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O Tribunal de Contas da União (TCU) apontou diversas falhas na gestão da Indústrias Nucleares Brasileiras (INB), responsável por abastecer de combustível nuclear as usinas de Angra 1 e 2, em Angra dos Reis (RJ). A análise avaliou a sustentabilidade econômico-financeira da estatal e ações adotadas para arcar com as contas sem depender de recursos financeiros da União.
À Gazeta do Povo, a diretoria executiva do INB informou que está traçando novas estratégias para reduzir custos, captar novos negócios e otimizar a gestão de processos (veja mais abaixo). O Ministério de Minas e Energia (MME) também foi procurado pela reportagem, mas não respondeu aos questionamentos.
Segundo o relatório do ministro Benjamin Zymler, foram encontradas fragilidades como a “margem de receitas reduzida” para manutenção da autossuficiência, devido ao elevado comprometimento das receitas operacionais com gastos diversos. A auditoria apontou que 93% dos recursos operacionais são gastos com pagamento de pessoal, material, serviços de terceiros e outras despesas correntes.
A análise apontou ainda a inexistência de incentivos naturais e regulatórios para eficiência na produção do combustível nuclear, a falta de uma política comercial institucionalizada e a não implementação integral da gestão de riscos.
O TCU apontou que a INB corre o risco de ter as finanças afetadas por desconsiderar algumas despesas no fluxo de caixa projetado até 2028. Identificou, ainda, uma falha de mercado relativa ao custo do combustível nuclear, destacando o monopólio entre a INB e a Eletronuclear sem a adequada fiscalização e avaliação da eficiência na produção do combustível utilizado nas usinas.
A Eletronuclear é a estatal responsável pelo gerenciamento das usinas nucleares brasileiras de Angra dos Reis (RJ), que utilizam o combustível nuclear produzido pela INB – urânio – na cidade fluminense de Resende.
Como resultado da auditoria, o TCU recomendou que a INB e a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional S.A. (ENBPar) realizem um estudo de viabilidade para reduzir o comprometimento da receita operacional líquida da INB com gastos de pessoal, entre outras medidas. A INB foi aconselhada a desenvolver um plano para institucionalizar sua política comercial, incentivando a eficiência na produção do elemento combustível nuclear.
Zymler também apontou a necessidade de ações corretivas e planejamento estratégico para fortalecer a posição da empresa no setor nuclear.
"A nova diretoria da INB está envidando todos os esforços num trabalho de reestruturação das equipes como o fomento de um novo PDV, por exemplo, para redução dos custos com a folha de pagamento, redirecionamento estratégico com a institucionalização de uma área comercial na captação de novos negócios e a otimização na gestão dos seus processos internos para o dimensionamento inteligente da força de trabalho e com esses movimentos iniciais a empresa proporcionará o aumento da margem operacional", disse a diretoria-executiva da estatal em nota à Gazeta do Povo.
Estatais nucleares estão no vermelho em 2023
O levantamento mais recente da Secretaria de Orçamento Federal (SOF), publicado no último dia 22 de novembro, apontou que o conjunto das 22 empresas controladas pela União vai fechar o ano de 2023 com um rombo de US$ 4,5 bilhões.
As estatais relativas à produção e geração de energia nuclear estão entre as que dependem de recursos da União para se manterem em pé. A INB, segundo o relatório, chegou ao mês de setembro (último dado realizado) com um déficit de R$ 5,5 milhões (veja na íntegra na página 54). O valor, no entanto, é menor do que o da Eletronuclear, de R$ 1,4 bilhão, e da ENBPar, de R$ 642 milhões.
Embora a INB não tenha respondido ao contato da Gazeta do Povo, o relatório financeiro do segundo trimestre de 2023 (último disponível, veja aqui) aponta que a estatal não depende mais de recursos do Tesouro Nacional, e que “todas as despesas passaram a ser custeadas com recursos próprios da empresa”.
No entanto, o próprio relatório aponta que o principal comprador da estatal é a Eletronuclear, que não fez novas aquisições de combustível nuclear no primeiro semestre de 2023. Isso levou a uma queda de 92,2% na receita operacional líquida da INB na comparação com o mesmo período do ano passado – de R$ 441,5 milhões para R$ 34,5 milhões.
“A Receita de Venda de produção própria, no período de 01/01/2023 a 30/06/2023, representou 100% do total da receita”, relata o levantamento.
Segundo a empresa, o controle acionário da INB foi totalmente transferido da União para a ENBPar, que foi criada em 2022 para assumir as atividades da Eletrobras que não podiam ser privatizadas, como a Eletronuclear e a usina de Itaipu Binacional.
INB pretendia alcançar a autonomia em 2022
A autonomia orçamentária já era prevista no Mapa Estratégico 2017-2026 (veja na íntegra) da INB. O plano foi revisado no início de 2021 e previa alcançar autossuficiência a partir de 2022, gerando lucro operacional sustentável a partir de 2026.
“A continuidade no Orçamento Fiscal da União gera incertezas de ordem financeiras e orçamentárias que se refletem nas ações estratégicas, táticas e operacionais da empresa, podendo inviabilizar o cumprimento da principal missão da INB. Nesse sentido, buscar a independência em relação ao Tesouro Nacional, sem aporte da União, é de fundamental importância para a continuidade da produção e a busca de um crescimento sustentável para a INB”, disse a estatal no plano revisado.
Entre as previsões do plano para alcançar a autonomia estavam, ainda, o descomissionamento (recuperação ambiental de uma mina após o término da vida útil) das unidades de Caldas (MG), Buena (RJ) e São Paulo.
A reportagem foi atualizada após o envio da resposta da Indústrias Nucleares Brasileiras à Gazeta do Povo.
Atualizado em 08/12/2023 às 15:15