Com estoques elevados de importados, as empresas ainda relutam em repassar a alta do dólar para os preços. Mas a subida da moeda americana que atingiu o maior patamar em três anos já pressiona os valores dos contratos fechados pelo comércio e pela indústria. Se o dólar se mantiver no nível atual, os repasses nos preços podem começar a ser sentidos entre 30 e 90 dias.
O dólar alto afeta os preços de roupas, alimentos e bebidas importados e bens que dependem de insumos comprados no exterior, como eletroeletrônicos, além de pacotes de viagens internacionais.
Na importadora Porto a Porto, as novas encomendas já estão sendo fechadas pela nova cotação, segundo Pedro Corrêa de Oliveira, diretor-geral da empresa. "Por enquanto, o impacto negativo é na margem. Ainda não repassamos a alta do dólar. Mas, se a moeda continuar mais cara, o impacto no preço deve aparecer dentro de 30 dias", diz. A empresa, que comercializa produtos como conservas, azeites, bacalhau, doces, cervejas e vinhos, importa 100% dos cerca de mil itens do seu portfólio, que vêm principalmente do Chile, Argentina, Portugal, Espanha, Itália e França.
Para o empresário Christopher Oliver, proprietário das lojas de vestuário Capitollium, o câmbio deve ficar mais alto até o fim do ano. O impacto vai se dar principalmente na coleção primavera-verão, que começa a ser encomendada dentro de um mês. "A coleção outono-inverno já foi toda comprada, então não teremos problemas agora porque esse estoque está nas lojas. Mas a nova coleção, que chega ao mercado dentro de seis meses, vai ficar mais cara". Além do produto acabado, a alta da moeda deve provocar inflação também nos preços dos tecidos.
Os estoques elevados e a demanda fraca, porém, tendem a segurar alguns repasses em até seis meses, na avaliação de Julio Gomes de Almeida, professor da Unicamp e economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). "Os empresários vão aguardar para ver se o câmbio a R$ 1,90 veio para ficar. Isso os fará traçar novas estratégias, o que não é algo simples", diz.
Alguns setores já entraram em compasso de espera. Com cerca de 80% dos insumos atrelados ao dólar, a indústria química também vem adiando o fechamento de novos contratos para ver se a cotação pode ceder nas próximas semanas. Segundo Marcelo Melek, presidente do Sindicato das Indústrias Químicas e Farmacêuticas do Paraná, o estoque médio de importados do setor é de 28 dias, mas até agora não houve aumentos de preços produtos finais, até porque as vendas no mercado estão fracas. "Agora não há espaço para repasses", afirma. Estão sendo adiadas principalmente as encomendas da China, cujos contratos são fechados pela cotação do dia da compra.
Ainda não há consenso entre as empresas se o dólar vai estabilizar no seu atual patamar ou vai voltar cair até o fim do ano. O câmbio alto, porém, poderá ter efeitos positivos sobre o consumo, segundo alguns setores, apesar do seu efeito inflacionário. "Muita gente aproveitou o dólar baixo para viajar e comprar roupas lá fora. Agora, a tendência é que esse consumo seja interno, o que é bom", acrescenta Christopher Oliver, da Capitollium.