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Delivery

As startups que resistem à fome de aquisições do iFood

Escritório do iFood. | Luiza Florenzano/Divulgação
Escritório do iFood. (Foto: Luiza Florenzano/Divulgação)

Em julho de 2018, o iFood comprou por um valor não informado a operação brasileira da Pedidos Já, um dos aplicativos de delivery de restaurantes mais antigos do mercado. Foi a última de uma série de aquisições da empresa da Movile, custeadas por aportes milionários liderados pelo fundo sul-africano Naspers — o último e maior deles, no início de julho, de US$ 124 milhões.

O mercado de aplicativos de delivery tem revolucionado a forma de vender, comprar e entregar comida no Brasil. Essa revolução ocasionou, nos bastidores, uma movimentação de fusões e aquisições de marcas nativas digitais. O iFood acabou se destacando nesse processo de consolidação, crescendo graças a aquisições de rivais menores.

Em um setor que cobra, em média, 10% da venda dos restaurantes de sua base, a acomodação não existe, segundo a empresa. “As aquisições feitas ao longo dos anos ajudaram a ampliar a base de restaurantes e clientes do iFood e a fortalecer o time de funcionários, mas não foram determinantes para explicar o sucesso da empresa. Nos últimos anos, temos visto a entrada de diversos competidores no país, com diferentes modelos de negócios, o que comprova que o Brasil ainda é um mercado extremamente atrativo e com um grande potencial de desenvolvimento”, afirma Alex Anton, diretor de fusões e aquisições do iFood.

As startups que não cederam à sede do iFood

O iFood adquiriu startups importantes do setor nos últimos anos, muitas delas com forte presença em regiões específicas do país. Além do Pedidos Já, entraram no cardápio do iFood as marcas SpoonRocket, Netcook, Central do Delivery e Apetitar. Algumas poucas ofertas de aquisição, porém, foram rejeitadas por startups que conquistaram relevância no interior do Brasil, em cidades onde o iFood chegou depois ou não conseguiu o mesmo sucesso alcançado em capitais e centros maiores. Elas resistem aos avanços da rival maior e à entrada de players internacionais, como a espanhola Glovo e a colombiana Rappi. (Embora o delivery de refeições não seja o único serviço prestado por ambas, ele representa uma fatia considerável das vendas.)

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No momento, restam apenas dois players nacionais independentes de maior porte, com atuação em mais de cem cidades: o Aiqfome, com sede em Maringá (PR), e o Delivery Much, de Santa Maria (RS). As duas afirmam receberem regularmente propostas para vender seus negócios, mas não contam de quem nem revelam valores. Questionado, o iFood disse que não comenta estratégias de negócios.

Aiqfome e Delivery Much apostam fortemente no licenciamento do serviço, o que lhes permite crescer mais rapidamente. Neste caso, o franqueado ou licenciado fica com 5% da venda e o app, com os outros 5%. O iFood não utiliza esse modelo.

O Aiqfome está focado em cidades pequenas do interior do Brasil. A startup está presente em mais de 110 cidades de 13 estados brasileiros, com a meta de terminar 2018 em 200, além de ampliar o escopo para a entrada em cidades maiores, de 400 mil habitantes.

O custo para ser um licenciado do Aiqfome varia entre R$ 20 mil e R$ 60 mil e o empreendedor só precisa ir atrás dos restaurantes, o que tem sido cada vez mais fácil e interessante para o setor alimentício. “O suporte a restaurante e usuários final é feito pelo Aiqfome, em um centro de atendimento via chat ou telefone em Maringá que emprega 50 pessoas. Apenas 1% dos pedidos precisa de ajuda. O retorno ao empreendedor ocorre entre seis e 12 meses. Temos nosso diferencial. Nossa proposta é criar uma modelo de negócio que atuem e gerem riqueza”, conta o CEO do Aiqfome, Igor Remigio.

A empresa trabalha com 70 empreendedores licenciados e mais 60 cidades em processo de abertura, com contratos já assinados. As transações superam os R$ 6 milhões de vendas mensais, com cerca de 250 mil pedidos por mês. A empresa tem 4.200 restaurantes em sua base.

A Delivery Much, de Santa Maria (RS), também trabalha com franquias, mas aposta em parcerias para avançar para outros setores, segundo o CEO e fundador Pedro Judacheski. “Nosso modelo de negócio é avançar nas cidades, por meio das franquias, e fazer parceria estratégicas com outros negócios. Vender soluções para parceiros, como meios de pagamentos.”

A Delivery Much tem hoje um projeto com a Coca-Cola Brasil para entender o consumo. “A indústria utiliza nossa expertise para se reinventar apoiado no comportamento do nosso consumidor”, conta.

Judacheski afirma que o desafio do setor é falar com consumidor offline que não acredita em plataformas digitais. “Nosso grande concorrente ainda é o telefone, por esse motivo é preciso se reinventar apoiado no comportamento do nosso consumidor, entendendo-o e nos aproximando. As pessoas estão mais abertas às experiências de consumo”, diz.

A empresa, que começou em 2011, emprega 68 pessoas e tem sua base de negócios em Florianópolis desde 2015, quando começou a expansão por meio de franquias em cidades de menor porte (a taxa de franquia vai de R$ 10 mil até R$ 30 mil).

Hoje, a Delivery Much atua em mais de 155 cidades de 20 estados, com a meta de chegar ao fim deste ano a 220 cidades, boa parte delas nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. As transações superam os R$ 10 milhões de vendas mensais, com cerca de 250 mil pedidos por mês, em 4 mil restaurantes parceiros.

O iFood lidera o mercado brasileiro em volume, com média de 8 milhões de pedidos por mês. A empresa mais próxima é a norte-americana UberEATS, com um volume de mais de 2 milhões de pedidos mensais, mas esse setor é ainda um mero coadjuvante no negócio do líder de app de transporte. A reportagem tentou contato com o UberEATS, sem sucesso.

Inovação constante

A base de clientes das startups de delivery funciona como uma espécie de laboratório de testes para abrir novos mercados. No mundo todo, elas fazem experimentos com pequenos segmentos da base de usuários para avaliar a recepção a novos serviços e recursos.

Segundo Renato Mendes, especialista em marketing digital e sócio da consultoria Orgânica, o setor influencia na experiência do consumidor, seja o final, a pessoa que pede uma pizza pelo celular, ou do estabelecimento comercial que vende a refeição. “Essas empresas nativas digitais têm a dinâmica da nova economia, na qual você tem de ser o primeiro a destruir seu modelo de negócio. É preciso inovar o tempo todo. Ao invés de esperar, muda-se o modelo de negócio porque se não fizer isso algum player vai chegar com novo modelo que vai te tirar do mercado.” Mendes explica que a base de clientes desses aplicativos serve para avançar em testes de novos produtos e serviços por usar comentários e informações dos clientes quase em tempo real.

O iFood segue essa filosofia. Alex Anton explica que a empresa segue “um propósito de revolucionar o mercado de alimentação criando soluções para sermos muito mais do que apenas um aplicativo” e cita como exemplos desse foco o iFood Shop, um marketplace de embalagens com preço 20% abaixo da média de mercado, lançado em 2017. “Com essa iniciativa, os restaurantes puderam economizar e os fornecedores puderam aumentar suas vendas, pois passaram a oferecer seus produtos para uma grande base”, diz.

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Outras iniciativas recentes do iFood para seus parceiros são o Meu Site, uma plataforma que permite ao restaurante criar site e aplicativo próprios, e uma participação na compra da Zoop, startup de pagamentos que viabilizou o lançamento de maquininhas de cartão do próprio iFood, o que deve aumentar as margens da operação. Para o usuário final, que faz os pedidos pelo app, a empresa anunciou em agosto de 2017 um botão físico para fazer pedidos.

“O iFood busca a consolidação e hegemonia. Tem um investidor grande, com recurso infinto e vai [se] consolidando por meio de fusões e aquisições. Tíquete do setor é baixo, mas é recorrente, com base de clientes enorme. É um ativo muito potente na nova economia, baseada nas experiências do consumidor”, comenta Mendes.

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