A crise econômica internacional golpeou duramente os bancos de vários países do mundo. Quem mais sentiu o golpe foi o sistema financeiro americano, justamente onde a turbulência foi gerada e de onde se espalhou para os demais continentes.

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Segundo um levantamento feito pela consultoria Economatica a pedido do G1, em um ano, os principais bancos americanos tiveram recuo médio de 71% no seu valor de mercado – a soma do preço de suas ações nas bolsas de valores –, perdendo US$ 609 bilhões. O valor é cinco vezes mais alto que o recuo dos maiores bancos brasileiros no mesmo período.

De acordo com a pesquisa, entre março de 2008 – antes da fase mais aguda da crise financeira – e março de 2009, os dez maiores bancos americanos da época viram a soma de seus valores cair de US$ 864 bilhões para US$ 255 bilhões, um recuo de 71%, ou US$ 609 bilhões.

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Já no Brasil, a soma dos dez maiores bancos recuou de US$ 215 bilhões para US$ 94 bilhões, com queda de 57%, o equivalente a US$ 120 bilhões a menos. A diferença no tamanho das perdas aproximou os sistemas financeiros dos dois países: um ano atrás, o conjunto dos principais bancos brasileiros valia 25% do seu similar americano; hoje, essa parcela é de 37%.

Motivos diferentes

Segundo especialistas, existe uma diferença importante entre os motivos das perdas de valor nos dois países.

"Os bancos americanos perderam muito porque estavam contaminados por papéis ‘tóxicos’ (títulos sem valor) em suas carteiras. À medida que o tamanho dessa montanha de papéis foi ficando evidente, a queda de rentabilidade das instituições ficou gigantesca e as ações desses bancos foram mergulhando nas bolsas", explica Carlos Coradi, presidente da consultoria EFC.

"Os bancos dos EUA caíram muito porque a crise começou por lá, devido aos papéis ‘podres’. A partir daí, o valor de mercado dessas empresas sofreu uma deterioração muito grande devido à perspectiva de aumento na inadimplência, da deterioração do mercado de capitais e da perda dos ativos", concorda o professor de finanças do Ibmec São Paulo, Domingos Rodrigues Pandeló Júnior.

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Mergulho brasileiro

No caso do Brasil, os especialistas apontam que a conversão para o dólar no preço das ações negociadas no Brasil contribuiu para o recuo, uma vez que o real perdeu 44% frente à divisa americana no período.

Se fosse feita a correção cambial por esse percentual, a soma dos dez principais bancos brasileiros seria hoje de US$ 189 bilhões, e o prejuízo em relação à março de 2008 teria sido de 12%, com perda de US$ 25 bilhões. Assim, eles valeriam hoje 74% dos principais bancos americanos.

Outro motivo apontado para o recuo dos bancos brasileiros é a queda de 43% registrada nos últimos 12 meses na Bovespa, a Bolsa de Valores de São Paulo. "A crise fez com que os investidores internacionais retirassem dinheiro da bolsa, porque precisavam tapar os buracos lá fora. E as ações dos bancos desabaram junto com as dos outros setores", avalia Coradi.

Ranking embaralhado

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As quedas nos valores e as diversas fusões e compras acontecidas no setor também provocaram o "embaralhamento" no ranking dos maiores bancos. No caso americano, tanto o banco com maior valor há um ano atrás quanto o terceiro colocado – Bank of America e Citigroup, respectivamente – desabaram na lista.

A maior queda foi no valor dos papéis do Citigroup, que recuaram 95% no período, seguido pelo Bank of America, que perdeu 87%. A liderança ficou nas mãos do JPMorgan Chase. Nenhuma das instituições americanas teve ganho no valor das ações ao longo desse tempo.

No Brasil também houve mudança na liderança. Com a fusão com o Unibanco, o Itaú ultrapassou o Bradesco e se tornou a instituição financeira brasileira mais valorizada. Além disso, o Santander cresceu, depois de comprar o Banco Real. Por aqui, a maior queda foi registrada pelo Daycoval (76%), com o Bicbanco em segundo, próximo à essa marca (recuo de 72%).

Apenas duas instituições tiveram aumento no valor: Nossa Caixa (98%), com a valorização de suas ações na esteira de sua compra pelo Banco do Brasil – a instituição ainda não foi oficialmente incorporada – e Santander, com elevação de 4%.

Fotografia bancária

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Antes da crise, o Brasil tinha dois bancos que poderiam se colocar entre os dez maiores dos EUA; hoje, são quatro. O banco brasileiro de maior valor há um ano, o Bradesco, vale hoje mais que o maior banco americano de um ano atrás, o Bank of America. Além disso, o banco brasileiro mais valorizado atualmente (Itau/Unibanco) representa mais de cinco vezes o Citigroup, que era o terceiro dos EUA no ano passado.

"Mesmo sendo uma fotografia do momento, existem fundamentos para isso. Foi uma tragédia a trajetória da Citigroup, um dos mais golpeados pela crise. Já o Itaú é o banco mais rentável do Brasil há vários anos", analisa Coradi, da EFC.

Pandeló, do Ibmec, diz que "às vezes é difícil achar nos fundamentos os motivos dessa oscilação nos preços. Com o pânico dos últimos meses, o mercado perdeu totalmente o ponto entre os dados de uma empresa e o valor de suas ações".

Quebradeira

De acordo com um relatório da consultoria Management & Excellence (M&A), na média, os bancos brasileiros estão mais avançados do que seus similares americanos na prevenção aos riscos. Isso se traduz, por outro lado, em menor volume de empréstimos. Por aqui, o nível de crédito está em cerca de 35% do Produto Interno Bruto (PIB), enquanto em vários países essa relação supera os 100%.

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Isso se traduz em problemas no panorama dos bancos americanos. O rtimo de quebras no setor pode aumnetar quatro vezes em 2009: o FDIC (Federal Deposit Insurance Corp, órgão do governo dos EUA para a área) fechou 25 bancos no ano passado. Somente nas sete primeiras semanas de 2009, 14 bancos quebraram. Nesse ritmo, o FDIC vai fechar mais de 100 instituições em 2009.

Além disso, o número de "bancos-problema", que estão sob monitoramento constante ou que têm poucas coberturas de crédito, disparou no terceiro trimestre do ano passado, de 117 para 171, o maior número desde 1995.

Imagem queimada

No meio da crise, a imagem dos bancos americanos – muitos dos quais receberam resgate financeiro com dinheiro público – sofreu ainda com notícias que eles premiaram seus executivos com cerca de US$ 1,6 bilhão em salários, bônus e outros benefícios no ano passado.

Entre os benefícios estariam bônus em dinheiro, opções de ações, uso pessoal de jatos da empresa e motoristas, segurança privada, adesão a clubes exclusivos e administração financeira profissional.

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O efeito foi tão ruim que afetou até o ranking anual das melhores marcas globais, divulgado no final de 2008 pela consultoria Interbrand. Bancos e instituições financeiras tiveram queda em relação à lista de 2007: o Citigroup passou da 11ª para a 19ª posição; o Merrill Lynch despencou do 22º para a 34º lugar; e o Morgan Stanley caiu da 37ª para a 42ª.

Nuvens negras

Para o futuro, o quadro que se desenha para o setor ainda não é claro. "Existe muita incerteza sobre os bancos americanos, com os rumores sobre quebras e a possibilidade de nacionalização por parte do governo, que teve que criar pacotes de ajuda para a área. Até agora não se sabe se esses bancos conseguirão sair da crise por conta própria", diz Bruno Rocha, analista da consultoria Tendências.

Para os brasileiros, as nuvens parecem ser um pouco menos carregadas, ainda segundo Rocha. "Com o apoio de medidas como a liberação do empréstimo compulsório (dinheiro que os bancos recolhem ao Banco Central), o risco de uma crise sistêmica parecida com a americana foi afastado por aqui. Mas o cenário sem dúvida vai ser mais difícil, pois pela primeira vez em cinco anos vai haver menor demanda por crédito no país com a desaceleraçãio da economia", projeta.

Para Pandeló, do Ibemec São Paulo, os problemas atuais devem levar a regras mais apertadas para o funcionamento dos bancos no futuro. No entanto, ele alerta que esse aperto tem que ser bem calibrado: "Um excesso de regras pode até trazer mais risco para o sistema sistema. Se você amarra demais, o banco fica incentivado a buscar lucro através da criatividade, usando novas ferramentas financeiras ainda não testadas, o que pode levar a novos desastres."

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