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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ainda não convenceu analistas e investidores da consistência do seu plano para reequilibrar o caixa federal e acelerar o PIB.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ainda não convenceu analistas e investidores da consistência do seu plano para reequilibrar o caixa federal e acelerar o PIB.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Prestes a completar um mês no comando da economia brasileira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ainda não convenceu analistas e investidores da consistência do seu plano para reequilibrar o caixa federal e acelerar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Medidas adotadas até agora têm ares de improviso, com foco principalmente no aumento de receitas para conter parte do avanço do déficit público e sem informações claras sobre a proposta de novo arcabouço fiscal, a ser enviada ao Congresso Nacional.

Em 17 de janeiro, durante a sua participação no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, Haddad afirmou a jornalistas que enviará “no máximo até abril”, a regra que deverá substituir o teto de gastos – hoje principal âncora fiscal, que limita a expansão das despesas do governo à inflação acumulada no ano anterior.

O prazo citado pelo ministro é menor que o exigido pela Emenda Constitucional 126/2022, que nasceu da PEC da Transição, apelidada de PEC fura-teto ou PEC da gastança, autorizando gastos extras de cerca de R$ 200 bilhões em 2023.

Os desafios de Haddad para cumprir as promessas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na economia vão desde o elevado grau de rigidez das despesas, passando por pressões de aliados políticos, cenários incertos e cautela de agentes econômicos. O discurso eleitoral de dar credibilidade à macroeconomia, desconcentrar renda e garantir sustentabilidade fiscal esbarra também na persistência de Lula em atacar esforços para conter gastos e em ameaças de retrocessos nas reformas aprovadas a partir da gestão Temer.

Em Davos, Haddad repetiu o bordão de Lula de que o esforço por equilíbrio fiscal “não é um fim em si mesmo”, preferindo dar ênfase a agendas como investimento em tecnologia, política pró-reindustrialização e apoio à matriz energética renovável. Para o mercado, as iniciativas assinaladas sinalizam apenas mais intervencionismo. Em paralelo, o governo busca acordos para negócios com os principais parceiros comerciais do país, sobretudo União Europeia, China e Argentina, e tenta emparedar o independente Banco Central (BC) sobre os juros.

Nesse contexto, analistas do mercado financeiro vêm elevando as projeções para a inflação em 2023 e 2024, conforme o relatório Focus, do Banco Central. A estimativa para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para este ano subiu pela sétima vez seguida e agora é de 5,74%. A previsão da taxa de juros básica (Selic) ao fim deste ano foi mantida em 12,5%, um tanto acima do nível projetado apenas cinco meses atrás (11,5%), o que indica que o mercado vê menos espaço para cortes na taxa, atualmente em 13,75%.

Lula critica busca por equilíbrio fiscal, Haddad tenta reverter expectativas ruins

As dúvidas sobre o compromisso do governo com o equilíbrio fiscal estão no ar desde a vitória de Lula nas eleições. Em novembro, ele disse que o teto de gastos era a tentativa de “desmontar tudo que é da área social”. Mais adiante, o presidente chamou a regra fiscal de “imbecilidade”. As falas dele se somaram às de ministros que apontam supostos retrocessos na Previdência, nas relações trabalhistas e no marco do saneamento, e às declarações sugerindo uso político de bancos públicos e empresas estatais. Haddad tenta abrir caminhos nesse contexto difícil.

Para reverter expectativas ruins, o ministro da Fazenda anunciou no último dia 12 um pacote com o qual pretende reduzir o déficit primário deste ano, previsto originalmente em R$ 231,5 bilhões. As maiores apostas estão em medidas para elevar as chances de vitória do Fisco em disputas no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), reoneração de algumas alíquotas do PIS/Cofins e renegociação de dívidas de pessoas físicas e empresas de pequeno porte. Também está na mesa o fim da desoneração de combustíveis, marcado para o início de março – que, se confirmado, terá impacto inflacionário.

O economista Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do BC, avalia que as medidas anunciadas por Haddad devem mesmo reduzir o déficit primário e desacelerar o crescimento da dívida pública. Mas tem dúvidas sobre o cumprimento da meta de equilíbrio fiscal a partir de 2024. A favor do ministro estaria a proximidade dele com Lula, a cooperação da ministra do Planejamento, Simone Tebet, e o papel estabilizador da independência da autoridade monetária. Por outro lado, as seguidas declarações de Lula contra o equilíbrio fiscal mantêm a incerteza em níveis elevados.

Figueiredo e outros especialistas consideram que, tendo a dívida mais alta entre países emergentes, o Brasil deveria perseguir um superávit primário anual de 1,5% a 2,5% do PIB. Mas o que se espera é déficit. Até a eleição de Lula, a mediana das projeções do mercado apontava para um saldo negativo equivalente a 0,5% do PIB em 2023. O número foi crescendo gradualmente até chegar a 1,2% do PIB, e mais recentemente recuou para 1,1%. Essa é também a projeção de déficit primário da Instituição Fiscal Independente (IFI).

O pacote de Haddad chegou a ser recebido nos mercados como gesto inaugural na direção da sustentabilidade fiscal. Há ainda a promessa de outras iniciativas, como a retomada da reforma tributária centrada nos impostos sobre o consumo, a revisão dos beneficiários de programas sociais, além da nova regra fiscal.

Preocupado com o impacto nas contas públicas, o governo abandonou – ao menos por enquanto – a ideia de um aumento adicional no salário mínimo ainda neste ano. Por outro lado, a reoneração dos combustíveis, que deveria ter ocorrido em 1.º de janeiro, foi adiada por questões políticas.

Anunciado para integrar o primeiro escalão do Ministério da Fazenda, o economista Bernard Appy foi nomeado apenas recentemente para o cargo de secretário extraordinário da reforma tributária. Os líderes do governo no Congresso buscam base parlamentar sólida para votar a MP do Carf até maio. Na esteira viria o novo arcabouço fiscal, a ser aprovado até junho. E a prometida mudança do Imposto de Renda ficaria só para o segundo semestre.

A programação de reformas, contudo, depende da disposição dos líderes partidários e das eleições das Mesas da Câmara e do Senado, no próximo dia 1.º. “Colocar os ricos no IR”, como quer Lula, reduzindo a chance de desconto das despesas médicas, para em compensação aliviar contribuintes de renda menor, tem um impacto fiscal grande demais para ser negociado este ano, de até R$ 100 bilhões.

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