As incertezas sobre a política fiscal no governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dão margem para a manutenção do aperto monetário por mais tempo, o que levaria a uma redução menor da taxa básica de juros (Selic) em 2023. Essa é a interpretação do mercado financeiro: nas últimas quatro semanas, a mediana das expectativas para a Selic ao fim do próximo ano passou de 11,25% para 11,75%, de acordo com o boletim Focus, do Banco Central.
A tendência na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que termina nesta quarta-feira (7), segundo a ampla maioria dos economistas do mercado financeiro, é de manutenção da taxa no nível atual, de 13,75%. Para a equipe econômica do Bradesco, a decisão deve vir acompanhada de sinalização para "a manutenção futura desse patamar por um extenso período".
O Itaú aponta que, considerando o nível de incerteza elevado, particularmente em relação à trajetória das contas públicas, a expectativa é de que o comitê reforce a sinalização de manutenção da “postura vigilante da política monetária”.
O departamento econômico do banco acredita que o Banco Central não hesitará em retomar o ciclo de ajuste – isto é, aumento da taxa de juros – caso o processo de redução da inflação não transcorra como esperado ou que as expectativas de inflação se desancorem.
“O Banco Central irá manter a postura de abordar a importância e sua atenção no que diz ao controle da inflação, demonstrar sua atenção ao cenário macroeconômico, e, principalmente, a relevância na tomada de decisões do fiscal”, ressalta Jaqueline Benevides, analista de renda fixa da plataforma financeira TC.
Cortes na taxa Selic vão depender de boas escolhas na área fiscal
O Itaú vê cortes na taxa Selic apenas no terceiro trimestre de 2023, condicionadas a boas escolhas na área fiscal, e mesmo assim de forma não intensa.
“O desenrolar da PEC da Transição, o risco fiscal e as incertezas quanto às diretrizes econômicas geram incertezas no mercado”, diz o economista-chefe da Suno Research, Gustavo Sung.
A PEC, que tem votação no Senado marcada para esta quarta-feira, retira o Bolsa Família e outras despesas do teto de gastos, a principal âncora fiscal do país. Pelo texto aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) nesta terça-feira (6), o valor extra-teto caiu de R$ 175 bilhões para R$ 145 bilhões ao ano, após um acordo entre governo e oposição. E o prazo de vigência, que inicialmente era por tempo indeterminado, passou para dois anos.
O Itaú estima que um "waiver" (licença para gastar além do teto) de R$ 96 bilhões (ou 0,9% do Produto Interno Bruto) deixaria o gasto primário federal em 18,4% do PIB em 2023, mesmo nível projetado pelo governo para 2022.
Esse valor seria, de acordo com a instituição financeira, mais do que suficiente para financiar as principais promessas de campanha. Entre elas destacam-se a manutenção do auxílio Brasil em R$ 600, o adicional de R$ 150 para famílias com filhos até 6 anos, o aumento real do salário mínimo em 1,4% acima da inflação e o programa Farmácia Popular e outros gastos com saúde.
“Uma alta de gastos sem compensações pode gerar substancial elevação da dívida pública e malefícios para toda a sociedade. O equilíbrio fiscal não é incompatível com a responsabilidade social – pelo contrário, é condição necessária para ganhos sociais sustentáveis”, citam os economistas do banco.
Desenrolar de PEC e novo arcabouço fiscal podem afetar a taxa de juros
Segundo Sung, o grande problema que pode alterar o cenário para a taxa Selic é o desenrolar da PEC e a discussão sobre um novo arcabouço fiscal.
O impacto de uma política fiscal de mais gastos pode afetar o controle dos juros em duas dimensões, segundo ele: no curto prazo, tal política afeta os ânimos do mercado, influencia positivamente a atividade econômica e eleva as expectativas de inflação; no longo prazo, reduz a credibilidade do arcabouço fiscal do país.
“Um olho no equilíbrio fiscal é necessário para a autoridade monetária não tomar uma atitude mais tempestiva. Com uma deterioração do cenário, principalmente do inflacionário, o Banco Central terá de subir juros para cumprir seu objetivo de levar a inflação ao redor da meta”, cita o economista-chefe.
A ausência de um substituto para o teto de gastos, que Lula pretende abolir, também preocupa o mercado. “Não sabemos até agora qual instrumento o governo eleito vai propor e como essa substituição vai impactar as contas fiscais. Em suma, o cenário fiscal não é tão claro ao longo da nova administração. Novamente, nosso melhor palpite é que o governo eleito pode adotar uma abordagem prudente com uma solução que não comprometa as perspectivas de sustentabilidade da dívida pública”, apontam economistas do banco MUFG Brasil.
Na negociação para aprovação do texto da PEC na CCJ do Senado, nesta terça, o governo se comprometeu a apresentar ao Congresso dentro de oito meses uma proposta de um novo regime fiscal para substituir o teto de gastos.
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