 80% em juros e 50% em honorários.
Segundo cálculos do analista Gabriel Leal de Barros, da Ryo Asset, caso o projeto se torne lei, a União pode perder R$ 133 bilhões em duas décadas, ou R$ 6,7 bilhões por ano. A PEC ainda precisa ser apreciada por uma comissão especial, que também aguarda a decisão de Lira para ser criada.
Está no radar do Executivo ainda o Projeto de Lei Complementar (PLP) 108/2021, que aumenta o teto de faturamento para uma pessoa jurídica se enquadrar nas categorias de Simples Nacional e Microempreendedor Individual (MEI).
A proposta eleva o faturamento máximo do MEI de R$ 81 mil para R$ 144 mil por ano. Para microempresas, o valor subiria de R$ 360 mil para R$ 847 mil. Já as empresas de pequeno porte teriam seu limite aumentado de R$ 4,8 milhões para R$ 8,7 milhões.
De acordo com estimativa da Receita Federal feita no ano passado, a ampliação resultaria em uma renúncia fiscal de R$ 66 bilhões por ano em recursos que são administrados pelo órgão e partilhados com entes subnacionais.
Apesar da pressão de setores econômicos para que o texto seja aprovado nesse formato, o governo trabalha para uma mudança apenas para o MEI, que teria a atualização da tabela de faturamento e poderia contratar até dois empregados. O texto aguarda apenas a decisão de Lira para entrar em pauta.
Além desses, há projetos em tramitação no Congresso defendidos por integrantes do próprio governo que podem impactar as contas do Executivo. Uma delas é PEC 55/2023, que prevê o aumento gradual, para até 2% do Produto Interno Bruto (PIB), da fatia do Orçamento destinado às Forças Armadas. Atualmente, o orçamento da Defesa é de 1,1% do PIB.
Na última quarta-feira (17), o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, foi à Câmara dos Deputados pedir apoio dos parlamentares para a aprovação do texto. A proposta não tem o aval do Ministério da Fazenda.
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