Pela primeira vez em cinco anos, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal estão pessimistas. Num momento de preparação para Basileia 3, os dois bancos públicos trabalham com cenário de desaceleração do crédito em 2014 e moderação nos planos de aquisições.
O calendário de Basileia 3 estabelece que, de 2016 a 2019, a exigência do piso de capital subirá gradualmente até 13 por cento, ante os atuais 11 por cento exigidos pelo Banco Central brasileiro.
Uma das principais ferramentas dos bancos para reforçar o patrimônio líquido é a retenção de lucros, mas a pressão do governo federal desde o ano passado para baixar os spreads bancários tem pressionado as margens.
A rentabilidade sobre o patrimônio (ROE) do setor, historicamente superior a 20 por cento, vem caindo no Brasil e a previsão de executivos dos bancos é de continuidade da queda nos próximos anos.
A Caixa tem conseguido manter níveis maiores --no terceiro trimestre, seu ROE foi de 27 por cento. Contudo, a retenção de lucro tem sido menor, dada a necessidade do governo de receber dividendos para ajudar a reforçar o superávit primário.
Em setembro, o índice de Basileia de Caixa era de 17,7 por cento e o do BB estava em 15,2 por cento. Em relação ao piso atual de 11 por cento, ambos poderiam ampliar a oferta de crédito sem se preocupar com as necessidades de capital. O problema é que as condições para reforçar o capital pioraram e os bancos querem ter alguma folga, por isso a saída é pisar no freio.
Principais vetores do governo para ampliar o crédito nos últimos anos e aliviar os efeitos da crise global, BB e Caixa agora acusam o esgotamento da política anticíclica adotada no fim de 2008 e que nunca foi completamente desmontada. De lá para cá, a participação da Caixa no crédito do sistema financeiro nacional quase triplicou, para 18 por cento.
Reservadamente, executivos dos dois bancos atribuem parte da piora de expectativas à deterioração fiscal do governo, somada a comunicação errática sobre o que pretende fazer para corrigi-la, levantado temores crescentes de rebaixamento soberano do país. Em setembro, o governo apresentou um déficit primário inesperado de 9 bilhões de reais, o maior em quase cinco anos.
Em junho, a agência de classificação de risco Standard & Poor's reduziu a perspectiva do rating do Brasil de "estável" para "negativa". Em outubro foi a vez de a Moody's trocar a perspectiva de "positiva" para "estável". O Brasil é avaliado no segundo menor nível de grau de investimento pelas três maiores agências de risco, incluindo também a Fitch.
Diante da deterioração do quadro macroeconômico nos últimos meses, BB e Caixa notaram uma piora das condições de captação externa, também refletindo a maior instabilidade do mercado com sinais de que o Federal Reserve --banco central dos Estados Unidos-- gradualmente reduzirá os estímulos à economia norte-americana, retirando parte da liquidez global.
A Caixa, que pretendia emitir 2,5 bilhões de dólares em sua estreia com bônus no exterior, levantou metade disso em setembro. O BB, que tem sido frequentador assíduo do mercado de bônus nos últimos anos, ainda considera captar neste ano, após ter feito sondagens mais cedo e decidido esperar mais.
"O governo está dando sinais desencontrados sobre política fiscal", disse um alto executivo de um dos bancos públicos à Reuters, sob condição de anonimato. "Precisa dizer claramente o que vai fazer."
"O Arno não está ajudando", reclamou outro executivo, referindo-se ao secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, que tem sido apontado por críticos do governo como um dos responsáveis pela piora das contas públicas.
Nos últimos anos, BB e Caixa conseguiram sustentar elevadas taxas de expansão do crédito, e reforçaram a estrutura de capital com recursos do Tesouro ou captações a baixo custo, dada a forte liquidez internacional.
Em 12 meses até setembro, a expansão da carteira de crédito do BB foi de 22,5 por cento, mais que o dobro da média dos principais concorrentes privados. No caso da Caixa, a expansão foi de 40 por cento.
No começo do mês, o vice-presidente de Gestão Financeira e de Relações com Investidores do BB, Ivan Monteiro, fez um comentário na direção de alta mais moderada do crédito. "Deve haver uma acomodação, porque o desempenho foi muito forte e é difícil repetir", disse.
Os dois bancos estatais estão prestes a fechar o orçamento de 2014 e devem divulgar suas previsões para crédito nas próximas semanas.
Consultados, BB e Caixa preferiram não comentar o assunto. O Tesouro não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.
SEM AQUISIÇÕES NO HORIZONTE
Além de desacelerar o crédito, os bancos estatais estão revendo planos de aquisições. O BB, que comprou o argentino Patagônia e o Eurobank, nos EUA, nunca levou adiante os planos de entrar no varejo bancário de Colômbia, Chile e Peru. Neste ano, desistiu da compra da unidade norte-americana do espanhol Bankia e de aumentar a participação no Banco Votorantim.
O plano do BB de comprar uma fatia minoritária de um grande banco de investimentos internacional foi substituído pela meta de criar uma estrutura própria.
A Caixa --que vinha mostrando interesse em aquisições de empresas nos setores de serviços financeiros, como cartões e seguros-- também preferiu esperar.
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